17 sept 2018

Mulher sexo e matrimônio no Antigo Testamento (II)


A inferioridade da mulher

            O povo hebreu praticava a poligamia, sendo o exemplo mais eloquente o de Salomão que teve 700 mulheres e 300 concubinas (I Re. 11, 3), entre as quais eram frequentes as rixas. A Bíblia considera a mulher como um ser inferior sob a total dependência do home (Ex.. 20, 17), e condena em termos enérgicos como escravidão, ignomínia e vergonha que a mulher domine ao varão (Eclo. 25, 29-30; 9, 2-13), enquanto que considera normal e incluso prescreve que o varão domine a mulher (Gên. 3, 16). Além de inferior, a mulher é um ser malévolo, enquanto que o homem é bom e ingênuo. “E eu achei uma coisa mais amarga do que a morte, a mulher cujo coração são laços e redes, e cujas mãos são grilhões; quem agradar a Deus escapará dela; mas o pecador virá a ser preso por ela” (Ecl. 7, 26). A mulher estranha, “como o salteador, se põe a espreitar; e multiplica entre os homens os prevaricadores” (Prov. 23, 28). 

            O matrimônio em Israel era endogâmico num sentido amplo, evitando os intercâmbios genéticos com membros das nações vizinhas com a finalidade de manter a homogeneidade cultural, ainda que esta norma fosse conculcada com certa frequência; é patrilinear, ou seja, que a pertença a uma determinada família se determina pola linha paterna; e com direito de primogenitura para o morgado ou primogénito, seja filho da mulher preferida ou da aborrecida (Dt. 21, 1517), que inclui a representação da linhagem, benção paterna e o grosso da herança, enquanto que os demais irmãos ficam como os seus servos ou escravos ou são despedidos da casa paterna; virilocal, quer dizer, que os varões acarretam mulher para a sua casa, selecionada no âmbito da parentela mais próxima por linha paterna, se bem evitando cair em situações consideradas normativamente incestuosas. O pai dispõe ao seu arbítrio do futuro das fêmeas. Pode dar a filha em casamento em contrapartida dum dote, o qual representa uma compra dissimulada para família do esposo; vendê-la como esposa (I Sam. 18, 25-27), como Mical filha de Saul, ou como escrava e concubina (Ex.. 21, 7-7; Dt. .22, 29-30); ou pode forçar-se o matrimônio por sedução ou violação por parte dum varão duma mulher não desposada que obriga o infrator a casar com a sua vítima, ainda que terá que dotá-la e não poderá repudiá-la. O pai pode fazer também de intermediário na compra de mulheres para os seus filhos, como fizeram os pais de Sansão. Este vendo em Timnate uma mulher das filhas dos filisteus, subiu, e declarou-o a seu pai e a sua mãe, dizendo: Vi uma mulher em Timnate, das filhas dos filisteus; agora pois, tomai-a por mulher. Responderam-lhe, porém, seu pai e sua mãe: Não há, porventura, mulher entre as filhas de teus irmãos, nem entre todo o nosso povo, para que ti vás tomar mulher dos filisteus, daqueles incircuncisos? Disse, porém, Sansão a seu pai: Toma esta para mim, porque ela muito me agrada(Juízes, 14, 1-3). Como vemos, seus pais põem reparos de caráter religioso e cultural por considerar que rompem a homogeneidade da população, além de que se tratava dum povo com o que Israel tinha frequentes enfrentamentos bélicos, e, seguramente não estaria bem visto pola população tal intercâmbio. À mulher, pola sua parte, não lhe fica capacidade nenhuma de iniciativa, senão que se vê obrigada a aceitar as transações realizadas por outros às suas costas. 

            A mulher sempre esteve submetida ao poder do varão; de solteira é uma propriedade mais do pai, à par doutros bens como podem ser os animais, parcelas,... e de casada é propriedade do esposo, ao mesmo nível que os bois e asnos (Ex. 20, 17; Dt.5, 21). O relato do Gênesis apresenta a mulher como um ser provocador que, devido à sua ousadia em induzir o homem ao pecado, foi castigada por Deus a ser dominada polo varão, parir filhos com dor e reabilitar-se só pola procriação. Nunca um relato causou tanto dano a mais de meia humanidade. A inferioridade da mulher consolidava-se socialmente com a adoção de medidas econômicas e de limitação da sua capacidade de toma de decisões, além de polo trato recebido. As terras eram de Javé e os seus possessores eram peregrinos e estrangeiros nela. Se alguém vender parte da sua propriedade, sempre pode resgatá-la e, em todo caso, a propriedade volve a ele no ano jubileu, que se celebrava cada cinquenta anos (Lev. 25, 8-22), salvo se se trata duma casa amuralhada na cidade que, se não se resgata durante o ano da sua venda, já ficará para sempre para o vendedor (Lev. 25, 23-38). Se um home deixa filhos ao morrer, as filhas não herdam nada (Num.. 27, 8-10). O filho primogénito herdará dobre porção que os outros (Dt.. 21, 17). Se não havia filhos varões, herdariam as filhas e se não há herdeiros diretos herdarão os irmãos; se tampouco há irmãos, os irmãos do pai, parentes mais próximos da família (Num. 27, 8-11), e finalmente, os escravos (Gên. 15, 2-3). Deste modo garante-se a exclusão socioeconômica da mulher que se reforça por uma ideologia de gênero, perpetuando assim a sua minoria de idade, santificada pola palavra da mesma divindade. 

