31 jul 2014

Prolegómenos da Revolução Francesa e situação atual




Imos estabelecer um confronto entre a situação prévia ao estalido revolucionário na França e a situação crítica atual, por considerar que ha muitos elementos comuns a ambos.Vai em galego reintegrado por considerar que a nossa língua coincide com o chamado português e que somente por razões políticas se explica a tendência a afastá-los na prática para debilitar a língua nascida na Gallaecia. Este fato contribui á difusão da mensagem e facilita os problemas de correção ortográfica.   




I.- Fatores políticos
    1.- Prolegómenos da revolução francesa
        A.- Situação real
        B.- As novas idéias
            a.- Regime constitucional e divisão de poderes
            b.- Estado mínimo
            c.- Organização centralista do Estado
            d.- Soberania nacional
            e.- Defesa do parlamento como sede da soberania nacional
            f.- Direito de autodeterminação
            g.- Internacionalismo e cosmopolitismo
    2.- Etapa de crise atual
        A.- Situação real no estado de crise atual
            a.- Poder omnímodo do monarca
            b.- Serviço ao povo mais sem o povo
            c.- Identificação do monarca com o Estado
            d.- Corrupção
        B.- Ideologia subjacente na etapa de crise atual
            a.- Regime constitucional e divisão de poderes
            b.- O Estado mínimo
            c.-  Organização centralista do Estado
            d.- Soberania nacional
            e.- Defesa do parlamento como sede da soberania nacional
            f.- Direito de autodeterminação
            g.- Internacionalismo e cosmopolitismo
II.- Fatores socioeconômicos
    1.- Prolegómenos da Revolução Francesa
        A.- Situação real na França e a Espanha
        B.- Idéias do liberalismo econômico do século XVIII
            a.- Propriedade privada dos meios de produção.
            b) Liberdades econômicas individuais.
            c.- Individualismo
            d) Livre concorrência.
    2.- A economia na etapa de crise atual
        A.- Situação real da economia
            a.- Crise econômica.
            b.- Bancarrota nos países mediterrâneos
            c.- Forte concentração do capital
            d.- Recortes seletivos antipopulares e anti-sociais
            e- Imposição fiscal pro oligárquica e clerical
III.- Fatores culturais
    1.- Prolegómenos da Revolução Francesa
    2.- A cultura no tempo atual
IV.- Desenlace



I.- Fatores políticos



1.- Prolegómenos da Revolução Francesa


O século XVIII foi o século de epílogo do despotismo iluminado e de eclosão e assentamento  das novas idéias iluminadas.

A.- Situação real


Imagem da Revolução Francesa
Durante o Antigo Regime o rei  unifica os seus reinos e, apoiando-se nos Concelhos, vai acumulando cada passo mais poder em detrimento da nobreza latifundiária, que se converte em ociosa e cortesã. Duma monarquia autoritária no século XVI, passamos a uma monarquia absoluta no XVIII. O rei não tem nenhum dever para com os súbditos senão só direitos, tem um poder omnímodo, é dono da vida e fazenda, sem estar limitado por nenhuma lei nem sequer pola própria lei que o príncipe promulgue -salvo a lei divina-, rex, lex, (o rei é a lei), e, por tanto, acumula um poder absoluto, tanto legislativo como executivo e judicial, eliminando toda divisão de poderes, ainda que, influído polo iluminismo, procurasse o bem dos súbditos, todo para o povo mas sem o povo (Despotismo ilustrado). O representante mais destacado deste poder absoluto é Luís XIV de França (1643-1715), o Rei Sol, com a sua célebre fórmula, ĺÊtat c’est moi. Pode dispor dos bens dos súbditos, que só têm deveres mais nenhum direito para com o Rei, que está por acima da lei, que só representa sua vontade. Duma monarquia que considerava a cidadania como súbdita e servidora do rei, passamos a uma concepção do rei como servidor do Estado, representada por Federico II de Prússia (1740-1786), um dos máximos expoentes do despotismo ilustrado e, segundo Kant, o príncipe que melhor representava o espírito da Ilustração, “o nosso tempo é a época da ilustração ou «o século de Federico»”1, que se condensa no uso público da razão, frente á obediência cega: “ouço exclamar onde quer: não razoes! O oficial di não razoes, adestra! O financista: não razoes e paga! O pastor: não razoes, tem fé! Um único senhor di no mundo: razoai todo o que queirais e sobre o que queirais, mais obedecede!2, ao tempo que afirmava que «O Rei é o primeiro servidor do Estado». Segundo Federico, um príncipe que aspirasse ao “ideal de humanidade” deveria ter em conta, em primeiro lugar, o bem e a felicidade dos seus súbditos. Em política exterior pretendia dotar a Prússia dum rol relevante entre as potências européias.

O rei, que o era pola graça de Deus, controla pessoal e imediatamente  a administração, para o qual precisa a cada passo mais funcionários. que em vez de ser nomeados, como outrora polas cidades e corporações, o serão desde agora polo Rei, criando uma organização uniforme e fortemente centralizada. O modelo centralista francês criou um sistema macrocefálico concentrando todas as energias do país em Paris, e massacrou todos os fatos diferenciais -foi quiçá o mais etnocida do mundo-, arrasou línguas e culturas e afastou as decisões dos cidadãos.

O projeto de Luís XIV era que os Bourbon reinassem na Europa e com essa finalidade contraiu matrimônio com Maria Teresa, filha de Felipe IV, e o seu predileto para reinar na Espanha era o seu neto Felipe V, sucessor também de Luís XIV ao trono da França, mais como isto rompia o equilíbrio europeu, as potências  européias, Áustria, Holanda, Inglaterra, unidas na Tripla Aliança, puseram-se de lado do arquiduque Carlos e desencadeou-se a guerra com os Bourbon. Com a morte do imperador José I em 1711, o arquiduque converteu-se no seu herdeiro, mudando a situação geopolítica em benefício de Áustria, rachando o equilíbrio, esta vez, em favor dos austríacos, o qual provocou a ruptura de Tripla Aliança, que foi seguida pola renúncia de Felipe V ao trono de França, para ter expedito o caminho para reinar na Espanha.

Á chegada de Felipe V, a situação em Espanha era de ruína da Fazenda pública, deficiente preparação e desorganização no exército, corrupção na Administração e desprestígio exterior. Para corrigi-la, estabeleceu novos impostos para fazer mais equitativa a carga fiscal e fomentou a intervenção do Estado na economia. Com objeto de favorecer a agricultura e impulsar as manufaturas reais, importou de França o modelo centralista de Administração que seria gerida pola Coroa, e por intendentes ao estilo francês nomeados por ela, e confiada a funcionários profissionais nomeados pola sua preparação e competência, e ascendidos por méritos. Deveriam ser bem retribuídos para evitar a corrupção. O modelo francês de administração centralizada, negador dos direitos coletivos, produziu também um etnocídio cultural no Estado espanhol, ao implantar a consigna de Felipe V de “reduzir todos os meus reinos da Espanha á uniformidade dumas mesmas leis, usos,  costumes e tribunais, governando-se igualmente todos polas leis de Castela, tão louváveis e plausíveis em todo o Universo3. Os decretos de Nova Planta de Aragóm, Valência, Catalunya e Malhorca, abolindo as suas instituições, leis, usos, línguas e tradições, são a sua conseqüência lógica, e traduziu-se no triunfo do modelo vertical de Administração, uniformizador, homogêneo e vertebrado em torno a um polo único com centro em Madrid, sobre o modelo horizontal, plural e diverso, respeitoso com os fatos diferenciais, com pluralidade de polos de poder. São as políticas dos que crêem que encarregando-se eles das cousas já todo vai melhor, trasladam os ninhos da corrupção duns pontos para outros, em benefício de parte, incrementando-a e terminando á longa por fracassar, e isto foi o que aconteceu, como o demonstra o motim de Esquilache.

No Estado espanhol, o monarca iluminado por excelência foi Carlos III (1759-1788), o terceiro filho de Filipe V, admirador de Federico II de Prússia, pessoa corrente, segundo Pinedo e alii, “educado á espanhola, quer dizer, buscando cuidadosamente apagar nele qualquer destelho de inteligência e de personalidade independente4, que aprovou as reformas impulsadas polo seu secretário de Fazenda, Marqués de Esquilache, que deram lugar aos levantamentos que se produziram em muitas cidades do Estado, entre elas, Madrid, A Corunha, Cuenca, Zaragoza, Ovieu, Santander, Bilbo, Barcelona, Cádiz e Cartagena. Em Madrid o motim de Esquilache de 1766 dirigia-se contra o governo do Estado enquanto que nas outras capitais as protestas tinham como alvo as autoridades locais, o qual é indicativo de que existia um clima geral de descontento derivado da corrupção e incompetência das autoridades. O detonante dos protestos cidadãos foram as medidas de liberalização do comércio dos cereais que se traduziu num acrescentamento dos preços dos produtos de primeira necessidade, o incremento da pressão fiscal para fazer frente aos dispêndios originados pola Guerra dos Sete Anos e a ordem de obrigar os madrilenhos a cambiar a capa longa e a aba larga do chapéu, pola capa curta e o sombreiro de três picos, com objeto de poder detectar a comissão de crimes durante a noite. Isto propiciou a substituição de Esqulache polo Marquês de Aranda, a importação de cereais para conter os preços e a presença, entre os concelheiros, de deputados eleitos por sufrágio polo  estado lhano.   

Luís XVI (1774-1789), neto de Luís XV, era um rei com pouca personalidade e estava desprestigiado. Governa de fato sem parlamento, pois não convocava a Assembléia de Notáveis nem os Estados Gerais, que não se reuniram desde 1614. No século XVIII, surgem as idéias que vão enterrar a monarquia absoluta: parlamento, divisão de poderes, democracia, igualdade. Montesquieu rejeita a monarquia absoluta e de origem divina e advoga por uma monarquia parlamentaria, com poderes limitados, na que o Parlamento é o órgão legislativo, e  estabelece a separação de poderes em legislativo, executivo e judicial, como condição para o estabelecimento dum regime democrático. 

O absolutismo deu passo ao princípio de soberania nacional e mais tarde ao de soberania popular. A fonte de todo poder  não é a pessoa física do monarca senão a nação, -que se traduz no sufrágio censitário-,  e,  mais tarde, o povo, sufrágio universal masculino e posteriormente feminino.

B.- As novas idéias


Durante a época do despotismo iluminado, s. XVIII, consolidam-se as idéias ilustradas, superadoras e enterradoras do Antigo Regime, que têm como traços mais destacados, no eido político, os seguintes:

a.- Regime constitucional e divisão de poderes

Exigência dum regime constitucional com separação de poderes: legislativo, executivo e judicial. que fixasse os direitos e limitasse o poder real e o do governo, precisando o marco de atuação governamental. Devido a que todo poder tende a corromper, sobre todo se é ilimitado, em todo corpo político são tem que haver um sistema de freios e contrapesos. Os autores que mais contribuíram a impulsar a divisão de poderes foram John Locke e Montesquieu.  Necessidade dos partidos políticos como canais da opinião política.

b.- Estado mínimo

Segundo a concepção liberal, própria do iluminismo, o governo é um mal necessário para procurar a segurança e a liberdade dos cidadãos. Segundo Adam Smith, deveria procurar a segurança, proteção frente á injustiça e criar as instituições e obras públicas que não sejam lucrativas para os indivíduos. O Estado é um aparato de coerção que tem como fim não a promoção do bem-estar senão a repressão do mal, a busca da segurança: proteger a vida, saúde e propriedade dos cidadãos, quer dizer, deve limitar-se a operar como uma espécie de estado policia, sem intervenção de nenhuma classe na ordem econômica e sem intromissões na vida privada dos cidadãos. Toda interferência do Estado produz uniformidade, míngua a diversidade e o livre jogo das forças e iniciativas dos indivíduos e dos grupos numa sociedade dada e é um obstáculo para o desenvolvimento da individualidade.  Igualmente, a luta contra o despotismo estatal é um constituinte básico de toda doutrina liberal. Como di Humboldt, "O Estado deve abster-se de todo tipo de solicitude polo bem-estar positivo dos cidadãos e não deve dar nenhum só passo mais dos estritamente necessários para a sua segurança e para a defesa frente a inimigos exteriores. Nenhum outro objetivo lhe autoriza a restringir a liberdade dos cidadãos"5.

