27 dic 2014

A quem votar?





Javier Vence
O ano 2015 promete ser um ano a priori importante porque lhe vai permitir ao eleitorado pronunciar-se sobre quem querem que os governe tanto nos concelhos como no governo do Estado. A relevância incrementa-se se temos em conta que os partidos turnantes reduziram o que se chama sistema democrático a uma oligarquia de fato no que os cidadãos vem limitado o seu rol a votar cada quatro anos, numas eleições em grande parte trucadas porque não ha igualdade para as diversas opções concorrentes, pois enquanto uns partidos, os excluídos do sistema, ficam condenados a uma marginalidade crematística e nos meios de comunicação de massas, os partidos turnantes, especialmente o partido governante, têm as suas caixas A, B, e C, e os meios ao seu serviço para manipular, tergiversar e transmitir a sua verdade, convertida na única realmente existente, que é outra vertente da corrupção sistêmica na que estão submergidos.



Os partidos turnantes, PP e PSOE, repetição mimética dos partidos liberal e conservador da primeira transição borbônica, competiram entre si em incompetência, dissipação e corrupção, alcançando a este respeito, as quotas de mais glória e esplendor do tradicionalmente corrupto Império espanhol. Ocuparam todas as instituições públicas pondo-as ao seu serviço; criaram um sistema de opacidade para que a cidadania não pudesse controlar o destino do dinheiro que lhe obrigavam a pagar; eliminaram a divisão de poderes, alicerce de qualquer sistema democrático, como susteve o seu criador, o barão de Montesquieu; encomendaram-lhe os meios de comunicação a pessoas dóceis e servis ao seu amo; marginaram a cidadania do sistema e estabeleceram um sistema de casta fechado no que somente têm futuro os dóceis e submissos ao líder e se faz quase inviável o surgimento de elites competenciais alternativas. Viviam num paraíso de encanto isolados da realidade social e dos problemas da cidadania.



A nível econômico foram autênticos mestres da dissipação, da improvisação e do amiguismo e nepotismo, e, finalmente, terminaram pondo o país aos pés dos cavalos do gigante teutão, de quem se converteram em alunos dóceis e avantajados, submetendo a cidadania espanhola ás receitas da chancelaria alemã, mudando mesmo as regras de jogo para que primassem os interesses do Bundesbank e outros bancos alemães e doutras latitudes sobre os da mesma cidadania. A nível cultural, denigraram a criatividade dos nossos artistas e secundarizaram a mesma língua espanhola á língua do imperialismo anglófono, inculcando no imaginário popular que não se pode ser cidadão do mundo se não se sabe inglês, primeiro elo no processo de auto-ódio, que propicia a política de substituição lingüística. Em política interior, secundaram a política lingüicida da FAES, associação ultra  regada abundantemente com os nossos quartos, para fomentar uma política de negação da pluralidade nacional, lingüística e cultural no Estado, Estes não são patriotas, senão patrioteiros, porque a sua única pátria é a carteira. 



A crise de desprestígio das instituições e dos partidos políticos foi resolvida, na década dos vinte do século passado, apelando aos militares e apoiando o golpe de Estado de Primo de Rivera, e quando nos anos trinta a oligarquia e a Igreja viram em perigo os seus privilégios, apoiaram o alçamento franquista. Na atualidade, o contexto internacional não lhes faz doada esta via, e, por outra parte, os partidos turnantes carecem de argumentos frente a uma nova força política regenerativa que se chama Podemos, e por isso, a sua reação é a de raiva e indignação não contida, porque se consideram elegidos pola providência para regentar uma Espanha concebida como o seu cortelho particular no que podem fazer e desfazer ao seu antolho sem contar com ádvenas e muito menos com os povos que lhes são molestos.