            A mulher não podia fazer um voto se não obtinha previamente o permisso do seu pai ou do seu marido, que são os responsáveis do seu cumprimento. (Num. 30, 1-16), e, num relato do Gênesis. as próprias filhas são postergadas inclusive frente a dous supostos «varões» estranhos à família, que quiçá fossem duas deidades menores ou, segundo a maioria dos autores, dous anjos. Abraão convida-os a comer, tanto a eles como a Javé, na sua casa, convite que eles aceitam, se bem o relato do hagiógrafo não explica como seres pretensamente espirituais podem comer. Quando dous dos «varões», anjos ou deidades menores, chegam a Sodoma, Ló dá-lhe hospedagem na sua casa, que eles aceitam. Mas, dado que se concitam vários concidadãos moços e velhos diante da casa, decididos a manter relações sexuais com eles, Ló roga-lhe que não procedam tão perversamente e oferece-lhe como alternativa “duas filhas que ainda não conheceram varão, eu vo-las trarei para fora, e lhes fareis como bem vos parecer: somente nada façais a estes homens, porquanto entraram debaixo da sombra do meu telhado” (Gên. 19, 8), ainda que tampouco precisa como dous anjos ou deuses necessitam dormir e como podem realizar sexo com seres humanos. É improcedente justificar esta ação, como fazem alguns autores, dizendo que tomam forma humana, porque uma forma de ser humano não come, senão um home humano normal. Aliás, tanto um anjo como um deus com sentido deveria impedir que se buscassem alternativas bárbaras como a de violar mulheres. Causavam muito menos mal violando as formas humanas que as pessoas humanas reais. O relato é todo um despropósito. Se bem é correto procurar que os hóspedes não sofram nenhum dano, o remédio nunca pode ser oferecer-lhe as próprias filhas, e muito menos com a consigna de que façam com elas todo o que lhes parecer. A solução bárbara que oferece Ló é a mesma que a que oferece um ancião de Gueba que dá pousada a um levita forasteiro que vai de Belém de Judá para a sua casa acompanhado da sua concubina. Quando os habitantes de Judá lhe dizem ao ancião: “Traze cá para fora o homem que entrou em tua casa, para que o conheçamos. O dono da casa saiu a ter com eles, e disse-lhes: Não, irmãos meus, não façais semelhante mal; já que este homem entrou em minha casa, não façais essa loucura. Aqui estão a minha filha virgem e a concubina do homem; fá-las-ei sair; humilhai-as a elas, e fazei delas o que parecer bem aos vossos olhos; porém a este homem não façais tal loucura” (Juízes, 19, 22-24). Conheçamos significa o mesmo que tenhamos sexo. Isto significa que o ancião lhe oferece a sua filha e a concubina do próprio levita para que as desonrem, com preferência a que mantenham relações homossexuais com o seu convidado, com a consequência de que lhe dão morte à concubina, e sem que se manifeste sinal nenhum de reprovação por este crime. Entre salvar o honor dos hóspedes ou o das filhas, Ló opta por defender o levita e manter o seu honor como hospedeiro em vez do seu honor como pai. Um pergunta-se como se podem considerar como inspirados por Deus uns livros que narram semelhantes atrocidades e que ideologia da família se pode fundamentar neles. 