Desde mediados do século XIX, o liberalismo foi assumindo progressivamente que o Estado deve ter um certo grau de intervenção na vida econômica com objeto de reduzir as desigualdades sociais e incrementar a felicidade e o bem-estar geral. Podem estabelecer-se certas limitações na liberdade de empresa se isso favorece o bem-estar social. O Estado pode intervir para ajudar os mais necessitados e contribuir a uma melhora da sanidade, educação e bem-estar geral, pois a sua ajuda procura graus superiores de liberdade e segurança individuais.

c.- Organização centralista do Estado


O liberalismo espanhol e galego acentuarão a soberania do Estado espanhol, em detrimento dos ideais autonomistas, defensores duma distribuição territorial do poder entre os diversos povos que são nações. Os liberais galegos pregoam a uniformização do País basco com o resto de Espanha e consideram o provincialismo como a causa de parte dos males do país.

d.- Soberania nacional

A soberania nacional, de procedência roussoniana, deve substituir a soberania real segundo a qual a base de toda soberania é a nação e não o monarca. Para o autor genebrino, o pacto social dá ao corpo político um poder absoluto sobre todos os seus membros, "e é este poder o que, dirigido pola vontade geral, leva, como disse, o nome de soberania"6. A democracia é também um requisito para o desenvolvimento econômico, porque a alternância pacífica no poder permite o normal desenvolvimento da atividade produtiva.

e.- Defesa do parlamento como sede da soberania nacional


Dado que, salvo em países mui pequenos, não é possível a democracia direta, o Estado deve estar dotado de instituições representativas, nas que as maiorias podam representar a totalidade. A soberania absoluta, que era uma prerrogativa do monarca e exercida pola sua pessoa física, agora passa ao povo, e é exercida polo parlamento. As democracias atuais são democracias de partido e o partido que controla o Parlamento controla a soberania popular, e se o chefe do partido controla o governo e o parlamento exerce praticamente um poder absoluto. Neste caso, não teríamos só um absolutismo de partido senão um absolutismo do chefe de partido. A eleição do parlamento pode fazer-se por sufrágio censitário, no que somente votam os ricos, como acontecia no liberalismo do século XIX, ou por sufrágio universal, tanto masculino como feminino, como sucede no liberalismo democrático atual.

f.- Direito de autodeterminação


Direito de autodeterminação, para que os habitantes dum território com um certo peso demográfico, a título individual, formem uma nação ou se unam a alguma das existentes, idéia defendida explicitamente por Marie-Jean-Antoine-Nicholas de Caritat, marquês de Condorcet (1743-1794). A nível individual, como traço próprio da vontade humana, ou "faculdade de determinar-se um a si mesmo a obrar consoante a representação de certas leis", é unha característica distintiva da ética kantiana.

A autodeterminação política, ou seja, a capacidade dum povo “para poder decidir sobre o seu próprio futuro, sem ingerências alheas"7, pode ser interna ou externa. A primeira consiste na decisão dos membros da comunidade sobre a sua forma de governo, a formação de governos representativos baseados no consentimento dos cidadãos; a segunda, na decisão a respeito das relações com outros grupos, e pode concretar-se na união, ex.: o caso de Porto Rico, de Itália, Alemanha e Polônia no século passado; autonomia, caso da Itália atual; Federalismo, caso dos EEUU de América; Suíça, México, ... ou independência, caso de Estônia, Letônia, Lituânia, Eslováquia, República Checa, Eslovênia, Croácia, Servia, ... 

Este direito exerceu-se profusamente a partir da Revolução Francesa. Está latente quando em 1790 se discute a questão de Alsácia; em 1791 permite-lhe a França anexar Avignon e Venoussin, e, em 1792, Saboia, Hainaut, Mulhouse e Renánia. O 7/06/1905 foi exercido polo Parlamento de Noruega para proclamar a sua separação de Suécia; o 28/19/1918 polo Comitê nacional checo para proclamar a independência de Checoslováquia do império austro-húngaro; o 13/11/1918 por Hungria para separar-se de Áustria; e igualmente por Sérvia, Croácia e Eslovênia para formar Iugoslávia. Ao longo do século XX, utilizou-se para os processos de descolonização de diversos povos, principalmente africanos e asiáticos, e a finais do século XX, permitiria a independência da URSS de Lituânia (9/02/1991), Letônia (21/08/1991), Estônia (20/08/1991), Rússia (8/06/1990), Moldávia (24/06/1990), Ucrânia (16/07/1990), Armênia (23/08/1990), Geórgia (9/04/1991), Kazajiám (21/12/1991), Azerbaiiam (21/12/1991), Chechena,... reunificação da Alemanha (3/10/1991); secessão de várias nações de Iugoslávia: Eslovênia (26/12/1990),  Croácia (25/06/1991), Macedônia (9/09/1991), Bósnia (1/03/1992); e de Checoslováquia: República Checa (9/07/1991), Eslováquia, ...

Unha vez concluída a primeira guerra mundial, sob a inspiração do presidente estadounidense Woodrow Wilson, o direito de autodeterminação, entendido como princípio das nacionalidades, quer dizer como o direito duma nação a dotar-se dum estado próprio, foi assumido polos aliados, baixo pressão dos soviéticos, dispostos a defende-lo e a incorporá-lo ao seu texto constitucional, ainda que sem virtualidade pratica ao ficar as nacionalidades despojadas de todo poder efetivo.

O sujeito do direito de autodeterminação são as nações ou povos, ou seja,  "todo grupo ou coletividade humana que tenha por referência comum a uma cultura e a uma tradição histórica própria, desenvolvidas no nome sobre um território geograficamente determinado", e não entidades menores como as regiões que se caracterizam por ser parte duma nação e pola relação de pertença a esta. Mas é possível que uma região emirja e se construa como nação e, como tal, reclame o seu direito de autodeterminação. Algumas interpretações restritivas e interessadas deste direito democrático, por parte dos Estados nacionais, pretendem identificar povo com Estado, e tal seria o sentido que lhe dão ao Pacto internacional de direitos civis e políticos da ONU, que afirma que "Todos os povos têm o direito de livre determinação".

g.- Internacionalismo e cosmopolitismo

O liberalismo é um sistema com vocação supranacional, como o demonstra o caso das multinacionais, do capital transnacional, etc. e o home liberal considera-se um cidadão do mundo. Essa vocação internacionalista baseia-se na divisão internacional do trabalho e na conseguinte interdependência entre os diversos países e realiza-se pola concorrência pacifica entre todos os estados, ao igual que no interior pressupõe competência pacífica entre os diversos agentes econômicos, por considerar que as situações conflituosas deterioram o normal desenvolvimento da atividade produtiva. 

2.- Etapa de crise atual


A.- Situação real no estado de crise atual


Do apartado 1.- A, de I.- Fatores Políticos, destacamos e comentaremos os seguintes aspectos:
a.-  O poder omnímodo do monarca
b.-  O serviço ao povo mas sem o povo.
c.-  Identificação do monarca com o Estado
d.- Corrupção

Se confrontamos cada um destes aspectos com o que acontece na política atual, constatamos  similitudes importantes.

a.- Poder omnímodo do monarca

O rei tem um poder de representação, mas não um poder real e efetivo. Um presidente do governo de Espanha, ainda com maioria absoluta, não tem um poder omnímodo em quanto que não pode dispor da vida e fazenda dos seus cidadãos, senão que, teoricamente, está submetido não só a Constituição senão também ás leis, incluídas as próprias que ele promulga. O presidente atual, porém, é o presidente que acumulou mais poder na etapa democrática, que lhe permite controlar o partido, o Governo, o Parlamento do Estado e grande parte dos parlamentos das CCAA, o Tribunal Constitucional, o Conselho Geral do Poder Judicial, o Tribunal de Contas, quase todos os mass media impressos e a maior parte dos digitais, incluídas as televisões públicas e, indiretamente, grande parte das privadas, etc. Em quanto que goza de grandes apoios não é um político débil como Luis XVI, mas se bem sacou peito frente aos obreiros, impondo-lhes condições leoninas de trabalho e subsistência, frente a Europa aparece como político sumamente débil e submetido ao império da troika e especialmente da chanceler alemã Angela Merkel. 

Embora nenhum político ousa afirmar que está por acima da lei si que se observa uma prática política, tanto no PP como no PSOE, tendente a conculcar, violentar ou distorcer mui freqüentemente tanto o espírito como a letra da Constituição e das leis, auxiliados neste labor polos órgãos judiciais, proclives a inclinar as suas sentenças de acordo com a cor política de quem os nomeou. A Constituição estabelece que “a riqueza das distintas modalidades lingüísticas de Espanha é um patrimônio cultural que será objeto de especial respeito e proteção”(art. 3.3), mas, após 36 anos de ter-se aprovado este artigo não se promulgou medida alguma para o seu cumprimento; o artigo 20.d consagra o direito a “comunicar ou receber livremente informação veraz por qualquer meio de difusão”, enquanto se põe em prática uma política informativa para a manipulação nos mesmos meios públicos, como acabam de denunciar desde a própria TVE em referência ao caso Bárcenas, Diada, etc.; e desde a oposição a respeito de RNE. O Comitê de empresa da TVG denunciou num comunicado, em fevereiro de 2013, a manipulação que, uma vez mais,  “padecem os informativos do canal público” e advertiu das “pressões” e as “intervenções sobre o seu trabalho” que estão sofrendo “de maneira quotidiana” os trabalhadores do meio, que se agravou a raiz do caso Pokémon e Bárcenas. Isto levou-nos a criar em abril de 2013, uma bitácora, com o nome «eunonmanipulo» para combater estas práticas, pondo-as em conhecimento da cidadania, á qual remitimos o leitor interessado. Segundo o Comitê de Empresa, o modo de realizar a manipulação é a seguinte: “Diretores e editores escolhem as notícias que se vão dar e, após encarregar-lhas aos jornalistas, indicam-lhe nos casos conflituosos o que tenham que destacar”. "Incluem-se sempre comentários ou declarações que deixam em bom lugar o PP e aos seus dirigentes. Paralelamente, dos grupos da oposição destacam-se informações negativas, polêmicas internas e problemas", explicam. Expõem o seguinte exemplo: “O abandono do alcalde de Salceda de Caselas e de cinco concelheiros do BNG foi tratado em vários informativos do canal público, enquanto que da marcha de seis edis de Ames do Partido Popular somente se informou no  boletim local de Compostela8. Acrescenta o Comitê que se chegaram a modificar textos escritos polos jornalistas da TVG `para ocultar a afiliação política dos imputados do PP, ao tempo que se ressalta este dado quando são da oposição. Críticas neste mesmo sentido são emitidas tanto pola oposição como polos mesmos jornalistas.

O artigo 35, 1, estabelece o “dever de trabalhar e o direito ao trabalho, á livre eleição de profissão ou ofício, á promoção a través do trabalho e a uma remuneração suficiente para satisfazer as suas necessidades e as da sua família” e, não obstante, o que se está a produzir é o reconhecimento dos privilégios dos banqueiros e das grandes fortunas, os paraísos fiscais, os indultos a defraudadores, a ocultação de patrimônios ganhados indevidamente, ao tempo que se envia ao paro a milhões de pessoas, se impulsam de direito ou de fato os minijobs, se impõem salários de miséria, se elimina a proteção dos trabalhadores e a sua capacidade de pactar os convênios, ... Se em vez de olhar a Constituição olhamos para o programa do PP de 2011, a contradição entre o refletido e o posto em pratica não pode ser maior: “Propomo-nos alcançar como reto iniludível um mercado de trabalho justo, seguro e flexível inspirado nas melhores experiências dos países europeus que viram passar a crise sem perda de emprego. Será uma reforma integral á altura do reto planeado por quase cinco milhões de desempregados”. Oferecem impulsar um trabalho justo e impulsam um maior desequilíbrio e injustiça nas relações laborais; oferecem um trabalho seguro e favorecem os despedimentos e os ERES, e o único que garantem é um trabalho mais flexível, entendido como mais precário, mais desprotegido, e em definitiva mais inseguro.

O artigo 47 reconhece aos espanhóis o direito “a desfrutar duma vivenda digna e adequada. Os poderes públicos promoverão as condições necessárias e estabelecerão as normas pertinentes para fazer efetivo este direito”, mais o único que se garantiu foi o direito dos bancos, incluídos os resgatados com fundos públicos,  a poder despejar as pessoas que não são capazes de fazer frente á sua hipoteca, deixando-os sem casa e com a obrigação de continuar pagando o importe duma hipoteca que eles mesmos taxaram por acima do valor real da vivenda. O artigo 50 determina que “Os poderes públicos garantirão, mediante pensões adequadas e periodicamente atualizadas, a suficiência econômica aos cidadãos durante a terceira idade”, mas o que se faz é legislar precisamente para que as pensões perdessem valor aquisitivo e se convertam precisamente em pensões de miséria. Após todo isto, temos ainda que escutar dos governantes, que realmente não nos representam, que a Constituição está plenamente vigente e que não se deve cambiar e em todo caso ha que fazê-lo com o mesmo consenso com o que se aprovou, com objeto de fazer inviável qualquer reforma na que eles não estejam de acordo. 

Depois de tanto tempo de ter-se aprovado o Estatuto basco, fica ainda sem cumprir, apesar de ser uma lei orgânica do Estado; o mesmo podemos dizer do Estatuto de Catalunya; a política penitenciária segue a penalizar os presos etarras com uma ampliação de condena pola política de dispersão; aplica-se uma política de indultos para favorecer os amigos e poderosos; o governo in-cumpre a sua própria lei de morosidade no pagamento a provedores e investidores e também a lei para fixar a tarifa elétrica. O 3/07/2014, UPyD acusa o Governo de in-cumprir a lei de transparência por não ter publicado o decreto polo que deve aprovar-se o Estatuto Orgânico do Conselho de Transparência, o que impediria que estivesse vigente a finais de ano; a lei de dependência em vez de cumpri-la o que se fixo foi desconstruí-la, ...  De todo isto segue-se que a impressão que nos oferecem certos grupos políticos é que a lei está para ser violada, como cruamente afirmou Castelao Braganho. Este fato supôs-lhe a cessação quiçá por dizê-lo em público, mas não por aplicá-lo, como o seu partido. No tocante ás sentenças judiciais, citamos algumas das mais soadas: as que deram lugar á doutrina Parot, á doutrina Atutxa, á doutrina Botim, etc.