Para quem queira optar por alternativas sobre as que não pese o fardel da corrupção que invade estes partidos da casta tem como alternativas formações que, salvo CiU, embora têm casos particulares de corrupção, não obstante, quando se lhes apresentou algum, tomaram as medidas oportunas e não se pode afirmar que sejam corruptos sistêmicos, e, em todo caso, são recuperáveis. UPyD tem um problema de liderado que, por mais que se seja tão caudilhista como o PP, nos que funciona plenamente a dedocracia, tem falta de credibilidade pola renitência da organização a assumi-lo e a incapacidade de chegar a pactos com forças gêmeas, e, ao igual que no caso de Citadáns, a sua política representa uma volta ás políticas lerrouxistas de centralização e eliminação dos povos diferenciados, que intentam disfarçar com o pomposo nome de federalismo cooperativo, que, no fundo, representa o maior intento de centralização política da etapa democrática. O seu posicionamento entre a direita e esquerda têm-no meio tapado e ambos são defensores do regime monárquico. Izquierda Unida não é promotor da diferença, mas si respeitosa com ela, se bem tem problemas de coesão entre o centro e os órgãos periféricos. Podemos começa a sua andada e, de momento, é uma incógnita e também uma grande esperança ainda que carece da experiência de governo e não demonstrou que tenha uma política própria para as nações do Estado, entre elas Galiza, como não a teve nunca o PSOE. Manifesta ser democrático enquanto a permitir que os povos diferenciados se pronunciem sobre o direito a decidir, o qual significa que, ainda que optem por Espanha unida seriam mais condescendentes sobre uma hipotética consulta popular ainda que não se decidem a afirmar se se celebraria em todo o Estado, o qual significaria de fato negá-lo, ou nos territórios afetados. As pressões que estão a receber a este respeito podem fazer que se decante claramente por um neo-centralismo espanholista, que edulcoram com apelações a um projeto constituinte onde se falaria de todo, que representa mui pouco compromiso. A concentração de todo o poder de decisão num organismo central ao que se subordinam as decisões dos organismos territoriais, vão nesta direção, ao igual que as últimas declarações de Iglesias em Catalunya, que provocaram a reação airadas dos partidos soberanistas.



A alternativas que se oferecem á eleição dependem do modelo de estado e do modelo de sociedade. O modelo de estado vem determinado pola nação á que, em última instância, decidamos prestar a nossa suprema lealdade em caso de decisões incompatíveis. Se lhe prestamos a nossa suprema lealdade em última instância a Galiza, somos nacionalistas galegos, designemo-nos com este apelativo ou não; tenhamos uma posição política explicitada ou não. Se a nossa lealdade suprema é para Espanha, somos nacionalistas espanhóis. Os nacionalistas espanhóis podem defender o centralismo jacobinista, como é o caso do PP, PSOE, UPyD e Citadáns, ou o federalismo digno de tal nome, como Esquerda Unida. Os nacionalistas periféricos, podem defender o federalismo, como é o caso do BNG, PNV e CiU ou a independência como Amaiur e Esquerra Republicana de Catalunya. Porém, o federalismo do BNG, CiU ou PNV difere substancialmente do federalismo que agora pretende defender o PSOE, UPyD e Citadáns, enquanto que estes o que pretendem é denominar estados federados ao que hoje são as comunidades autônomas e, por arte de ensalmo, já teríamos um estado federal. O federalismo dos nacionalistas periféricos só admite como membros da federação ás quatro nações: Catalunya, Euskadi, Galiza, e Espanha. As outras comunidades autónomas de Espanha não seriam nações e não teriam direito a ser estados federados ainda que si comunidades autônomas do Estado federado ao que pertencem. O princípio básico de todos os nacionalistas é a defesa do direito de autodeterminação para que a cidadania da nação respectiva seja a protagonista do seu futuro. Referente á Chefia do Estado, o PP, Citadáns e UPyD são monárquicos; no PSOE ha uma enorme divisão ao respeito mas com proclividade á monarquia; IU e os nacionalistas periféricos são republicanos. Tocante ao modelo de sociedade, se optamos por melhores serviços públicos, mais gasto social e maior defesa dos débeis, seremos mais de esquerdas; enquanto que se optamos pola diminuição do gasto, mais iniciativa privada e menos intervenção na economia, seremos mais de direitas.