            A legislação mosaica era sumamente dura e estabelecia penas desproporcionadas para com aqueles que contravinham os seus preceitos referentes à moralidade sexual e reprodutiva. Se um homem tem relações com a esposa de seu pai, com a sua nora, ou com outro homem, devem morrer todos eles. Quem tomar uma mulher e mãe dela serão queimados vivos os três (Lev. 20, 11-14). A mulher que tiver sexo com uma animal cumpre dar morte aos dous (Lev. 20, 15). Se um homem for colhido jazendo com uma mulher casada deverá dar-se morte a ambos (Dt. 22, 22). Se um homem força a uma virgem desposada e se deita com ela na cidade cumpre lapidá-los aos dous; a mulher por não ter gritado na cidade e o home por ter desonrado a mulher do seu próximo (Dt. 22, 23-24). Se o sucesso tem lugar no campo, somente morrerá o homem, pois não há nela reato de morte, ou seja, motivo para matá-la enquanto que a gente não podia ouvi-la. A violação é considerada, além dum delito contra a mulher, uma afronta para a família, que deverá ser vingada por esta com a morte dos membros varões da família afetada (Gen.. 34, 31, e 34, 25-26). O adultério também está castigado com a pena de morte e em caso de que a adúltera fique embaraçada é queimada viva tanto ela como a criatura (Gên.. 38, 24), e castiga com a pena de morte aos dous se um home jaze com uma mulher casada (Dt. 22, 20-21);A Bíblia condena a violação das virgens não desposadas com a obrigação de casar com ela, o qual pode muitas vezes ser mais um prêmio que um castigo (Ex. 22, 15-16; Dt.  22, 28-29); igualmente devem morrer aos que praticam o  coito interrupto, como foi o caso de Onã (Ge.  38, 6-10); a homossexualidade (Lev. 20, 13; Ge. 19, 5; Lev.18, 22); e se penaliza também o travestismo (Dt. 22, 5). Não existe nenhuma norma a respeito das lesbianas.
            Os matrimônios com tribos limítrofes estavam proibidas porque entendiam que isto danava a pureza cultural de Israel e incitava os seus habitantes a que se prostituíssem adorando os deuses doutros povos, o qual provocava a ira do zeloso deus Javé contra o próprio povo hebreu. De ai que quando um israelense introduz na sua tenda uma mulher madianita, Finés, filho do sumo sacerdote Eleazar decide tomar a justiça pola própria mão e tomando uma lança alanceou aos dous, acalmando assim a ira de Javé, que cessa deste modo a misteriosa praga na que morreram 24.000 israelenses (Num. 25, 6-9). É tal a brutalidade da ação que não há ética digna de tal nome que possa explicá-la racionalmente, mas isto não foi óbice para que Eleazar fosse recompensado com o sacerdócio eterno (Num. 25, 10-13). Em caso de vitória num conflito armado, as mulheres dos vencidos pagavam com a própria vida as consequências da guerra, igual que os varões adultos e os mesmos meninos, se bem as virgens eram tratadas dum jeito mais benevolente e eram reservadas como botim para os vencedores, o resto da comunidade e para Iavé. Eis o que diz os Números da guerra contra os madianitas: “Agora, pois, matai todos os meninos entre as crianças, e todas as mulheres que conheceram homem, deitando-se com ele. Mas todas as meninas, que não conheceram homem, deitando-se com ele, deixai-as viver para vós” (Num. 31, 17-18). Nesta guerra, das virgens, a metade, dezesseis mil, foi para os combatentes, salvo trinta e duas que foram para Javé; e a outra metade foi para os membros da comunidade (Num. 31, 40 e 46). Quando se diz que trinta e duas eram para Javé cumpre entender para os sacerdotes ou levitas. Em caso de empreender ações bélicas, a sorte dos vencidos depende se se trata de nações exteriores ou dos povos cananeus. No primeiro caso, os homes devem ser passados polo fio da espada e as mulheres e meninos tomados como botim, mas nas cidades tomadas aos cananeus deve matar-se a todo o que respira: “das cidades destes povos, que o Senhor teu Deus te dá em herança, nada que tem fôlego deixarás com vidaDt. 20, 16), e, portanto, devem matar-se a todos os seres humanos e a todos os animais, mas se um combatente acha uma mulher formosa pode tomá-la por mulher (Dt. 21, 11). Os hebreus aspiravam a conquistar os povos limítrofes e criaram a mística de que Deus lhos deu em herança, e isso justificava que se pudessem cometer contra eles as maiores atrocidades. 

            A legislação mosaica concede-lhe ao varão a faculdade de romper dum jeito unilateral o vínculo matrimonial, deixando a mulher totalmente indefensa. O modo de fazê-lo é dar-lhe uma carta manifestando-lhe o esposo que a rejeitava ou repudiava, e que agora alguns pretendem suavizar utilizando a palavra divórcio que somente indica dissolução do vínculo matrimonial. “Quando um homem tomar uma mulher e se casar com ela, se ela não achar graça aos seus olhos, por haver ele encontrado nela cousa vergonhosa, far-lhe-á o libelo de repúdio e lho dará na mão, e a despedirá de sua casa” (Dt.. 24, 1). Os motivos para o despedimento podem ser, segundo a escola de Hillel, nímios, como que se lhe queimasse a comida, se bem pode refazer a sua vida com outro casando com outro homem. Outro dos motivos para o repúdio da mulher, também unilateral, é a acusação de perda da virgindade da mulher com a conseguinte obrigação por parte da mulher de demonstrar que é inocente, apresentando, como prova da sua virgindade, as savanas ensangüentadas (Dt. 22, 13-21),  o qual pode condenar por lapidação a pessoas inocentes, pois o hímen pode rasgar-se polo exercício, pôr ou quitar tampões, masturbar-se, sem que a pessoa afetada seja consciente deste contratempo, ou que a mulher careça dele de nascimento. 