Depois de todos estes in-cumprimentos surpreende que desde o Governo do PP e dos corífeus tertulianos se pretenda identificar democracia com o cumprimento da lei, quando lhes interessa para desacreditar o eventual referendo catalão, mas, a todas luzes, constata-se que são noções totalmente distintas. A lei é a regulação estabelecida por um poder político, seja democrático, oligárquico, monárquico, ditatorial, etc. enquanto que a democracia é um dos sistema, por certo mui recente, de organização do poder político baseada na vontade popular, tanto na eleição dos seus representantes como na legislação emanada dos poderes políticos. Além disto, numa sociedade democrática e quase justa, em certos casos, dentro da fidelidade á lei, pode estar legitimado moralmente desobedecer a lei, quando as autoridades deixam de ser fieis aos pactos assumidos e em casos de colisão com os direitos humanos dos afetados pola norma. No caso do Governo do PP que in-cumpre claramente o seu programa, alguém poderia suster que a desobediência civil está justificada moralmente, dentro dum clima de respeito á lei, por não aplicar o programa político com o que se apresentou ás eleições, por ter perdido a legitimidade de  exercício, que deslegitima para governar por muita legitimidade de origem que tenha e que não se questiona.

b.- Serviço ao povo mais sem o povo

Creio que nesta máxima ha muito de hipérbole pois em realidade nunca se intentou em sério cumprir o lema de «tudo para o povo» ainda que si o de «sem o povo», porque em realidade as elites extrativas continuaram a desfrutar do favor político, tanto na França como na Espanha, se bem se viram obrigadas a compartir o seu rol com um novo estrato emergente com força, a burguesia, desigualmente desenvolvidas nestes dous países, enquanto que as massas  trabalhadoras, coalizadas num primeiro momento com a burguesia,  se converteriam nas grandes perdedoras deste processo. Agroma, porém, um novo ideal, a nível incipiente, de luta pola felicidade da população, reduzido inicialmente a um sentimento humanitário sem virtualidade prática, que entra em contradição, aliás, com o rol assinalado ao estado mínimo, mas que  progressivamente se vai instalando com mais força como objetivo dos dirigentes políticos, quer dizer, surgem os alicerce ideológicos do estado do bem-estar, conceito este que substituirá o de felicidade.

Um observador imparcial sacaria hoje -2014- a conclusão de que o lema que se está a aplicar é a de todo para as elites privilegiadas e extrativas, com objeto de que vejam garantidos a sua situação econômica e os seus privilégios e o mínimo para o povo, que ja tem bastante com votar cada quatro anos, previamente, isso si, bombardeado, manipulado e intoxicado pola fábrica de mentiras governamental e partidárias, convenientemente apoiada pola intelectualidade orgânica de turno, com via larga de acesso aos meios, e regado o processo eleitoral com contribuições «voluntárias» e «generosas» á Caixa do partido. Na atualidade, principalmente os políticos da direita, não se privam de afirmar que ha que reduzir o estado do bem-estar, ou seja, que ha que desconstruir o que se tem conseguido nas últimas décadas por ser -dizem- inviável na prática apesar de que a riqueza do país se tem incrementado notoriamente. 

c.- Identificação do monarca com o Estado

Na atualidade nenhum político ousaria afirmar, como Luís XIV, l’êtat c’est moi, identificando a pessoa física do monarca com o soberano, concepção que seria substituída no século XIX pola soberania nacional de procedência roussauniana, ou seja, que o Estado se identifica com a  nação, e já a finais deste século pola soberania popular, convertendo-se o povo em soberano exclusivo e identificado como o Estado, passando o ser o rei um representante do Estado e, por tanto, da soberania popular, quer dizer, do conjunto de habitantes que constituem a nação

Os partidos dominantes a nível do Estado espanhol consideram o Estado como o seu patrimônio particular e exclusivo, a sua parcela privada, com direito a impor as suas condições a todos os demais  povos que convivem dentro das suas fronteiras, negando a sua identidade nacional, ou assumindo um reconhecimento puramente nominal, e ficando reduzidos os seus povos a uma espécie de inquilinos morosos e molestos que ha que suportar, controlar e dominar. Não foram capazes de superar o beco sem saída de Ortega quando afirmava que o problema dos nacionalismos não cumpre resolve-lo senão com-levá-lo, proposição absurda que expressa a inanidade da política e, conseqüentemente, dos políticos, e o mesmo Ortega tem demonstrado sobradamente a sua inépcia a este respeito, como pode constatar qualquer pessoa que conheça as atuações do seu partido político «Agrupación al Servicio de la República». E enquanto o problema do Quebec está claramente posicionado em termos políticos democráticos, ao igual que o de Escócia, o de Catalunya, Euskadi e Galiza, não se pode solucionar porque aqui, polo que se vê, não cabe um posicionamento político e democrático semelhante.

d.- Corrupção

Entende-se por corrupção a ação ou omissão de pessoas em quanto indivíduos, sejam ou não membros de organizações, ou de pessoas em quanto atuam em nome e representação de instituições como tais, consistente em aproveitar-se dos meios públicos ou privados em benefício próprio ou do grupo ao que representam, em prejuízo do resto dos cidadãos. Se os indivíduos atuam em nome e representação de instituições como tais, seja em benefício destas ou alheio, a corrupção chama-se sistêmica. O benefício que se procura pode ser econômico ou eleitoral, como o obtido por meio do controlo dos meios de comunicação de massas, especialmente a televisão.

A corrupção na Espanha, endêmica durante os reinados dos Áustrias e Bourbons, alcançou o zênite durante o reinado de João Carlos I. Qualquer observador imparcial ficaria abraiado e admirado ao contemplar o panorama atual. A impressão que tem a cidadania é que todas as instituições do Estado estão manchadas e que todas as elites, por chamá-las dalgum modo, se dedicaram a roubar e a tapar-se mutuamente as suas desvergonhas, começando pola Casa Real. Tem-se falado muito do escândalo produzido pola caça de elefantes, mais isto, que é mui significativo, não deixa de ser um assunto menor, se bem é indicativo da dobre moralidade do seu protagonista porque preside associações ecológicas e dedica-se a matar ursos borrachos ou animais mui inteligentes e protegidos, como são os elefantes, abandonando Espanha num momento de enorme crise econômica rodeado da sua amante, para gozo pessoal. É um assunto menor porque não é equiparável com o roubo de dinheiro público que os meios lhe atribuem, ao assinalar-lhe uma fortuna de perto de 2 mil milhões de euros, impossível de amassar com um trabalho honrado. Aliás, está a corrupção do seu genro e filha, que os meios interpretam por vezes como uma praxe mimética do que lhe vem fazer ao monarca. A justiça retributiva só se pode reparar com a restituição do dinheiro retraído aos seus legítimos donos, que são os sofridos contribuintes, e com uma praxe de transparência no próprio proceder.

O Tribunal Constitucional emite sentenças al libitum do seu amo, ou seja, dos que nomeiam aos magistrados por «cupo», que representa uma espécie de direito de pernada jurídica, que, entre outras cousas, produziu o engendro da sentença contra o Estatuto de Catalunya, origem do atual conflito político catalão, emitida por um Tribunal com um mandado caducado desde novembro de 2010, o que levou á demissão de três membros do Tribunal - Eugeni Gay, Elisa Pérez e Javier Delgado- em junho de 2011, alegando o primeiro não poder continuar num Tribunal seqüestrado.  E o resultado de sentenças deste cariz é ao que chamam democracia e estado de direito, os seus protagonistas PP e PSOE.

O Tribunal Supremo também sofreu fortemente na sua reputação quando o seu Presidente, Carlos Dívar Blanco, se viu abrigado a demitir do seu cargo em junho de 2012 a conseqüência de malversação de dinheiro público por ter realizado uma série de viagens a Marbelha vários fins semana, sem a devida justificação, abonados com cargo ao erário público. Um dos seus vogais, Pasqual Estevill foi condenado por prevaricação por extorquir a acusados com objeto de conseguir que lhe ingressassem dinheiro na sua conta a cambio de favores penitenciários.

Os partidos políticos dominantes competem mutuamente em lançar-se acusações de corrupção política, com uma história que poderia ser exemplificadora da perda dos valores morais. Cingindo-nos ao momento presente, o PP está mergulhado numa corrupção que os meios descrevem muitas vezes como sistêmica, por abranger ás mesmas elites que ostentam ou  ocupam o poder executivo do Estado. O PP vê-se salpicado pola Gürtel, Caso Bárcenas, Pokemom, Noos, ... O PSOE nos ERES de Andaluzia e na Pokemom. O surpreendente é que os mesmos que nos mergulharam no lixo são os que se auto-proclamam competentes para redimir-nos e regenerar-nos, ao igual que se amostram adais da transparência os que mentem, ocultam e obstruem o labor da justiça. O controlo dos meios de comunicação de massas, mui especialmente da televisão, por parte dos partidos governantes foi uma constante tanto na Espanha como na Galiza, de tal modo que não se pode falar de televisão como serviço público senão de televisão governamental.

Estão imersas na corrupção também as fundações ligadas aos partidos políticos, que se converteram numa espécie de mecanismo para arrecadar fundos públicos teoricamente para realizar estudos sobre a realidade do país, mas que na prática serviram para aproveitar-se deles em benefício próprio e para utilizá-las como mecanismos de propaganda eleitoral. A utilidade social dos seus estudos não se vê por nenhures, como a amostra o fato de que os políticos espanhóis realizaram sempre políticas curto-prazista para fazer frente á crise, sem terem desenvolvido nunca prognósticos sérios da evolução da economia, sociedade, cultura, etc. dignos de tal nome, e pola imprevisão e incompetência dos dirigentes dos partidos dos que dependem. Entre as que mais fundos arrecadam figuram a FAES, presidida por Aznar, com mais de sete milhões de euros por ano, e as ligadas ao PSOE com mais de seis milhões, seguidas a muita distância da Josep Irla, próxima a ERC, e a fundação privada catalanista e demócrata Trias Fargas, na órbita de CDC. ...

Os sindicatos e organizações empresariais também se viram salpicadas pola corrupção no tocante aos cursos de formação por terem detraído somas importantes de dinheiro público para cursos não guiados ou, o mais freqüente, retribuídos ao pessoal que os guiou por uma soma inferior á da subvenção recebida do Estado, ficando no seu poder o restante. E provável que a administração, tanto estatal como autonômica, fossem conscientes disso porque de fato prepararam o sistema que o fazia possível. É, pois, difícil crer que o governo de turno não se inteirasse do que estava a ocorrer e que o silêncio não for cúmplice, quiçá com a pretensão de obter compensações crematísticas ou ser correspondido com o silêncio em situações nas que eles eram os favorecidos.

As deputações foram historicamente um ninho de corrupção por parte dos que as geriram, neste caso principalmente o PP, ao tempo que um instrumento do centralismo mais jacobinista e do clientelismo político em favor dos seus interesses. Agora, parece que em vez de corrigir este desaguisado vão ser recompensadas com umas competências muito maiores, ao encomendar-lhe várias das funções que na atualidade vêem desempenhando os concelhos.

A Igreja cristã não assumiu os ideais ilustrados senão que se enfrentou ao Iluminismo como a um inimigo que cumpre combater e superar tanto polo que diz respeito á sua proclividade científica como polo que se refere ao seu combate contra a superstição e o obscurantismo, a defesa dos direitos do home e do cidadão, e contra o mantimento dos privilégios herdados. Isto teve como conseqüência a sua oposição aos direitos humanos e o afastamento da ciência e a opção polos mitos em que assenta a sua doutrina. Hoje está fortemente corrompida nas suas finanças vaticanas e nos aspectos referidos ao sexo: pederastia, pedofilia, subtração de crianças recém-nascidas, ... ao tempo que adoece duma falta total de transparência no seu funcionamento e no destino que lhe dá aos fundos públicos que recebe abundantemente dos contribuintes. É um celeiro de votos mui importante para o partido conservador não só diretamente mediante o voto senão indiretamente mediante a sua influência social a través da sua mensagem e a suas recomendações no confessionário, segundo comentários dos próprios afetados.  


B.- Ideologia subjacente na etapa de crise atual


Polo que respeita ao apartado 1.-  B, de I.- Fatores Políticos, o confronto permite-nos fazer as seguintes observações:

a.- Regime constitucional e divisão de poderes

O Estado espanhol tem um regime constitucional que ampara convenientemente os direitos individuais, ainda que o seu cumprimento na pratica deixa por vezes que desejar, mais ignora os direitos coletivos, os direitos dos povos. Os partidos políticos espanhóis proclamam a sua defesa duma Espanha única e diversa, mais não pode ser diversa quando não reconhece nem teórica nem de fato essa pluralidade. Quando ha nações diversas ha que reconhecé-las e não intentar por todos os meios afogá-las, como foi a política habitual neste país.

Esta Constituição estabelece a necessidade de maiorias qualificadas de dous terços para reformá-la naqueles aspectos considerados mais sensíveis, com o vantagem de que impede que um partido a reforme ele só mas também com o inconveniente de que um dos partidos majoritários basta para impedir a sua reforma ainda que a maioria da população o reclame, e, por tanto, para servir de tampão ás aspirações populares.