 

Pablo Iglesias Turrión
As opções a votar, segundo o meu critério, são as seguintes. Para um nacionalista espanhol de direitas, PP, Vox, e mais indefinidos UpyD e Citadáns que tapam a sua definição como de direitas ou esquerdas; Para um nacionalista espanhol de esquerdas, as opções seriam Podemos, PSOE e Izquierda Unida, incluindo nesta a sucursalista AGE. Para um nacionalista galego de esquerdas, as opções seriam o BNG e mais indefinido tanto polo que diz respeito ao modelo de estado como de sociedade, Compromisso por Galícia. O BNG tem uma longa história de purgas e secessões, o qual indica que é uma organização rígida e pouco permeável a uma renovação em profundidade das elites dirigentes, devido ao controle férreo que sobre ela exerce o partido dominante, União do Povo Galego. Por outra parte, é um partido soberanista com um ideário claro e coerente, com um líder sólido e capaz, ainda que ignoramos a sua capacidade de manobra. Anova carece de capacidade integradora dos seus membros e sofre problemas de liderado pola idade do seu promotor, e praticamente está diluída em Izquierda Unida e sem capacidade de manobra.  Surpreendentemente, se bem o campo da esquerda está bem coberto no nacionalismo galego, com estas duas formações, não sucede o mesmo com o campo do centro- direita, que campa tradicionalmente pola carência duma formação seria e coerente campo que compita com o PP na Galiza, que acha o caminho livre de toda concorrência competitiva partidária. Somente uma análise superficial do nacionalismo galego o levou a identificar direita e espanholismo, e a considerar que intentar canalizar as aspirações de Galiza desde formações de centro-direita carece de viabilidade. Creio, pola contra, que a normalização desta terra não será possível enquanto não haja forças próprias que ocupem este espaço político.



Mas como a nossa eleição não sempre é uma foto fixa, senão que pode mudar no tempo, a nossa eleição dependerá  a) Da inclinação da nossa lealdade para com Galiza ou para com o Estado, e cara a direita ou esquerda, e b) da conjuntura política que se presuma que poda dar-se nas vésperas das eleições. Enquanto á primeira alternativa, cumpre ter presente que todo partido tem a sua dinâmica própria e seria inútil pedir-lhe que fizesse algo distinto do que demandam os seus eleitores, e quando se trata duma força política estatal os seus eleitores são os de todo o Estado e não dum povo por mui diferenciado que seja.  Logo, é ilegítimo pedir-lhe a uma força estatal que faça uma política galeguista, catalanista ou vasquista. O nacionalismo galego teve mui claro isto desde os seus inícios, e considerou que um país, para sobreviver, necessita forças políticas próprias, como mui bem tem sublinhado Vicente Risco. Para este nacionalista galego, os partidos políticos espanhóis não vivem para Galiza senão de Galiza: "vêm aqui, não a fazer política galega, senão a fazer aqui a sua política, com olvido da que nós necessitamos"1. A nossa Terra não tem nada que esperar dos políticos espanhóis que representam aos seus partidos mais não a Galiza. "Estes não fazem mais que trair aqui as suas lutas, que não nos interessam, e distrair as nossas forças, roubando-nos as energias que necessitamos para redimir-nos a nós mesmos e por nós mesmos. Vêm buscando somente o seu proveito e não o nosso"2. Este foi também o posicionamento do nacionalismo galego até que Anova preferiu coligar-se com forças espanholistas em vez de fazê-lo com as nacionalistas, pretextando que isso lhe permitiria entrar em contacto com as esquerdas européias. Falta que nos expliquem que resultados obtiveram tanto eles como Galiza de tales maridagens.   