A virgindade era concebida no Antigo Testamento como uma preservação da mulher para o marido antes do matrimônio e como um incentivo para as apetências do varão (Ge. 34, 7.31; 24,16; Jz. 19,24), mas sem que exista uma medida simétrica para o este. A donzela que perdia a sua virgindade diminuía o seu prezo de casamento (Ex. 22, 15-16; Dt.  22, 14-19), e era objeto da penalização legal sancionada com a pena de morte por lapidação (Dt.. 22, 20-21), e, em todo caso, à perda da sua honra (II Sam. 13, 2-18; Lm, 5,11; Si, 7, 24; 42, 9-11). Os sacerdotes somente podem casar com uma virgem, e não com uma mulher já «desgastada» por coitos repetitivos. Como vemos, gerentes de Deus na terra já gozavam de privilégios em Israel e é humano que, se lhe deixam, desejem mantê-los.

11 sept 2018

Mulher, sexo e matrimônio no Antigo Testamento (I)


A menstruação, parto e sexo como pecados

No Antigo Testamento, a sexualidade tem como finalidade a procriação, considerada como uma benção divina, enquanto que a esterilidade era considerada como um estigma para a mulher estéril. Para facilitar que todo matrimônio tiver descendência, promulgou-se a lei do levirato, que estipulava que, se um marido morre sem deixar descendência, o seu irmão tem que desposar a viúva do defunto (DT. 25, 5-6). Também ajudava a cumprir a função procriativa a poligamia, que lhe permitia a uma mulher dar-lhe descendência a um marido por outra mulher interposta com a que o marido podia copular. A partir do século II a.e.c. considera-se que o reto uso da sexualidade é superior ao valor da procriação; viver castamente é superior a ter filhos. Por isso se louva o eunuco e se prefere a mulher piedosa e estéril à adúltera, ainda que não entra na questão de por que existem pessoas que são convertidos por outros em eunucos nem tem uma só palavra de reivindicação da desaparição desta prática. “Ditosa a estéril sem macula, a que não conhece leito de pecado; terá o seu fruto na visita das almas. Ditoso também o eunuco que com as suas mãos não obra iniquidade nem fomenta pensamentos perversos contra o Senhor; pola sua fidelidade se lhe dará uma escolhida recompensa, uma herança muito agradável no Santuário do Senhor. Que o fruto dos esforços nobres é glorioso, imperecedoira a raiz da prudência. Em câmbio os filhos de adúlteros não chegarão à sazão, desaparecerá a raça nascida duma união culpável (Sab. 3, 13-16). 

A mulher não foi objeto direto da criação pois Deus somente visava criar o varão, mas, para corrigir o seu despiste, que não preveu o problema da soledade de Adão só entre todos os demais animais, teve que completar a obrar para curar a sua saudade, e, com esta finalidade, criou a Eva de uma costela de Adão. Como vemos, não necessitou utilizar as leis biológicas nem o carbono como elemento das biomoléculas nem acudiu à clonagem para fazer a Eva a partir de células mãe ou outras senão que toma diretamente uma parte do corpo de Adão que total só ficou com uma costela menos (Gen.. 2, 20-22). A sua função é entreter e ajudar a Adão, mas resultou-lhe uma companheira corruptora, cheia de lascívia, que afaga o homem e o desvia do caminho traçado pola divindade (Prov. 5,3; 6, 24-25; 7, 10, 19; Eclo. 9, 3-4; Ecl. 7, 26), o qual tem como consequência o maior castigo que recordam os séculos, que não afeta só a ela, mas também a toda a sua descendência: parir com dor e ser submetida ao varão, que vai reprimir fortemente a manifestação da sua sexualidade como castigo de desagravo a ele por tê-lo conduzido pola senda do mal. A manifestação mais sobranceira desta repressão é a mutilação genital para que a mulher não sinta prazer no ato sexual. O castigo do varão consiste em comer em fadiga da terra todos os dias da sua vida por ter escutado, como um ingênuo, a voz da sua mulher (Gen. 3, 17). O submetimento ao varão teve como resultado que a mulher perdeu toda capacidade de pensar e atuar dum jeito autônomo. 