Já temos exposto noutras entregas anteriores desta bitácora a inexistência duma autêntica divisão de poderes no Estado espanhol (2/07/2013), e o funcionamento da justiça ao serviço dos poderosos e do espanholismo (15/10/2013), em alusão aos órgãos judiciais nomeados polos partidos que controlam o poder político no Estado, e ás instâncias judiciais sensíveis á pressão do clima político imperante. 

b.- O Estado mínimo

A ideologia hoje imperante na Europa é o neoliberalismo mas corrigido polas políticas des-regulatórias de Margaret Thatcher e Ronald Reagan, medidas que estão na origem da crise econômica atual. É um liberalismo de tipo darwiniano, na que os mais fortes levam sempre as de ganhar na luta pola subsistência, terminando por devorar os mais débeis. Este neoliberalismo depredador, do que está imbuído a FAES liderada por Aznar, não está interessada no estado do bem-estar senão na mantença da situação de domínio e privilegio das elites dominantes, que não deve ver-se limitada por contribuições ás massas desfavorecidas, pois se não estão melhor é só polo seu pouco mérito e capacidade.

A política aplicada no Estado espanhol tanto por socialistas como polos populares foi a de adelgaçar o Estado, privatizando as suas empresas e serviços, mal vendendo-as ou assinalando-as a amigos ou contribuintes á Caixa do partido, para assim solucionar problemas derivados muitas vezes da sua deficiente gestão econômica. Utilizaram também este meio como trampolim para conseguir umas generosas retribuições econômicas trás o cesse e abrindo a via para o funcionamento das portas giratórias.

c.-  Organização centralista do Estado

A esquerda atual afunda as suas raízes no jacobinismo da Revolução francesa que foi quem impôs a organização centralista do Estado francês, quiçá a mais centralista de toda Europa. A sua concepção da nação como uma unidade indivisível levou-nos a reforçar o centralismo vigente em tempos da monarquia mediante a nominação de representantes do governo nos diversos departamentos e submetidos á ditadura tanto econômica como política de Paris.

Outro elemento que reforçou o centralismo da esquerda e que ainda sobrevive, é o internacionalismo marxista, segundo o qual os obreiros não têm pátria e devem unir os seus esforços para lutar contra o capitalismo em todo o mundo e em prol duma sociedade mundial de trabalhadores, frente aos capitalistas que lutavam por manter o espaço estatal para impor nele as suas regras de jogo. Hoje a dinâmica mudou e são os capitalistas quem advogam pola globalização econômica, em quanto que os trabalhadores dos países desenvolvidos têm morrinha do espaço econômico estatal, que poderia protegê-los do deslocamento de empresas, da competitividade dos trabalhadores dos países sub-desenvolvidos sem proteções sociais e com um custo da vida muito menor.

Felipe V importou o modelo francês de Administração centralizada, que foi assumido tanto pola direita como pola esquerda, convertendo-o no seu catecismo político. Criou-se a partir dele um estado macrocefálico com epicentro em Madrid, chuchando as energias dos diversos povos em benefício especialmente da elite radicada na Corte, da sua indústria, comércio e sector turístico. Foi um modelo historicamente fracassado, e que levou a Espanha a uma situação de decadência que teve como fito significativo o desastre de 1998 e como epílogo os governos da Restauração e a ditadura de Primo de Rivera. A II República pretendeu abrir um caminho de cambio, mas as forças centralistas e reacionárias não o permitiram e afogaram esse momento de esperança. Estas elites, tanto as centralistas como as reacionárias, aceitaram a descentralização na Constituição de 1978, como meio para lograr o assentimento constitucional, especialmente dos bascos e catalães, re-criando o Estado das Autonomias, mas, a sua renovada ideologia e praxe centralista, estimulada e louvada polos corifeus tertulianos, sentou as bases para desmontá-lo progressivamente com LOAPAS, leis de bases, pacto de adesão a Europa, sentenças do Tribunal Constitucional, vaziando os estatutos de competências e mudando o seu espírito, com a pretensão de continuar a história da Espanha, uma, uniforme e centralista, tal como a entendia Lerroux, reintegrando competências ao poder central capitalino, impondo os valores, leis e instituições espanholistas a todos os demais povos peninsulares. Como cabalo de Troia desta operação de acosso atua, a nível ideológico, a FAES que preside o ex-presidente Aznar, e a nível executivo, o governo de Mariano Rajoy, com leis que impõem a espanholização de Catalunya, Euskadi e Galiza ou eliminam competências tanto estatutárias como cedidas, que deixam os poderes das CCAA inermes e sem possibilidades de ação para resolver os problemas dos seus habitantes.  Pretextando direitos iguais para todos, expressão da injustiça e chauvinismo espanhol, não toleram a diferença e a pluralidade. Ficariam abraiados, escandalizados e adotariam tons e poses apocalípticas se aqui se quisesse implantar uma pluralidade semelhante a que existe nos diversos Estados dos EEUU de América e não digamos já na Suíça.

Nos nossos dias, o cenário estatal fez-se-lhe pequeno para as grandes empresas multinacionais e lograram impor a globalização do capital em todo o mundo,  condenando aos obreiros á miséria e precariedade. São estes quem nos nossos dias estão mais interessados em recuperar a soberania estatal para defender-se frente a um capitalismo desregrado e sem fronteiras, darwiniano e depredador. Esta soberania estatal deve ir acompanhada da descentralização socioeconômica, política e cultural das diversas nações que convivem no seio do mesmo Estado.

d.- Soberania nacional

A soberania única que se reconhece na Constituição é a do povo espanhol e, por tanto, da nação espanhola, ao tempo que se nega a soberania das outras nações que integram o Estado. Trata-se em realidade de soberania estatal, e não nacional, e popular, porque é o povo e não o abstrato nação o depositário da soberania, que a deposita nos seus representantes.

Esta soberania puxo-se em interdito com a reforma do artigo 135 para dar prioridade ao pagamento da dívida dos bancos e entidades supranacionais, sobre as necessidades da população do país, por tanto, do soberano, e também pola subordinação das políticas governamentais ás decisões da troika, e mui especialmente ás decisões de Merkel. O presidente do governo cambiou o seu programa eleitoral e aplicou disciplinadamente todas e cada uma das políticas que lhe exigiu a chanceler alemã.

e.- Defesa do parlamento como sede da soberania nacional

Todo o mundo repete que o Parlamento é a sede da soberania popular e o poder supremo, tal como defendera Locke. Segundo o art. 66.1, as Cortes representam o povo espanhol, não aos demais povos do Estado, e, por conseguinte, são os representantes da soberania popular desse povo. O art. 8 da CE encomenda-lhe ao Exercito preservar a  “integridade territorial”de Espanha  frente a um eventual intento de secessão de qualquer povo, subordinando os direitos dos povos á integridade da pátria.

As Cortes têm a potestade legislativa e iniciativa legislativa, mais como estão controladas polo partido que sustenta o Governo, que é quem impõe os seus critérios, e as iniciativas que puder apresentar a oposição tem poucas possibilidades de ter êxito, essa iniciativa legislativa fica reduzida a mui pouca cousa, sendo monopolizada praticamente em exclusiva polo Governo. Os legisladores têm que receber o visto bom dos dirigentes do partido para figurar nas listagens eleitorais, nomeadamente do seu presidente, e, por outra parte, estão submetidos a disciplina de voto partidária, com objeto de impedir todo desvio, o qual significa que, de fato, na pratica, estão submetidos a mandado imperativo de partido,.por mais que isto esteja proibido polo art. 67.2 da CE. Hoje a soberania é soberania de partido que faz e desfaz ao seu antolho, e mais em concreto, dos dirigentes que desempenham funções governativas, especialmente do seu presidente.

Quando não intervêm na nomeação dos dirigentes do partido os militantes, simpatizantes ou cidadãos em geral, senão que a nomeação se faz por cooptação, como sucedeu com Mariano Rajoy, nomeado a dedo por Aznar, o resultado é o mais parecido a um monarca-presidente absoluto, que só espera receber o aplauso, aprovação e aclamação dos seus incondicionais.   

Está-se a produzir uma fusão entre o executivo e o legislativo e deste com o partidário, atentando gravemente contra a divisão de poderes, que se vê agravado pola intromissão do legislativo nas nomeações dos Presidentes do Conselho Geral do Poder Judicial, do Tribunal Constitucional, do Tribunal de Contas, constituindo um insulto á cidadania que a CE prescreva que gozarão de independência, quando mantiveram e mantêm uma clara filiação partidária. 

f.- Direito de autodeterminação

Este é um direito de procedência liberal que é ignorado totalmente na CE e negado persistentemente polos políticos da casta, por utilizar uma expressão utilizada com profusão por Pablo Iglesias. Somente reconhecem a autodeterminação do povo espanhol mais os direitos dos demais são totalmente ignorados.

O nacionalismo galego defendeu com persistência este direito democrático dos povos, paralelo ao direito á liberdade individual. Vicente Risco escreveu no ano 1934: "O nacionalismo galego pede no nome dos princípios fundamentais de autodeterminação e de liberdade das nações, de direito imorredouro dos povos á sua vida, que se lhe reconheça a personalidade de Galiza, que as suas características nacionais sejam respeitadas, que se lhes dê liberdade para construir com elas uma cultura integral própria e enxebre, que se dê poder sobre si mesma para ela resolver de seu os seus problemas da maneira mais ajeitada ao seu modo de ser e mais benéfica para a sua vida interna, para a sua prosperidade econômica e para o seu desenvolvimento pacífico dentro e fora dos seus lindeiros naturais"9.

Castelao é o político mais representativo do nacionalismo galego, e parece que tem um grande simpatizante nos nossos dias, surpreendentemente, no presidente Núñez Feijóo, o qual, de ser certo, representaria um fito histórico para a nossa tão avassalada nação, também por el mesmo. Seria fiar em esperanças vácuas. O rianjeiro sempre defendeu o direito de autodeterminação, embora estiver disposto a ceder parte da soberania do povo galego para poder chegar a um pacto federal entre as quatro nações do Estado: Catalunya, Galiza, Euskadi e Espanha, que sempre deveria incluir o direito ao divórcio, por se o matrimônio não funcionar. O direito de autodeterminação de Galiza fundamenta-o no seu fato nacional e deve abranger, se assim o decidir, até a independência total. De aí que afirme em 1943 que "Galiza, como Catalunya e Euscadi, é unha nação, e, ... não reconhecer-lhe o direito de autodeterminação -inclusive para viver com absoluta independência- será sempre um ato tirânico e antiliberal"10. Como vai assumir uma proposta deste estilo o Presidente galego? Não tardaria nem um segundo em ser notícia nos meios e ser posto em quarentena polo seu partido. Em realidade isso obedece á carência de símbolos atrativos e incitantes nas filas dos que são os seus antecessores políticos tanto na Galiza como no Estado. Como vai pretender identificar-se com o Marquês de Figueroa, Riestra, Bugallal, Albor, Fraga, ...? Com esses é com os que tem que identificar-se e não apropriar-se e devorar os símbolos dos demais, para anular as suas virtualidades políticas.

Em janeiro de 1945, critica aos ex-governantes republicanos, que querem negar agora o direito de autodeterminação, condenando-o como um delito, sendo assim que “o Partido Galeguista concertou um pacto com «Izquierda Republicana», assinado por Azaña no que uma das bases é a seguinte: «Autodeterminação política de Galícia»”11.

Em março de 1945, manifesta que o povo galego vive esperançado e mais disposto que nunca a defender a sua personalidade. "Está avassalado e tolhido para expressar livremente os seus anseios de restauração democrática, de autodeterminação política e de união federativa; mas está organizado e preparado para superar as obscuridades do tránsito"12. Em junho de 1945 defende "o principio de autodeterminação para todos os povos que souberam conservar, a través dos séculos a  sua personalidade nacional, e, por conseguinte, defendemos o direito de autodeterminação para Galicia, que conserva todos os atributos duma verdadeira e autêntica nacionalidade; mas consideramo-nos autorizados a restringir este direito ao que é racionalmente justo, conveniente e possível, descartando de antemão o separatismo ... e advogando por uma união pactada de todos os povos diferenciados de Espanha num Estado plurinacional e republicano, capaz de atrair a Portugal"13. Como vai subscrever um texto como este Núñez Feijóo?

g.- Internacionalismo e cosmopolitismo

Nos povos colonizados, o galego entre eles, o colonizador, para justificar a imposição cultural ao colonizado, inocula-lhe os estereótipos que destacam a superioridade dos valores do colonizador a respeito dos do colonizado, que num princípio costumam provocar uma atitude de rejeição neste mas que, á longa, chegarão a ser introjetados polo colonizado e assumidos como próprios. Quantos não ha na Galiza que proclamam o espanhol como língua própria simplesmente porque se converteu na sua língua de uso?