 Em El problema político de Galicia, de 1930, pronuncia-se Risco a prol da existência de partidos políticos próprios, sem sujeição a nenhuma disciplina alheia ao país, sejam da ideologia que sejam, parlamentares como anti-parlamentares, e uma política adaptada á sua realidade socioeconômica e política. "Galiza, por dignidade e por conhecimento, deve ter uma política própria, deve ter partidos seus, autônomos, não sujeitos a nenhuma chefia alheia ao país, a nenhuma disciplina que os coíba na defesa dos interesses espirituais e materiais da região"3



 Os políticos têm como função aplicar os princípios jurídicos e filosóficos á realidade concreta, do qual se segue "que em cada país haja e deva haver partidos políticos próprios e exclusivos, apropriados a sua realidade social e só a ela, e por tanto, diferente em muitos pontos, ainda acaso opostos a vezes em alguns aos partidos análogos de outros países. Os programas políticos no são como os específicos que se anunciam na quarta plana dos periódicos e que pretendem curar a toda classe de doentes, qualquer que seja a sua idiossincrasia e o seu temperamento"4. Os partidos políticos devem nascer da realidade social mesma, dos abusos detectados, das injustiças sofridas, ... "É a realidade social mesma a que deve dar nascimento aos partidos políticos e as opiniões que os informam; são as necessidades sentidas no país, os abusos observados, as injustiças sofridas, as que hão induzir aos homes a reunir-se em partidos; é a consciência das citadas necessidades, a ânsia de melhoramento, o desejo de justiça, os que hão informar a ideologia desses partidos. Somente assim, quando nascem da realidade viva dum país e da sua consciência social autônoma, podemos dizer que os partidos políticos têm a sua origem e uma essência democrática e popular. Os demais serão posturas de ideólogos ou agrupações de vivedores. Por tanto, somente aqueles partidos que nascessem da consciência galega em contacto com a realidade galega, podem ser considerados por nós como partidos nossos, populares, democráticos. Somente esses partidos seriam merecedores de beligerância. Os demais são indignos de consideração, e não merecem ser tidos em conta quando se trate do porvir de Galiza"5.



A respeito da segunda alternativa, ha que ter presente que a situação não se vai apresentar nada fácil para o câmbio, pois os partidos turnantes pro-oligárquicos já têm pensado coligar-se em caso de que os seus privilégios se vejam ameaçados, que começam a disfarçar sob o pretexto de estabilidade do sistema, que deve ler-se como a estabilidade do sistema de apropriação por parte das elites oligárquicas dominantes. Não ha que dar crédito a Pedro Sánchez quando afirma que não pactuará com o PP, mas que si está disposto a chegar a grandes pactos, ou seja, estabelecer com o PP o marco que coarte a livre iniciativa política de qualquer alternativa emergente futura, e, por outra parte, pode mesmo que nem sequer seja o candidato do PSOE, e que o seu posto seja ocupado por Susana Diaz, mais proclive á defesa dos privilégios dos gurus do partido. Nesta disjuntiva, seria interessante, em todo caso, que a opção que se eleja não dificulte, em caso de produzir-se, a governabilidade do país por parte duma nova maioria que seja capaz de regenerar a vida socioeconômica e política, que é também um bem importante que todos devemos procurar que não encalhe, sem que isto implique em nenhum caso que um nacionalista galego venda por nada a nossa Terra.















1..  «El problema político de Galicia», em Obra Completa, I, Akal, Madrid, 1981, p. 176.

2..  «El problema político de Galicia», em Obra Completa, I, Akal, Madrid, 1981, p. 176-177.

3..  «El problema político de Galicia», em Obra Completa, I, Akal, Madrid, 1981, en OCR, p. 129.

4..  “El problema político de Galicia”, em Obra Completa, I, Akal, Madrid, 1981, p. 194.


5.. «El problema político de Galicia»,  em Obra Completa, I, Akal, Madrid, 1981, , p. 194.