A ignorância perante certos fenômenos e a surpresa e curiosidade que causam na mente humana conduziu os seres humanos a dar-lhe respostas, num início insatisfatórias, infantis, não fundamentadas, cuja origem se perde na noite dos tempos, com objeto de controlá-los e dar-lhe sentido. Mas o que fez o chamado «autor sagrado» é pôr essas respostas na boca de Deus, sacralizá-las, estereotipá-las e transmiti-las às gerações futuras como se fosse a palavra da própria divindade. Agora os intérpretes dogmáticos, que têm como função acomodar a realidade sócio-histórica aos seus preconceitos dogmáticos, intentam justificar as incongruências da chamada revelação divina alegando que Deus se acomodou à mentalidade e à conceção tribal do hagiógrafo. Utilizam, pois, o princípio hermenêutico da acomodação de Deus a ideias atávicas, atribuindo-lhe uma atitude indigna que é a de acomodar-se a relatos falsos que o autor apresenta como palavra divina, pondo-os na própria boca do Altíssimo, induzindo os leitores a que creiam que são verdadeiros, e sem ter maneira de distinguir o verdadeiro do falso. Se Deus sabe e não quiser instruir as pessoas, seria um ser malévolo, mas é muito pior fazer passar como palavra divina o que é somente uma crença ancestral.  Nos relatos bíblicos que imos ver uma série de funções orgânicas, como a menstruação, em vez de ser tratadas desde o ponto de vista higiênico-sanitário, passam a ser consideradas desde o ponto de vista moral e religioso, e, portanto, como fruto duma decisão divina e fonte de contaminação para o exercício de cargos relacionados com o sagrado. Vários atos que são puramente funções fisiológicas são qualificados como impuros, e, como impureza religiosa, a purificação tem que ser submetida a certos ritos executados polo sacerdote, que tinham como finalidade purificar a pessoa impura e permitir-lhe reintegrar-se de novo na vida pública, tanto civil como religiosa, da que fora excluído pola sua impureza. Aliás, a impureza é considerada como pecado e a esterilidade (Gen.e 20, 17-18) e a doença são consideradas como consequência do pecado, que tem a virtualidade de cambiar as leis naturais, crença também presente em Jesus de Nazaré, e, portanto, a purificação deve incluir, além dum holocausto de reconhecimento e homenagem a Deus, um sacrifício de expiação para anular o pecado, para contentar a um Deus ávido de sangue tanto doutros animais como do ser humano. Além mais, os atos de purificação constituem uma fonte importante de ingressos para as arcas clericais obtidos dos sacrifícios oferecidos, teoricamente, a Javé.

Determinadas condições fisiológicas, como a lepra, a sarna ou a tinha (Lev. Caps. 13 e 14), o parto (Lev. 12,1-8), os nascidos Jó.25, 4,... são considerados como fonte de impureza: “como pode ser puro o nascido de mulher” (Jó, 25, 4), “Eis que eu nasci em iniqüidade, e em pecado me concebeu minha mãe” (Sal. 51, 5), enquanto fruto dum ato sexual e dum parto acompanhado de emissão de sangue. Igualmente certas emissões genitais, como o sémen masculino e a menstruação feminina; emissões sanguíneas, como as hemorragias; e secreções causadas pola bactéria da gonorreia, uretrite gonocócica, eram, em Israel, fonte de impureza, de contaminação, de mancha, para a pessoas afetadas. Eram também fonte de contaminação para os demais, porque também eram impuras as pessoas que estavam em contato com o doente, ou pessoas que mantiveram relações sexuais com ele, e, portanto, precisavam ser purificadas, chegado o caso, perante o sacerdote. Também são impuros os que tocam a pele ou o cadáver de animais (Lev. 11, 24-40) ou de seres humanos mortos (Núm. 19, 10-22). Toda pessoa impura se se achegar aos lugares sagrados, como o templo, pode degradar a sua santidade e a dos objetos sagrados que ali se contêm, que vai constituir um motivo de marginação capital para a mulher. Os da estirpe de Arão que tivessem lepra ou fluxo seminal ao poderão comer das cousas sagradas (Lev. 22, 4-5).

O mero feito de parir é causa de impureza, o qual não deixa de surpreender porque Deus quer que os seres humanos tenham muita descendência: “frutificai e multiplicai-vos; enchei a terra e sujeitai-a” (Gen.  1, 28), e não existe outro meio de procriar que por meio do ato sexual. A impureza é maior no caso das fêmeas que dos varões, e, consequentemente, a necessária purificação era também distinta para os dous sexos, mais dilatada no tempo no caso das fêmeas, o qual implica que parir uma menina polui mais a mãe, que pode interpretar-se como um castigo por dar a luz uma menina, que era considerada um ser inferior, ou porque a menina tem, segundo a medicina antiga, um desenvolvimento mais tardio, contrariamente ao que defende a psicologia atual. “Se uma mulher conceber e tiver um menino será imunda sete dias; assim como nos dias da impureza da sua enfermidade, será imunda. E no dia oitavo se circuncidará ao menino a carne do seu prepúcio. Depois permanecerá ela trinta e três dias no sangue da sua purificação; em nenhuma cousa sagrada tocará, nem entrará no santuário até que se cumpram os dias da sua purificação. Mas, se tiver uma menina, então será imunda duas semanas, como na sua impureza; depois permanecerá sessenta e seis dias no sangue da sua purificação. E, quando forem cumpridos os dias da sua purificação, seja por filho ou por filha, trará um cordeiro de um ano para holocausto, e um pombinho ou uma rola para oferta pelo pecado, à porta da tenda da revelação, ao sacerdote, o qual o oferecerá perante o Senhor, e fará, expiação por ela; então ela será limpa do fluxo do seu sangue. Esta é a lei da que der à luz menino ou menina. Mas, se as suas posses não bastarem para um cordeiro, então tomará duas rolas, ou dois pombinhos: um para o holocausto e outro para a oferta pelo pecado; assim o sacerdote fará expiação por ela, e ela será limpa” (Lev. 12, 2-8). Quando a mulher está impura, todo aquilo sobre o que ela se deitar ou do que ela tocar será imundo; assim como todo aquele com que tenha relações sexuais ou lhe tocar ou tocar o seu fluxo de sangue ou entrar em contato com o que ela tocasse. A purificação da mulher dura 40 dias no caso do nascimento dum varão e oitenta se nasce uma mulher, diferença quiçá devida a que a mulher era considerada inferior e a mãe era, em certo modo castigada por dar a luz uma filha.