Um dos expoentes do auto-ódio e desprezo do próprio é precisamente o presidente da Xunta de Galiza, que ousou aproveitar-se do auto-ódio que ainda persiste socialmente para sacar reditos eleitorais ao tempo que inoculava mais auto-ódio e desprezo na massa social galega. Hoje ha muito cosmopolita, muito traidor ao pais, Ha muitos nos nossos dias que justificam a violência contra as mulheres e os homo-sexuais e num estudo publicado faz pouco por duas investigadoras da Universidade de Granada destacavam que os meios comunicação provocam que muitas pessoas justifiquem, ainda sem precatar-se, os casos de violência de gênero que aparecem na imprensa. Quem pretendesse hoje inocular socialmente justificações da violência de gênero ou da homo-sexualidade sofreria, nas nossas sociedades, uma situação de ostracismo social, mas não se esqueça que ainda ha muitos povos no mundo que penalizam com a morte a homo-sexualidade e muitos outros que justificam abertamente a submissão da mulher ao home e o seu castigo por parte deste. A FAES desatou uma luta titânica contra toda a diversidade de língua, cultura, etc. bem secundada polo Governo de Espanha, e o Governo galego buscou não já motivos senão pretextos para poder marginar o galego no ensino e reforçar o espanhol, acudindo ao imaginário cosmopolita ligado ao inglês, que passa a ter a mesma proteção que a própria língua do país em perigo de supervivência, pola imposição secular do espanhol. Castelao afirmava que matar uma língua é um crime de lesa cultura, mas na nossa comunidade não só não o é senão que inclusive é recompensado socialmente.

Castelao foi o autor da IV Declaração de Princípios do Partido Galeguista que se titula: «Galícia, célula de universalidade.- Anti-imperialismo, federalismo internacional, pacifismo», na que se estabelece que "O reconhecimento da personalidade de Galícia e a arela de anovar a sua autóctona cultura, a defesa da autodeterminação política do nosso povo, o lavor pola potenciação da sua economia, serão angueiras estéreis e egoístas, se não fossem inspiradas polo degoiro de harmonizar na cultura universal o ressurgimento da nossa cultura, de integrar na comunidade dos povos a liberdade do nosso povo, de coordenar, com a solidariedade da economia mundial, o melhoramento da nossa economia, em suma, de que Galícia existindo, «vivendo a sua vida», se capacite para ser um novo órgão da humanidade"14. O internacionalismo não pode prescindir das nações porque seria o mesmo que fugir da vida e da natureza, pois a pátria única não contaria mais que com almas mortas e sensibilidades apagadas. Seguindo a Jean Jaurés15, considera Castelao que o ideal da pátria universal só pode estabelecer-se sobre a base das nações livres e autônomas, que serão os órgãos duma nova humanidade. "Para este autor, a pátria universal não pode realizar-se mais que a base das nações autônomas e reconciliadas. Querer suprimi-las de raiz, para formar uma sociedade única, seria o mesmo que fugir da vida e da natureza, caindo em verdadeiras abstrações.... ¿Em que ponto afincaríamos o combate social e qual seria o resultado da vitória se a pátria única não contasse mais que com almas mortas e sensibilidades apagadas? Não; o internacionalismo eficaz não deserta das pátrias, senão que as transforma em órgãos duma nova humanidade"16.

Cumpre coordenar o particularismo com o universalismo, que constituem ambos os deveres de todo grupo nacional. "Os universalistas não renegamos do amor á pátria nem á humanidade, compaginando ambos amores em perspectivas possíveis, em frutos de paz. As nações faltariam ao seu dever se não cultivassem com sagrado egoísmo, os elementos constitutivos do seu gênio permanente; mas como membros da família humana, estão obrigados a integrar-se num organismo de rango superior"17. Por conseguinte, não se pode admitir um internacionalismo abstrato senão um internacionalismo que conte com as sociedades presentes, onde os homes adquirem a sua identidade grupal, e que lhe darão o seu selo próprio ao desejado futuro Estado mundial. O internacionalismo abstrato semelha um novo Ícaro18, mais fictício que o da mitologia grega. "Diga-se o que se queira, a sociedade futura terá de criar-se pola conjunção das sociedades presentes, de modo que o Estado mundial leve o cunho das pátrias que o integrem. Porque a pátria não tem por fundamento exclusivo as categorias econômicas, apreixadas no estreito marco duma propriedade de classes, pois conta com outra fundura orgânica e outra meta ideológica. ... Abunda dizer que os indivíduos de cada grupo histórico, ainda para aldraxarem-se entre si, utilizavam o mesmo idioma, que é um distintivo da pátria. Cumpre afirmar que a presença do espírito coletivo em cada alma individual engendra um estranho engrandecimento. As almas individuais acrescem-se nas crises de dor ou de gozo coletivo. Este mistério ou prodígio das almas faz-se patente nos intres de paixão nacional, quando se remove toda a profundidade e extensão do grupo histórico. De supetão desencadeiam-se as forças acumuladas da pátria, e a solidariedade social ultrapassa em grao infinito á energia das consciências isoladas. Resulta, pois, evidente que só na aprendizagem da vida coletiva e da sensibilidade humana se pode afincar a idéia duma sociedade superior"19.


II.- Fatores socioeconômicos



1.- Prolegómenos da Revolução Francesa


No seio do sistema econômico do Antigo Regime agromam os alicerces dum novo modo de produção: o sistema capitalista, com grande potencialidade para criar e amontoar riqueza e com mui pouca vocação distributiva, que vai substituir o sistema de produção feudal anterior.

A.- Situação real na França e Espanha


 A sociedade francesa era no século XVIII uma sociedade estratificada em Nobreza, Clero, e Terceiro Estado ou Estado Lhano. O estrato do Terceiro Estado constituía o 95 por cento da população e estava integrado polos camponeses e a burguesia, á que pertenciam os artesãos/obreiros, comerciantes e plebe urbana, com grandes diferenças de renda tanto entre os camponeses proprietários e os jornaleiros como entre a burguesia baixa e alta, que obteve benefícios importantes do comércio principalmente. Era uma sociedade desigualitária, pois uma minoria, nobreza e clero, que representa o 2 % da população possuía o 70 por cento das terras, ocupa todos os cargos públicos e está isenta de tributar ao fisco, isenção que incrementa quota que deviam pagar a maioria, que não goza de privilégios mais se vê obrigada a pagar os impostos. A Igreja com leis e tribunais próprios, possuía riquezas fabulosas e não pagava ao fisco. Os senhores (nobreza e clero) incrementam a pressão tributária sobre os camponeses, restaurando tributos já abolidos, semeando o mal-estar na população rural. Isto não é óbice para que a nobreza intensifique a sua situação de decadência, enquanto que a burguesia se converte na classe dinâmica e motor da economia.

França tinha unha economia atrasada e ligada á agricultura de caráter extensivo -no campo vivem entre um 85 e um 90 por cento da população-, se bem agromam também algumas formas de capitalismo incipiente. Entre um 80 e um 90 por cento das terras estavam em mãos da Nobreza e do clero, que vivia da renda que lhes proporcionava o seu aluguer. Continuavam a existir os grêmios nos que estava ausente a idéia de benefício e competência. 

Assistimos, a esta altura, a um incremento demográfico, que pressionava sobre os alimentos, acompanhado duma racha de más colheitas, que incidem no incremento dos preços, que tem como resultado a escassez de alimentos para a população, traduzido em  mal-estar e tensão social, propícia ao levantamento popular. Para mudar essa situação desigualitária e de privilégios das minorias, a burguesia alia-se com os camponeses para derrubar a nobreza e impor os seus critérios a nível político, econômico e social. Produz-se também uma crise financeira, lindando com a  bancarrota, como conseqüência, por uma parte, dos gastos excessivos da Corte de Versalhes e da ajuda á guerra dos sete anos e á guerra de independência dos EEUU contra a Grã Bretanha e, pola outra, dos menores ingressos. Isto motivou um incremento dos tributos e um descontento geral da população. Os ministros de economia  (Turgot, Necker, ...) recomendam-lhe ao Rei, como solução á crise, que o Clero e a Nobreza paguem impostos, mais estes rebelam-se e arremetem contra a Monarquia e o Terceiro Estado, o que induze ao Rei a convocar os Estados Gerais, e perante o fracasso destes, produzir se-á o levantamento popular.

No Estado espanhol a Igreja possuía quantiosas riquezas. Sendo o clero o 1,31% da população total de 10.961.832 milhões de habitantes, ou seja, uns 143.600 mil aproximadamente, segundo o Cadastro de Floridablanca, 1787, era proprietária do 14,74 por cento da terra cadastrada da coroa de Castela. A nobreza, supunha o 4,38 por cento da população aproximadamente e controlava um pouco mais da metade de todas as terras, que na sua maior parte estava amortizada ou em mãos mortas: a igreja, nobreza e municípios, o qual significa que não se podiam comprar nem vender, devendo manter-se intactas sem poder dividi-las, e o filho maior herdava todo. “Existiam grandes senhorios (80% do total) em mãos do rei, da Igreja ou dos grandes senhores e á propriedade destas terras não podiam aceder os que as trabalhavam em realidade; estavam condenados a ser sempre “criados”. A maior parte dos camponeses eram jornaleiros ou arrendatários20.  Além das propriedades imobiliárias, recebidas por doações dos reis, nobres ou o povo, a Igreja contava com as rendas derivadas da percepção dos décimos e primícias, e os direitos paroquiais e esmolas: pan, trigo, ovos, cera, carne, vinho, estipêndios por funerais, bodas, batismos, enterros21. Era uma Igreja com enorme riqueza, fato que demonstra que não foram os marxistas os que lhe roubaram á Igreja a bandeira da pobreza, como alegou o papa Francisco, senão que foi a Igreja a que a abandonou condenando aos que desejavam seguir a pobreza evangélica, como foi o caso dos franciscanos espirituais ou fraticcelli, por parte de João XXII; acumulando riquezas a eito, inclusive por meio do confessionário, como se demonstra no fato de que no século XVIII, se obrigava aos cregos a perguntar-lhe ao paroquianos se fizeram testamento e como ficava, como pude comprovar lendo o historial dos meus antepassados; a aprovação pola Igreja no século XX das ordens pro-oligárquicas: Opus Dei, Comunhão e Libertação, Caminho Neocatecumenal, Legionários de Cristo, ...; a condena do socialismo no século XIX; a condena da teologia da libertação; ... A Igreja gosta de contemporizar com o poder, procura desfrutar dos seus favores e concentrar as suas iras contra os aspectos relacionados com o sexo, que não molesta em absoluto aos poderosos senão que os beneficia. No século XIX foi abandonada polos obreiros porque não tinha mais proposta para eles que a resignação ante a injustiça, e, nos nossos dias, em Ocidente, também polas camadas populares polas suas propostas que enfastiam a maioria social, e polas elites intelectuais e, no Estado espanhol parece que quer reduzir-se a ser um celeiro de votos para o PP, que a prima de favores a eito.

Tocante aos direitos humanos, especialmente os referidos á igualdade de gênero, nem estivo, nem está nem se lhe espera. Está empenhada em dar-nos a razão, que não procuramos nem desejamos, aos que assim pensamos, como o demonstra o fato de qualificar, o diretor de “L’Osservatore Romano”, jornal do Vaticano, Giovanni Maria Vian, como um «evento grave» que os anglicanos tenham decidido autorizar a ordenação de bispas“, pretextando que isso “complica o caminho ecumênico”. Isto significa não só que ela não está disposta a mudar e terminar com a discriminação sobre a mulher, senão que pressiona a outras igrejas cristãs para que tampouco e façam, porque isto dificulta o diálogo inter-eclesial, que deve fazer-se á custa da negação dos direitos do sexo feminino.

A respeito da democracia, a última peripécia teve como protagonista ao cura que oficiou a missa de comemoração do golpe militar na Igreja dos Jeromes de Madrid que, na sua homilia, advertiu do perigo que supõe para o catolicismo o auge da extrema esquerda e pediu aos assistentes estar alerta e fixo um chamamento para que “igual que nos anos trinta houve homes e mulheres valorosas que souberam dar resposta, nós hoje também saibamos dar resposta” ao “crescimento da extrema esquerda” e á “crise espiritual” da sociedade, que devolve Espanha á época prévia ao golpe militar. Em palavras deste sacerdote, cumpre aprestar-se a tomar as armas se for preciso em caso de que a esquerda tome o poder e poda suprimir os privilégios da Igreja, privilégios que são o único aspecto que pode estar em perigo, que el pretende identificar com o bem de Espanha, por acima da vontade libre e democrática dos cidadãos. Já o cardeal arcebispo de Madrid, José María Rouco Varela fizera, com motivo do funeral por Adolfo Suárez, uma referência velada e sibilina á guerra civil com estas palavras: Suárez “buscou e praticou tenaz e generosamente a reconciliação nos âmbitos mais delicados da vida política e social daquela Espanha que, com os seus jovens, queria superar para sempre a guerra civil: os fatos e as atitudes que a causaram e que a podem causar”. Por tanto, a Igreja, que nunca condenou a Guerra Civil senão que a considerou como uma «cruzada de libertação», e levou ao ditador durante 40 anos baixo pálio, faz uma ameaça velada que poderia entender-se que estaria disposta a participar numa nova intentona golpista que provocasse um novo massacre do povo espanhol se consideram que ha perigo para o catolicismo, que os espanhóis, velis nolis, tenhem que abraçar. Em vez de pedir perdão por um dos capítulos mais criminais da sua história, em palavras de Deschner, responde com o silêncio cúmplice quando não com ameaças extemporâneas, improcedentes e perturbadoras do discorrer pacífico da cidadania.