            Outra causa importante de impureza é a menstruação da mulher. “Mas a mulher, quando tiver fluxo, e o fluxo na sua carne for sangue, ficará na sua impureza por sete dias, e qualquer que nela tocar será imundo até a tardeLev.. 15, 19). Todo aquilo sobre o que ela se deitar, sentar e toda pessoa que tocar cousa alguma sobre o que ela estiver sentada ou deitada, ou tocar o sangue, será causa de impureza. Depois do fluxo há que contar sete dias para que fique limpa. (Lev. .15, 20-30). O homem que se deite com uma mulher durante o período menstrual será imundo por sete dias (Lev.15, 24). Igual que o parto, a menstruação era considerada como pecado e, portanto, a mulher cumpre levar dous pombinhos ao sacerdote, para que ofereça um polo pecado e outro polo holocausto. (Lev.  15, 29-30). Alguns dizem que no caso da menstruação ou da polução noturna não seria pecado, mas isto vai contra do que diz expressamente a Bíblia de que têm que oferecer um animal em holocausto, ou seja, em homenagem e reconhecimento a Deus, e outro polo pecado. Aliás, Javé diz que o homem justo não se acercará à menstruada (Ez.  18, 6); o obrar de Israel quando morou na sua terra foi como “imundícia de menstruadaEz.. 36, 17). 

            Como a mulher tem um fluxo sanguíneo mensual de vários dias, nos que ela contamina todo o que toca e o que ou quem lhe toca, a conceção da menstruação como algo impuro supôs para ela uma fonte de discriminação social e religiosa que se prolongou historicamente no tempo até os nossos dias. Por ser impura não pode tocar os objetos sagrados e, por conseguinte, não pode ter nenhum rol relevante. na igreja. 

            A impureza também se dá no homem, mas não teve repercussões tão negativas como no caso das mulheres, por ser esta ademais considerada como um ser inferior. O homem volve-se impuro, além de pola gonorreia, polo fluxo de sangue e quando o seu sêmen é expelido, quer numa relação sexual normal (Lev. 15,18), quer involuntariamente, como no caso da polução noturna (Dt.. 9, 11), num estado normal ou em caso de doença.  Disse ainda o Senhor a Moisés e a Arão: Falai aos filhos de Israel, e dizei-lhes: Qualquer homem que tiver fluxo da sua carne, por causa do seu fluxo será imundo. Esta, pois, será a sua imundícia por causa do seu fluxo: se a sua carne vasa o seu fluxo, ou se a sua carne estanca o seu fluxo, esta é a sua imundícia” (Lev.. 15, 1-3). A cama em que se deitar um impuro, e todo aquilo em que se sentar ou que tocar o impuro converte-se em impuro Toda emissão de sêmen, incluso a involuntária, converte o homem em impuro. “Também se sair de um homem o seu sêmen banhará o seu corpo todo em água, e será imundo até a tarde.” (Lev.15, 16). Toda relação heterossexual na que se produz derramamento de sêmen é impura e ambos têm que lavar-se e ficarão impuros até a tarde (Lev. 15, 18). Se o fluxo se produz por doença, a impureza dura enquanto dure a doença, e uma vez curado do fluxo contará sete dias para a sua purificação, lavará as suas vestes e banhar-se-á em augas vivas (Lev. 15, 13). Ao oitavo dia, apresentar-se-á perante o sacerdote e lhe entregará duas rolas ou dous pombinhos que os oferecerá um para holocausto e o outro polo pecado. E o hagiógrafo conclui: “Esta é a lei daquele que tem o fluxo e daquele de quem sai o sêmen de modo que por eles se torna imundo; como também da mulher enferma com a sua impureza e daquele que tem o fluxo, tanto do homem como da mulher, e do homem que se deita com mulher imunda” (Lev. 15, 32-33).

Esta conceção misossexual teve um efeito muito negativo sobre o sexo, que se   considerou em si como algo sujo, contaminante e pecaminoso, desvalorizando-o e reduzindo-o a um mero instrumento para a procriação, perdendo a função de expressão do amor e complementaridade entre os sexos, presente já nos elos mais elevados do desenvolvimento filético dos demais animais. A sexualidade humana é uma sexualidade criativa, cultural, que, igual que acontece no caso dos chimpanzés bonobos, ou pan paniscus, que é a espécie animal mais parecida aos seres humanos, não se desencadeia só polas hormonas, polo zelo da fêmea, senão também por outros fatores como o prazer, e a excitação perante estímulos visuais, tácteis, olfativos, linguagem, etc. Isto tem como consequência que a fêmea é receptiva em qualquer momento do dia ou do mês, enquanto que as fêmeas doutras espécies de animais mamíferos, salvo os humanos e os bonobos, só copulam durante o período anual ou mensual de estro. O sexo, como expressão do amor entre seres humanos, deve ser o que estes desejem e não o que lhe interesse a uma hierarquia religiosa misógina e misossexual, ávida em legislar sobre o que devem fazer na cama os esposos, apesar de ser leiga, polo menos teoricamente, na matéria e de que ficou fortemente desautorizada polas decisões que tomou ao longo da história. Tanto no ser humano como nos bonobos as relações sexuais são muito frequentes e reiterativas e não estão ligadas diretamente só à procriação senão também ao prazer. A diferencia doutros primatas, como os bonobos, o ser humano prática a violência sexual com a fêmea, igual que sucede com os chimpanzés pan trogloditas, e o macho pode violar a fêmea, enquanto que noutras espécies de primatas, o macho não se impõe à fêmea, senão que tem que persuadi-la. Os chimpanzés pan trogloditas e os pan paniscus são promíscuos ou polígamos, mas diferenciam-se em que os primeiros utilizam a violência física sobre as fêmeas, tanto sob a forma de ameaças, brandindo ramas de árvores, como real, ameaçando-as, perseguindo-as e golpeando-as para obrigá-las a acasalar-se exclusivamente com quem exerce a violência e desista de fazê-lo com os seus contendores, para assim garantir a sua descendência. Também se diferenciam em que os machos pan trogloditas praticam o infanticídio para apurar de novo a receptividade da fêmea. Os machos mais agressivos com as fêmeas são os que têm mais probabilidades de copular com elas e garantir assim a sua descendência, o qual indica que a violência tem êxito. O único primata monógamo é o gibão enquanto que o ser humano praticou historicamente tanto a poligínia como, em menor medida, a poliandria, com uma tendência crescente a uma monogamia sucessiva, como mais acorde, junto com a monogamia estrita, com os direitos dos dous membros da parelha. 

            Finalmente, dizer que a impureza ritual não era privativa de Israel senão que estava presente na cultura greco-romana, contaminando a própria mulher e também os que entram em contato com ela. Diz, a respeito das consequências do sangue menstrual, Plínio o Velho: “Dissemos muito desta violência (violenta descarga da menstruação), mas além disso, é certo que as abelhas fogem com toques (destas mulheres) nas colmeias; os vestidos de linho, quando se cozem, volvem-se negros; o fio cega nas navalhas dos barbeiros; o cobre com o contacto toma um veneno forte de mal-odor e óxido, especialmente se isto acontece na lua minguante; as éguas, se estão prenhes, abortam se se lhes toca, e incluso pola mirada (destas mulheres) ainda vistas de longe, se é a primeira menstruação após a (perda da) virgindade ou se permanece virgem e menstruou pola primeira vez” PLINIO O VELHO, História natural, livro 28, cap. 23, 78-79). Como vemos, este é um relato totalmente inaceitável, mas existe uma diferença radical entre ambos casos, que consiste em que os relatos bíblicos são apresentados como inspirados por Deus e, portanto, como pautas de conduta que todos os crentes devem acatar em todo tempo sem ousar pô-las em questão, enquanto que as os relatos da cultura greco-romana e as suas normas de conduta não se propõem como obrigatórios para ninguém e qualquer pessoa é livre de crê-los como válidos ou não e de acatar ou não as suas normas, e pretender que há que há que seguir a Plínio ou a qualquer outro soa a autêntico despropósito porque frearia o devir racional da humanidade, que foi o que sucedeu historicamente com os relatos bíblicos.

Casado: «A ética marca-a lei»


            A vezes um se pergunta por que os políticos não se autocontrolam um pouco mais e se cingem a falar de aquilo do que conhecem em vez de falar do divino e do humano sem pudor de nenhuma classe. É claro que um político pode pensar e manifestar o que queira, mas outra cousa distinta é pontificar sobre questões nas que são leigos na matéria, e muito menos uma pessoa que, supostamente, conseguiu que lhe convalidassem e aprovassem matérias a eito, prevalendo-se da sua relevância pública e da possibilidade de que alguns obtenham contrapartidas no fututo por esta conduta favoritista.

            O Sr. Casado manifestou faz uns dias que a ética marca-a a lei, formulação própria do mais craso positivismo, mas se isto é assim, eu pergunto-me que fundamentos podem alegar para opor-se a uma lei promulgada por um governo anterior, porque isto equivaleria a opor-se à mesma ética, e constituiria, em consequência um comportamento imoral. Amparando nesta declaração nega-se a dimitir e só o faria se o fazem dimitir os tribunais. Não se pode suster o que dizem alguns que a lei e a moralidade se diferenciam porque a lei inclui normas de obrigado cumprimento, porque também as normas morais são de obrigado cumprimento, ainda que sim é certo que uma norma moral se não é ao mesmo tempo uma norma legal não é amparada pola força coativa do Estado. Tanto a ética como a lei são sistemas normativos de obrigado cumprimento, mas variam no modo de obrigar. As normas legais obrigam somente no foro externo, ou seja, obrigam a que se ponha ou evite um ato independentemente da conformidade com essa norma, e assim uma pessoa cumpre a norma legal se paga os impostos ainda que o faça de mã ganha; enquanto que as normas éticas obrigam no foro externo e no foro interno, ou seja, também em consciência, e uma ação não tem valor algum se o sujeito não realiza o ato voluntariamente.