Analisando os contributos das religiões á civilização podemos afirmar que são bem parcos, e inclusive alguns preclaros intelectuais manifestam que são muito negativos em confronto com a dor, sofrimento e crueldade que provocaram. Dizia Bertrand Russell que “Um acha, ao considerar o mundo, que todo o progresso do sentimento humano, que toda melhora da lei penal, que todo passo cara a diminuição da guerra, que todo passo cara a um melhor trato das raças de cor, que toda mitigação da escravatura, que todo progresso moral realizado no mundo, foi obstaculizado constantemente polas igrejas organizadas no mundo. Digo deliberadamente que a religião cristã, tal como está organizada nas suas igrejas foi, e é ainda, a principal inimiga do progresso moral do mundo22. Quanto mais intensa foi a religião de qualquer período e mais profunda a crença, tanto maior foi a crueldade. Foi nesses momentos quando tiveram lugar a Inquisição e as maiores torturas em nome da religião, queimando vivas por bruxas a muitas mulheres. A Igreja opõe-se ao progresso e aos meios para diminuir o sofrimento do mundo, porque decidiu chamar moralidade a certas estreitas regras de conduta que não têm nada que ver com a felicidade humana; e quando se di que se deve fazer isto ou o outro, porque contribui á dita humana, estima que é algo completamente estranho ao assunto; atrasou o progresso e traiu ao mundo dor e sofrimento sem conto, e cita a este respeito o caso da indissolubilidade matrimonial. “Suponhamos que no mundo atual uma moça sem experiência casa com um sifilítico; em tal caso a Igreja Católica di: «Este é um sacramento indissolúvel. Ha que estar juntos toda a vida». E a mulher não pode dar nenhum passo para não trair ao mundo filhos sifilíticos. Isso é o que di a Igreja Católica. Eu digo que essa é uma crueldade diabólica, e ninguém em que a compaixão não for alterada polo dogma, ou que tenha uma sensibilidade moral absolutamente insensível ao sofrimento, pode manter que é bom e conveniente que constitui este estado de cousas23. Podemos acrescentar ao exemplo de Russell o sofrimento que acarreta com a sua moralidade sexual ás mulheres casadas com infectos com o sida ou a dor e sofrimento que quer impor ás mulheres o ministro católico integrista Ruíz Galhardão, com uma lei que pretende obrigar as mulheres a converter-se em sofredoras heróicas, parindo filhos deformes, ou a dor e sofrimento que causaram ao povo iraquiano os governantes cristãs Bush, Blair e Aznar com a guerra irresponsável que desencadearam valendo-se da mentira e do cinismo. Quando um compara o que diz Jesus: “Dou-vos um mandado novo: que vos ameis uns aos outros como vos amei, que também vos ameis os uns a os outros. Nisto conhecerão que sois os meus discípulos, se tiverdes amor os uns com os outros” (Jo. 13, 34-35), e a pratica real na vida diária dos que se dizem cristãos, a diferença não pode ser maior, e um pergunta-se para que pode servir o cristianismo e que credibilidade merece para os cidadãos. Não se responde a esta pergunta apelando a convidar a gente a obrar como eles dizem mais não como eles obram, porque uma religião que não se traduz em obras na vida pratica é uma farsa (Mt. 23, 3).
  
França era no século XVIII, um país rural pre-industrial, com uma indústria têxtil com talheres dispersos e Caráter familiar nos que se trabalhava o linho e o algodão. A mediados do século
 XVIII cria-se a primeira lançadeira volante; começam a funcionar a indústria têxtil do norte e a fábrica de pana de Ruam, com maquinaria e mão de obra inglesas. Entre 1760 e 1786 fundaram-se várias empresas metalúrgicas e mecânicas que começam a fabricação de ferro de coque. A mediados do século XVIII começa a revolução industrial na Grã Bretanha que no século XIX se vai expandir ao continente europeu. 

Polo que se refere a Espanha, a finais do século XVII a indústria têxtil estava num estado precário como conseqüência da competência exterior e da depressão do seiscentos. Reiniciou a sua  atividade com a proteção dos mercado interior e das colônias mediante incentivos fiscais e a criação de empresas por iniciativa pública quando os particulares desistiam de fazê-lo. A sua recuperação foi vacilante, e estivo marcada pola pouca qualidade dos produtos e a ineficiência da produção. As primeiras manufaturas de indianas e lenços estampados apareceram em Catalunya na segunda década do século XVIII, ao abeiro da política protecionista do governo e as facilidades de importação das matérias primas, que incrementará o seu número de fábricas na segunda metade do século, e que vão convertê-la na segunda potência algodoeira da Europa após Inglaterra. Espanha somou-se á primeira revolução industrial, que vai de 1840 a 1930, com atraso a respeito doutros países europeus.


 B.- Idéias do liberalismo econômico do século XVIII


As idéias dos iluminados fundamentaram o liberalismo econômico que proclama o Estado mínimo, a não intervenção do Estado na economia, a regulação espontânea da vida econômica polas leis do mercado, o individualismo e a livre iniciativa, e consagra o papel dirigente da burguesia.

O liberalismo econômico, princípio reitor da economia a partir desta altura, tem como principal inspirador a Adam Smith (1723-1790), que sustém que o bem comum resulta da cooperação dos egoísmos individuais e duma economia baseada no princípio fisiocrático «laissez faire, laisser passer, le monde va de lui même», consistindo a função do Estado em garantir a ordem pública e a justiça. Caracteriza-se polos seguintes traços:

a.- Propriedade privada dos meios de produção

Frente ao coletivismo ou estadismo que defende a sua propriedade coletiva, a propriedade privada, que deriva do trabalho, é considerada como sagrada, enquanto que a que tem outra origem, assim como a sua transmissão, podem ser limitadas pola sociedade. Entendem os liberais que o controlo privado dos fatores produtivos acrescenta a produtividade geral e, como conseqüência, produz um maior bem-estar coletivo. O liberalismo é um firme defensor da iniciativa privada e do livre mercado e, conseqüentemente tem como filho próprio ao capitalismo, considerado polos liberais como o único sistema viável numa sociedade baseada na divisão do trabalho. Uma economia de corte medieval nunca poderia equiparar-se-lhe em quanto ao nível de produção e de conforto que é capaz de oferecer aos cidadãos.

A nível galego, os liberais insistirão na reforma agrária, por considerar que a agricultura está submetida a travas absurdas, que limitam o seu desenvolvimento.

b.- Liberdades econômicas individuais

As liberdades pregadas polo liberalismo econômico são as de empresa, trabalho, comércio, contratação, compra-venda, fabricação, iniciativa, livre circulação de mercadorias, residência.... O mesmo nome de liberalismo deriva de liberdade e, no Estado espanhol utilizava-se no século XIX o termo «liberal» para designar aos representantes desta corrente de pensamento oposta aos defensores do despotismo, dos «servis»24, dos "servos da ração ilustrada pola fê; os que desejam a felicidade da nação quitando os estorvos que se opõem a ela e conservando a religião católica que recebemos dos nossos pais. Esta é a linguagem dos filósofos: servis chamam aos verdadeiros espanhóis"25. A sua oposição contra o regime escravista não obedecia principalmente a razões humanitárias senão por considerar que o home livre tem mais alicientes para produzir e, por conseguinte, o seu trabalho é mais produtivo que o do escravo, e contribui, por tanto, em maior medida, ao bem-estar geral.

O liberalismo enquanto promotor da liberdade de cultos e pensamento, foi condenado pola Igreja católica, no «Sílabo» de Pio IX do ano 1864, e o princípio da livre concorrência do liberalismo econômico por Pio XI na encíclica «Quadragesimo anno», no ano 1933.

c.- Individualismo

Segundo o escocês A. Smith, em linha com a fórmula do fisiócrata Vincent de Gournay, (1712-1759), «Laissez faire, laisser passer», a iniciativa individual dos participantes, na  atividade econômica, atuando dum modo egoísta, em procura da satisfação dos seus interesses particulares, numa situação de livre concorrência, é conduzido por uma espécie de «mão invisível» a um resultado alheio ás suas intenções mas que procura o desenvolvimento do bem geral, favorecendo de por si o melhor resultado global. A atividade econômica permite harmonizar o bem do individuo e o da sociedade na que vive em benefício de ambos. Para conseguir este objetivo deve poder operar em Regime de liberdade perfeita sem intromissões do poder político. O indivíduo é quem melhor conhece os seus interesses e, por isso, segundo Turgot, ha que "deixar marchar as cousas precisamente como o fazem por si só, pola mera ação dos interesses dos homes, estimulados polo equilíbrio duma competência livre"26. Segundo Pardo de Andrade (1759-1923), o interesse e a ambição "Foram, são e serão sempre o estímulo poderoso da indústria"27. Esta espontânea harmonia entre o interesse do indivíduo e a sociedade seria posta em dúvida por Tocqueville, Acton e Groce, e a crise que estamos a padecer em 2014 na Europa demonstra claramente que não ha mão nem visível nem invisível que conduza á harmonia geral. O que si conduz é a uma feroz competência entre os indivíduos e os povos e no lugar de criar um modelo de sociedade habitável, no que os cidadãos gozem duma vida digna e pacífica, cria-se um modelo de sociedade selvática e cainita, de luta de todos contra todos. Como di Bertrand Russell, a “A injustiça, a crueldade e a miséria que existem no mundo são uma herança do passado, e a sua raiz é econômica, já que a competência de vida ou morte era inevitável nas primeiras épocas. Mas agora não é inevitável. Com a nossa atual técnica industrial podemos, se queremos, proporcionar uma existência tolerável a todo o mundo28.

A nível internacional, existe também uma ordem natural semelhante á que ha no seio de cada sociedade. A harmonia entre as nações derivará do incremento do comércio internacional e do postulado de não intervenção dum Estado nos assuntos doutro, por conseguinte, do princípio do laissez faire aplicado ás relações  entre Estados. Os laços e interesses, criados pola intensificação do comércio internacional, propiciariam a paz e a compreensão internacionais e fariam desnecessário o recurso a métodos de força como procedimento para a solução dos conflitos entre países. Os interesses, também afora do âmbito das próprias fronteiras estatais, seria um meio para fomentar a cooperação e a preservação da paz.

O governo não deve converter-se em produtor de riqueza senão que deve procurar ampliar o âmbito do livre comércio e da competência e eliminar os obstáculos e as travas ao aforro e á iniciativa individual. O fomento da competência exige a supressão da proteção e dos privilégios duma economia e mui especialmente a supressão de toda  atividade monopolística. Segundo A. Smith, devem restringir-se também as ajudas laborais porque fomentam a preguiça, imprevisão e natalidade. J. Stuart Mill sinalaria os limites do princípio do laissez faire, com o exame dos defeitos do mercado, e considerava que, em certos âmbitos como a educação, caridade ou certas obras públicas que os particulares não estavam em disposição de acometer, estava justificada a intervenção não autoritária do governo, quer dizer, aquela na que o governo se limita a criar as condições necessárias para que os indivíduos podam desenvolver as suas potencialidades.

Este individualismo exacerbado, contribui ás desigualdades econômicas entre os cidadãos e ao domínio do forte sobre o débil, mas, segundo o liberalismo, a redistribuição dos bens é ineficaz porque não solucionaria o problema dos pobres, e ademais, as desigualdades fomentam a produtividade e possibilitam o luxo, que é um fator positivo porque "a demanda de bens luxosos provoca descobrimentos industriais e estimula a aparição no mercado de bens que pronto desfrutará o comum das gentes; é um fator dinâmico dentro da economia"29.

d.- Livre concorrência

O liberalismo afirma que a melhor regulação econômica produzira-se espontaneamente a través da lei da oferta e da demanda, do livre mercado. Os liberais propugnavam o livre-cambismo, a livre circulação do trabalho, capital e mercadorias entre os diversos países sem travas nem limitações de nenhuma classe, porque isso facilitaria o emprego do trabalho e capital dum modo mais produtivo.

As teses anteriores referidas ao liberalismo clássico, seriam matizadas, em dialética cos defensores duma maior igualdade e justiça social, polo chamado neoliberalismo. Este já não crê que o livre jogo dos agentes econômicos produza uma regulação ótima da economia senão que aceita mecanismos de equilíbrio entre: a oferta e a demanda, como as leis anti-monopólio; entre o capital e o trabalho, como os sindicatos livres; entre a propriedade privada dos bens de produção e a coletiva, admitindo a função social da propriedade; entre os ricos e os despossuídos da fortuna, mediante a função redistributiva do Estado.


2.- A economia na etapa de crise atual


A.- Situação real da economia



Se durante os prolegómenos da Revolução francesa, os sectores extrativos da economia eram os Nobres, fidalgos e clero, e os contribuintes, o terceiro estado, nos nossos dias, os sectores extrativos são os oligarcas, diretivos de grandes e medianas corporações e clero, e os contribuintes, os cidadãos, entendendo por tais não só os trabalhadores manuais senão também os trabalhadores da administração e serviços e as PEMES, que são os «paganos» de turno. Surge assim uma nova contraposição social e um novo antagonismo: elites oligárquico-clericais↔ cidadãos. O estado da economia caracteriza-se, no inter-médio das duas primeiras décadas do século XXI por:

a.- Crise econômica

As desregulações da economia impulsadas principalmente durante o governo de Ronald Reagan, acordes com o liberalismo econômico decimonônica do laissez faire, criaram as condições propícias para a atuação sem freio dos atores econômico-financeiros. Desencadeou-se como crise financeira nos EEUU, especialmente com os produtos tóxicos das hipotecas subprime, ou hipotecas lixo, modalidade creditícia destinado a clientes com escassa solvência que tinham como finalidade preferente a aquisição de vivenda, com um risco superior ao resto dos créditos destinados a clientes solventes, e, por tanto, com risco de impagamento superior e com uns juros mais elevados que os empréstimos pessoais. Quando a FED (Reserva Federal dos EEUU) elevou os juros, repercutiu nos juros das hipotecas e acrescentou a morosidade bancária,  semeando a alarma dos investidores. Estes produtos, num processo de apalancamento em espiral, venderam-se a muitos bancos tanto estadounidenses como ocidentais em geral, o que lhe deu uma projeção mundial ao problema. Esta crise das hipotecas subprime motivou a quebra do Banco de Investimentos Lehman Brother no ano 2008, provocando problemas em cadeia a muitos bancos ocidentais, especialmente de Alemanha e a Grã Bretanha.

A seguinte crise que se desatou foi a imobiliária, por terem concentrado as grandes construtoras e os bancos grandes somas de dinheiro na aquisição de terrenos e na construção dum número de vivendas muito superior ás necessidades reais do mercado e sobre todo das disponibilidades econômicas dos seus compradores, aos que a Banca concedeu mui generosamente empréstimos sem ponderar razoavelmente os riscos assumidos. Ao elevar-se os juros bancários e acrescentar-se a instabilidade no posto de trabalho, muitos compradores não puderam fazer frente ao importe mensal das hipotecas, tendo como conseqüência a perda da vivenda e o despejo por parte das entidades bancárias, que viram como a morosidade se acrescentava extraordinariamente. No Estado espanhol contribuiu decididamente a criar as condições propícias para a crise a desregramento dos usos do solo promovidos polo executivo de José María Aznar, que qualificou como urbanizável praticamente todo o solo do país, e as reduções fiscais, promovidas polos governos tanto socialistas como populares, para a aquisição de vivenda em propriedade.

A crise seguinte foi a de dívida, originada polas suspicácias dos investidores de que muitos países, afetados por um forte déficit e com uma dívida galopante, não pudessem fazer frente ao pagamento da dívida externa. Estas suspicácias puseram em questão a mesma viabilidade do euro, pola descompensação econômica entre os diversos países que adotaram esta moeda e a inexistência dum sistema financeiro e bancário comuns, o qual fixo que a prima de risco e, por conseguinte, o diferencial que ha que pagar polos empréstimos tomando a Alemanha como referência, se incrementasse até limites mui elevados nos países mediterrâneos, que fixo que muitos países não pudessem auto-financiar-se a custos assumíveis para as arcas públicas, o qual motivou a necessidade de recorrer á ajuda dos demais países e submeter-se a duras exigências de consolidação fiscal.

A crise foi criada pola irresponsabilidade dos oligarcas mais foi carregada sobre o lombo dos cidadãos ao tempo que se cuidava escrupulosamente que os oligarcas não se vissem afetados, e traduziu-se em perda do posto de trabalho com paro massivo, despejos com perda de vivenda para os que não foram capazes de afrontar o pagamento da hipoteca protagonizados por parte dos bancos resgatados com ajudas públicas, míngua dos salários, congelação das pensões, fechamento de empresas, recortes nos serviços públicos, incremento de muitos preços de artigos de primeira necessidade, diminuição da  atividade econômica e do PIB, pobreza infantil e adulta, emigração de pessoas com sólida formação acadêmica, ...
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b.- Situação de bancarrota nos países mediterrâneos

Vários países europeus, Grécia, Irlanda, Portugal, Chipre e Espanha  tiveram que ser resgatados para evitar a suspensão de pagamentos. No caso de Espanha não se resgatou toda a economia senão que, teoricamente, se reduziu ao sector financeiro, mais, embora for parcial a ajuda prestada, a economia espanhola foi intervinda na sua totalidade e o país viu-se submetido aos ditados dos homes de negro da troika. As causas deste fiasco  umas são endógenas, e produto da incompetência, corrupção generalizada, políticas curtoprazistas, faltas de previsão  e diagnóstico da evolução da economia, a super-exposição da economia ao sector do ladrilho, deficiente ponderação dos riscos que supunha a entrada no euro que obrigava a competir com economias mas fortes e competitivas, etc.; outras são exógenas: globalização, crise financeira dos EEUU, desenho do euro inadequado, ... A incidência do euro resulta patente polo fato de ser a crise mas persistente das padecidas até o momento presente, incluída a grande depressão de 1929, e por outra parte resulta lógico que assim for por terem cedido os estados competências a Europa e carecer de mecanismos para atuar com presteza em situações críticas e, aliás, por não ter recebido muitas vezes a compreensão e solidariedade requeridas dos demais países europeus; com todo, o fator quiçá mais decisivo foi submeter a todos os países em crise ás políticas de austeridade, que levaram a destruir o sistema produtivo, por não irem acompanhadas de medidas simultâneas de incentivos que impulsassem o crescimento.

Houve uma diferença notória entre a atuação dos EEUU, baseada no impulso da economia com medidas que incrementassem a gasto público, que permitissem preservar o sistema produtivo, e as receitas européias e do FMI que o destruíram e incrementaram o paro até cifras inassumíveis, como são os seis milhões de parados espanhóis, que obriga a incrementar as prestações por desemprego, diminui a tributação fiscal, deixa a milheiros de pessoas sem meios de subsistência, incrementa a morosidade bancária, restringe o gasto, que se traduz em menos emprego e crise de empresas, pode provocar problemas á sustentabilidade das pensões e, last but não least, incrementa até limites mui dificilmente suportáveis o déficit e a dívida pública que pode criar problemas de default, pois na atualidade, apesar do gigante esforço ao que se submete á cidadania o Estado está-se endividando em 60 mil milhões de euros anuais, e isto a longo prazo, se não ha crescimento suficiente, é impossível de pagar, ...

No Estado espanhol provocou-se uma deflação interna dos salários, sem a correspondente contrapartida de baixada dos preços, senão inclusive com o incremento de muitos dos artigos e gastos de primeira necessidade, como a eletricidade, gás, combustíveis, incremento da tributação, taxas, etc. com o resultado de fazer a sua vida diária muito mais penosa. Ao impor taxas na justiça, elevar o preço das matrículas na educação, estabelecer repagos e tripagos sanitários, privatizar serviços como o registro civil, ... a penúria dos cidadãos incrementou-se até a limites insuportáveis.

c.- Forte concentração do capital

Nos dias de hoje segue a produzir-se uma forte concentração do capital tanto industrial como financeiro e de serviços, estimulada polos governos do bipartito PP-PSOE valendo-se do dinheiro dos cidadãos, que são quem têm que pagar uma super-concentração de capital que atenta contra os seus interesses, por ter como conseqüência oligopólios que pactuam os preços em prejuízo seu. Quando se privatizaram as empresas energéticas vendeu-se esta operação como uma defesa dos interesses da cidadania porque ajudaria a baixar os preços, mais o resultado foi exatamente o contrário, e a cidadania assiste impotente ao espetáculo de ver que os preços são pactuados nas direções das empresas em contra sua e que o serviço é mais caro e a atenção cidadám pior. Alem disso, os mesmos políticos que as privatizaram, leigos na matéria, agora cobram opíparos estipêndios como conselheiros dessas empresas por atuar como captadores de favores e câmbios legislativos em prol dessas empresas, num trabalho que não lhe investe tempo praticamente nenhum, e, por acima, presumindo de que trabalham duro para ganhar-se a vida e da sua valia pessoal.

O sector bancário vai ficar reduzido a uns dez bancos aproximadamente, e, por tanto, vai-se converter noutro sector oligopolista, que também, ao igual que acontece nos demais, facilitará o uso das portas giratórias, a concertação de preços e condições de serviços e a drenagem de recursos da cidadania em benefício do sector. Algum diretivo bancário já mo tem confessado abertamente.

Outro sector, igualmente privatizado, é o oligopólio energético que, sem o mais mínimo rubor, pactua os preços subindo-os o fim de semana e baixando-os durante a mesma, subindo-os numa comunidade e baixando-os na vizinha, ....

É oligopolista também o sector das telecomunicações: telefonia, internet, etc. que, sem regras claras a nível internacional, também trabalha para obrigar a cidadania a que drene recursos em benefício da causa e sem que atenda uma necessidade real. Os que temos Windows XP dentro de pouco teremos que cambiá-lo por outro, queiras ou não, porque deixam de fazer programas para este modelo. As críticas no sector da telefonia sãoas segundas mais numerosas, após as relacionadas com a banca, se bem eu tenho que dizer que estou contento com a companhia R.

Também está super-concentrado o sector informativo, no que participam também, para aproveitar as suas facilidades, muitos destes grupos empresariais privatizados ou super-concentrados, que assim poderão controlar as informações ad maiorem divitiarum gloriam, para santificar as riquezas. 

d.- Recortes seletivos antipopulares e anti-sociais

Cabe-lhe a Núñez Feijóo a triste honra de ter começado a jeira dos recortes massivos e seletivos no Estado espanhol, justificados na divisa tantas vezes por ele repetida de que «não se pode gastar o que não se tem», que, por coerência implicaria que haveria que eliminar o sistema financeiro, que tem, de iure, a finalidade de emprestar dinheiro a quem o necessita.

Quando ha que gerir recursos escassos sempre ha que, por uma parte, recortar gastos, e, pola outra, estabelecer prioridades á hora de gastar os recursos disponíveis. É a seleção dos gastos que se recortam e as prioridades dos objetivos, o que distingue a uma política de outra. A economia não é uma ciência estrita, senão que está em função dos objetivos políticos que se perseguem.

Quando começou esta obsessão compulsiva polos recortes, eu, mero cidadão observador da realidade, sempre defendia que havia que compaginar recortes com crescimento, por considerar que os recortes por si só são suicidas numa sociedade de consumo como é a atual. Não se pode tirar a faculdade de consumir numa sociedade baseada no consumo.

Em que se podia e se deveria recortar para não destruir o sistema econômico? Em primeiro lugar, nas instituições desnecessárias e, especialmente, nas incoerentes com o Estado Autonômico. Estas seriam: as deputações provinciais, vestígios do Estado Centralista, super-viventes, ilogicamente, no no novo Estados das Autonomias. Era uma medida que concitava, aliás, um amplo consenso, pois seria acetada por todos os partidos salvo o PP, que se resiste porque tem, nestas instituições, um ninho de clientelismo, apesar de que foram historicamente as instituições mais corruptas.

Dever-se-ia recortar na estrutura periférica do Estado, como são as delegações do governo e as delegações provinciais dos ministérios, com objeto de reduzir os níveis da administração e deixá-los no nível municipal, autonômico, central e europeu, aplicando o princípio de subsidiariedade que preceitua que os serviços devem ser geridos pola administração mas próxima aos cidadãos. Haveria igualmente que concentrar concelhos e deixar só os que são viáveis e aptos para prestar os serviços encomendados. Aqui pretende-se atuar pola via inversa, e fazer depender todas as decisões do centro madrilenho, caracterizado historicamente pola sua ineficácia e burocratismo.

Haveria que eliminar aqueles ministérios que têm traspassadas as suas competências ás CCAA, nomeadamente, educação, cultura, vivenda, ... Num Estado Autonômico sério haveria que converter o Senado em câmara de representação territorial das nações que compõem o Estado, pois na sua configuração atual é repetitiva e totalmente inservível. Nada disto se fixo, apesar de que os políticos teoricamente concordam nesta diagnose.

Em que se recortou de fato? Nas prestações sociais: sanidade, educação, cultura, inovação, ... Milheiros de pessoas foram botados para a rua, eliminando postos de trabalho dum nível de consumo muito significativo, que permitiria manter o consumo interno e dinamizar a economia, e contribuintes dum nível médio, que são os que pagam, velis nolis, impostos ao fisco e sustentam a tributação estatal. Carregou-se, desta arte, o sistema produtivo e fiscal. Ademais, ao recortar até a sua total eliminação em I+D+I, carregou-se o sistema de inovação, base do crescimento tecnológico e, conseqüentemente, da manufatura de produtos de cara á exportação. 

e.- Imposição fiscal pro oligárquica e clerical

Na França pre-revolucionária somente pagava impostos o terceiro estado, e na Espanha, na etapa crítica atual o peso da carga fiscal recai fundamentalmente sobre a cidadania, especialmente as classes médias e baixas. Na Espanha ha uma descompensação histórica entre ingressos e gastos, salvo no período 2002-2007, em que se nivelaram ou inclusive, nos primeiros anos de Zapatero, houve um ligeiro superávit, que se caracteriza por uns ingressos por arrecadação fiscal no 2014 do 37 por cento, o mais baixo dos países desenvolvidos europeus, excetuando Luxemburgo, frente a uns gastos, neste mesmo ano, do 45 por cento, também entre os mais baixos de todos os países desenvolvidos europeus. Isto implica que não se arrecada o suficiente para fazer frente aos gastos, que é o que provoca o déficit e este a dívida pública. Isto pode solucionar-se da seguinte maneira: a) diminuindo os gastos, mantendo os ingressos; b) Aumentando os ingressos mantendo constantes os gastos, ou c) aumentando os ingressos e diminuindo os gastos.