Para mim é evidente que uma cousa é a ética e outra muito distinta a lei. Nós podemos perguntar-nos com sentido acerca de se uma lei é justa ou injusta, moral ou imoral, e isso indica que não se podem consubstancializar, não se podem equiparar. A ética é um sistema normativo que trata da conduta dos seres racionais enquanto boa ou mã, correta ou incorreta, com respeito a um ideal, ao que se considera que deve ser a conduta das pessoas se querem ser boas pessoas. É o terreno das aspirações e necessidades humanas, dos direitos humanos, dos direitos dos outros animais e do respeito dos demais seres vivos e da conservação da natureza. Numa ética cívica, como a que nós propugnamos, quem decide da moralidade dum ato não é uma organização política, uma asociação religiosa, um estado, senão a cidadania que ajuíza a moralidade dos atos independentemente das condições individuais ou sociais das pessoas que os realizam. Uma ação mã tem como castigo os remorsos de consciência, a desvalorização social se chegar ao conhecimento dos demais, mas somente será penalizada pola lei se existe uma norma legal que contempla essa possibilidade e se se pode demonstrar dum jeito fidedigno a autoria dum ato ilegal num juízo. 

            A lei é também um sistema normativo imposto não pola cidadania senão polas elites que controlam o aparato do Estado, que o vão aproveitar em benefício próprio. O que lhe interessa ao poder político não é diretamente se uma ação é boa ou má, justa ou injusta, senão a sua rendabilidade eleitoral, se favorece ou não probabilidade de manter o poder e o controle da cidadania, se favorece a implantação dum determinado modelo de sociedade que beneficia as elites partidárias,... Isto implica que a ética e a política não casam muito bem e que toda política é, velis/nolis, maquiavélica dalgum modo. Um dirigente político, posto emdeterminadas circunstâncias, não tem mais opção que faltar à verdade, por exemplo, se sabe que dizendo a verdade vai quebrar um banco importante do país. O incumprimento duma norma legal não tem por que produzir nenhum remorso de consciência, incluso pode produzir remorsos de consciência o cumpri-la, mas o incumprimento pode ser penalizado polo aparato punitivo do Estado. Seguramente que a Gandi não lhe produziu nenhum remorso de consciência desobedecer e induzir a que os seus concidadãos desobedecessem a lei britânica, feito que contribuiu a elevar significativamente a consciência moral da humanidade.

            A lei pode favorecer ou atrassar o progresso moral da humanidade. Uma lei que favorece a tortura, a pena de morte, a desigualdade entre os seres humanos, o maltrato aos animais e o estrago da natureza atrassa o progresso moral da humanidade. Mas uma lei que obriga a que os seres humanos se prestem ajuda em casos determinados, que favorece que os povos possam decidir o seu futuro, que penaliza a violência de gênero exemplarmente,... impulsa o progresso moral da humanidade. 

            Casado é presidente dum partido que tomou várias medidas legislativas que retardam o progresso moral da sociedade espanhola. Uma norma como a lei «mordaça» dificulta a livre expressão dos cidadãos e somente tem um sentido repressor do dissentimento com a finalidade de dificultar a protesta contra a implantação de medidas que atentam diretamente contra as normas democráticas mais elementares, e, por conseguinte, é uma lei que se podia qualificar de injusta e, por conseguinte, imoral, e não marca a ética senão que a destrui. Uma lei como a do nomeamento do diretor da RTVE por maioria simples, somente tinha como objetivo controlar as consciências manipulando a informação que se transmite à cidadania. É uma lei que pretende uma rendabilidade política do partido do governo, em contra dos seus adversários, aproveitando o seu controle dos mídia. É também uma lei que podemos qualificar como injusta, e, portanto, imoral, e que atrassa e prejudica a moralidade social. 

            Quando se restaura uma monarquia historicamente corrupta e se protege o seu comportamento pola censura não se busca uma sociedade mais justa e transparente, senão que se busca instaurar por lei o privilégio e a corrupção, e isto não marca ética alguma, senão que a atrassa o estabelecimento duma sociedade mais justa e mais igualitária. Quando se permite que um ex-presidente do governo acumule ingressos por soldo e ingressos privados à margem de qualquer pensão e se impede que um pai de família acumule uma pensão de quinhentos euros com uma retribuição por alugueres de douscentos, isso implica oficializar a discriminação e a injustiça. Quando se promulga uma lei de relações laborais que deixa aos obreiros ao arbítrio dos empresários, com salários precários e a tempo parcial que não permitem uma vida digna, oficiliza-se a imoralidade e a injustiça.    

10/08/2018