O governo do PP atuou sobre ambos; sobre os ingressos, incrementando a arrecadação para compensar a brecha entre ingressos e gastos, mas em vez de atuar sobre o fraude, economia submergida e sectores que não ou infra-tributam, como as grandes empresas, grandes fortunas e a Igreja, recarregou de impostos aos de sempre, ou seja, ás classes médias, via IRPF e IVA, taxas, e aos trabalhadores mas desfavorecidos, via IVA e taxas. Elevou assim o esforço fiscal dos espanhóis ao primeiro rango europeu, convertendo-nos nos europeus que pagam mais impostos em proporção ao salário que recebemos. Convém não confundir a pressão fiscal com o esforço fiscal. A primeira mede-se dividindo a arrecadação tributária polo PIB, Pressão fiscal = Ingressos fiscais*/ PIB e, por tanto, está em função da  atividade econômica e não tanto da suba de impostos, enquanto que o esforço fiscal representa o sacrifício fiscal que têm que fazer os contribuintes tendo em conta o seu nível de ingressos. obtém-se dividindo a pressão fiscal pola renda per capita: Esforço fiscal = Pressão fiscal/ Renda per capita. Segundo os técnicos de Fazenda da Gestha, se consideramos os impostos que suporta um espanhol polo IVA e Impostos Especiais, a pressão fiscal elevar-se-ia  no 2008 desde o 37 por cento ao 47,01, podendo inclusive superar o 50 % se acrescentamos os pagos médios dos impostos de sucessões e doações. Nos nossos dias, o esforço fiscal, incluindo o salário e custos da Segurança Social, que se descontam do soldo, eleva-se ao 50,40 por cento. .

Esforço fiscal em 2008
Num informe da Agência Tributária de 2012, os inspetores de Fazenda sublinhavam que as grandes sociedades tributam menos que um mileurista. Em 2007, as empresas obtiveram uns benefícios históricos recorde mas quando declararam a Fazenda por esse ano a arrecadação caiu um 39 por cento, principalmente nas empresas que cotizam no IBEX, descenso que continuou em anos sucessivos, ajudado por decisões de Zapatero que, após uma reunião na Moncloa em dezembro de 2010, permitiu que os grandes grupos podam “aplicar-se em 2011 de golpe a liberdade de amortização dos seus investimentos sem ter que manter emprego. Também se concedeu que, por exemplo, as empresas espanholas podem investir no estrangeiro mediante filiais e á vez girar esses custos financeiros á matriz na Espanha para deduzir-se esses gastos e pagar menos30. Isto fez que a arrecadação no Imposto de Sociedades que no ano 2007 era de 44.824 milhões de euros, passasse a 16.611 milhões em 2011, frente a unha rendas do trabalho desse ano de 69.803 milhões de euros por IRPF. Considera a citada Agência que ha dous buracos no Imposto de Sociedades que haveria que tapar: limitar a dedução de gastos financeiros e a liberdade de amortização sem manter o quadro de pessoal.

A respeito do primeiro caso, dizem os inspetores, que muitos ingressos exteriores estão isentos do imposto ao tempo que podem deduzir os gastos financeiros realizados para obter esses ingressos. Isto faz mais rentável o investimento exterior, “fomentando a deslocalização de empresas e a criação de emprego afora das fronteiras á custa dos empregos espanhóis”31. A liberdade de amortização constitui um adiamento indefinido e contínuo do Imposto de Sociedades a pagar a custo zero quando se realizam investimentos, com grave quebranto para as arcas públicas que somente obtêm ingressos quando os investimentos diminuem. Isto benefícia ás mui grandes empresas que representam o 0,2 por cento e acumulam o 60 por cento das deduções, em prejuízo das pequenas e medianas empresas (pemes) que são as principais criadoras de emprego. Aliás a supressão do requisito de mantimento do quadro de pessoal fixo que o Estado subvencione e financie os ERES das grandes empresas.

Podemos observar que o informe dos técnicos de Fazenda é demolidor e supõe uma desqualificação por incompetência e por contrários aos interesses nacionais, os governantes que permitiram esta situação. Em todo caso é um claro expoente do funcionamento das portas giratórias e de que a crise não é filha de pais órfãos senão que teve pais claramente reconhecíveis e identificáveis. Isto permite concluir claramente que a imposição fiscal espanhola é claramente oligárquica.

Por outra parte, diminuiu a arrecadação ao recortar postos de trabalho no ensino, sanidade, I+D+I, e facilitar os despedimentos pola reforma laboral e os ERES, deixando na rua a milheiros de potenciais contribuintes. A solução creio que estaria em equilibrar ingressos e gastos igual que praticaram e praticam os demais países europeus, incrementando a arrecadação combatendo o fraude, fazendo pagar aos que não ou infra-cotizam, sem minguar o tecido produtivo e o estado do bem-estar. O presidente do Governo espanhol, Mariano Rajoy, disse várias vezes que ha que ha que ter o estado do bem-estar que podemos permitir-nos, mas parece que obviou precisar: mantendo intangíveis os privilégios das oligarquias. 

O governo do PP e os socialistas, estes a partir de 2010, concentraram-se principalmente nesta alternativa, e produziram uma deterioração muito significativa dos serviços públicos e da inovação, ciência, cultura e tecnologia, e provocaram a destruição dos sistema produtivo e inovador, coutando as nossas possibilidades de futuro.

Surpreende que, após a experiência do crack de 1929, no que se constatou que a austeridade sem crescimento não permitiu sair da crise e houve que recorrer á doutrina keynesiana dos incentivos que incrementassem os gasto público e tirassem da economia, em Europa, por pressões fundamentalmente alemãs e da troika, se ensaiasse de novo a via fracassada no 1929, da diminuição do gasto e, por tanto, da austeridade, contrariamente ao que aconteceu nos EEUU, que recorreu aos incentivos e sorteou muito melhor a crise.

Outro sector claramente favorecido pola legislação tributária espanhola foi a Igreja católica. A CE estabelece que “nenhuma religião terá Caráter estatal. Os poderes públicos terám em conta as crenças religiosas da sociedade espanhola e manterão as conseguintes relações de cooperação com a Igreja Católica e as demais confissões” (Art. 16.3). Com todo, as relações com a Igreja Católica regem-se polo concordado com a Santa Sede, assinado o 3/01/1979, uma semana após ser aprovada a Constituição, para bendizer o Concordado assinado polo Regime franquista em 1953, e dar-lhe aparência de legitimidade constitucional, com o fim de garantir a situação  de privilégio desta  confissão religiosa. Não se trata dum acordo mutuo bilateral entre partes e com contrapartidas para ambas, senão dum compromisso unilateral do Estado para beneficiar a Igreja Católica á custa dos contribuintes e sem contraprestação de nenhuma classe, e numa quantidade que o mesmo Governo seria incapaz de calcular exatamente quanto se detrai das arcas públicas por este conceito.

O Concordado, no seu artigo II estabelece: “1. O Estado compromete-se a colaborar com a Igreja Católica na consecução da sua adequada sustentação econômica, com respeito absoluto do princípio de liberdade religiosa”.

O que acarreta o Estado á Igreja está constituído por dous componentes: a) um contributo direto, que na atualidade é o 0,7 por cento da renda de cada cidadão que marque o quadrinho do formulário da declaração do IRPF,  e b) um montante de impostos muito importante dos que fica isenta.

No artigo do Concordado IV é eximida dos impostos do IBI dos imóveis urbanos, impostos reais, entre eles o IVA, e impostos sobre a renda e o patrimônio, imposto de sucessões, doações e transmissões patrimoniais, isenção das contribuições especiais e da taxa de equivalência, ao tempo que estabelece deduções fiscais para as quantidades acarretadas á Igreja. Todas estas quantidades têm que suportá-las tanto os seus fieis como todos os demais cidadãos, porque este dinheiro não se detrai só dos que marcam o quadrinho indicado, senão de todos e cada um dos demais, e todos, dalguma maneira se vêem afetados, também os que não fazem declarações da renda, porque a isenção de impostos também lhes prejudica a eles. Por exemplo, terão que pagar mais de IBI ou terão menos serviços públicos porque ha instituições que estão isentas. Esta cessão de privilégios unilateral deixa sem margem nenhuma de manobra as CCAA tocante a este tema. Disto pode-se concluir também que a imposição tributária na Espanha é claramente pro clerical e prejudica a todos os demais cidadãos.   

III.- Fatores culturais






1.- Situação real durante a Revolução Francesa


A Ilustração é um movimento classicista, que se caracteriza pola harmonia das formas, sentido das proporções, equilíbrio e universalismo; racionalista e otimista, ao contrário do Romanticismo, que exalta a irracionalidade, os sentimentos, o próprio, o peculiar, o intimismo na paisagem e o individualismo. No século XVIII, vão surgir toda uma série de idéias que vão minar os alicerces sobre os que se levantou o Antigo Regime e vão propiciar o surgimento do Regime Liberal ou burguês, ao tempo que inspiram a praxe política dos revolucionários. Voltaire considerava que a Igreja cristã era unha instituição anacrônica, que constringia a liberdade do indivíduo. Como alternativa propõe uma religião natural baseada no deísmo, ou seja, na crença na existência dum Deus supremo, mas sem religiões positivas.

Rousseau considera que o ser humano é naturalmente bom, mas que é pervertido pola sociedade e proclama uma sociedade igualitária não dividida em estratos. Este herdo foi recolhido no lema da Revolução Francesa: liberdade, igualdade, fraternidade. Trata-se, porém, duma liberdade puramente individual e duma concepção dum home abstrato e desligado da sua realidade comunitária, faceta que seria incorporada parcialmente polos direitos da terceira geração que visam proteger a comunidade frente aos interesses de indivíduos e grupos, se bem essa comunidade deve incluir não só a comunidade mundial senão também a comunidade nacional na que se insere o ser humano. A obliteração destes direitos foi o que deu origem a um dos maiores etnocídios culturais que conheceu a história, o grande crime de lesa cultura de eliminar línguas e culturas dos povos submetidos, criando uma uniformidade e homogeneidade social em nome do «progresso da humanidade». Também é insuficiente a igualdade que pregoa pois di respeito á igualdade entre os membros do sexo masculino, deixando as mulheres numa situação de inferioridade de gênero. Com todo, cumpre reconhecer que o maior contributo antropológico cultural da Revolução Francesa foi, sem dúvida, a declaração dos direitos do home e do cidadão, dos direitos humanos chamados da primeira geração, que são os direitos humanos individuais, fito importante, embora insatisfatório por partir da consideração dum home abstrato á margem da sua comunidade de pertença nacional e deve complementar-se também com o reconhecimento dos direitos humanos da segunda geração, que são os direitos socioeconômicos, que visam efetivizar os direitos humanos da primeira geração para que não fiquem em letra morta, e também com os direitos humanos da terceira geração.     

Já conhecemos o projeto de Felipe V de eliminar todas as línguas, usos e costumes do Estado espanhol para deixar em pé somente os usos e costumes de Castela, política mui bem assimilada e aplicada nos reinados de Fernando VII, Isabel II, Afonso XII e Afonso III e polos partidos do PP e PSOE na atualidade, em nome da igualdade de direitos para todos, que é, como dizia Aristóteles, no que consiste a atuação injusta, por considerar este autor que a justiça não consiste em tratar a todos por igual senão como iguais aos que são iguais e como desiguais ao que são desiguais.

Carlos III pôs também em pratica uma política assimilacionista a respeito dos ciganos, que estavam numa situação muito problemática após a grande Redada de 1749, que se pretende resolver com a Real Pragmática de 1783, pola que se lhe ordena que “2. ...não usem da língua. traje e método de vida vagante de que tenham usado até o presente so a penas abaixo contidas32. O prêmio por deixar de ser o que são seria ser admitidos em qualquer grêmio ou comunidade. Porém fica-lhes proibido ocupar-se de “tosquiadores, nem no tráfico de mercados e feiras nem menos na de pousadeiros e hospedeiros em sítios despovoados; embora nos povos podam ser pousadeiros”, sempre que não haja indícios fundados de serem delinqüentes ou receptadores deles. Devem abandonar o nomadismo e concedem-se-lhe 90 dias para que tanto eles como  a quaisquer vagos e delinqüentes “7. ... se retirem aos povos dos domicílios que elegessem exceto, por agora, a Corte e Sítios Reais, e abandonando o traje, língua e modais dos chamados ciganos, se apliquem a ofício, exercício ou ocupação honesta, sem distinção da lavoura ou artes”. A primeira vez que desobedecessem estas leis seriam marcados com um ferro candente no lombo. “20. Verificado o selo dos chamados ciganos que fossem inobedientes, se lhes notificará e aperceberá que, em caso de reincidência, se lhes imporá irremissivelmente a pena de morte; e assim se executará só com o reconhecimento do selo e a proba de ter volto á sua vida anterior”.

2.- A cultura durante a época de crise atual


Imos citar só alguns traços característicos do momento atual. A nível individual, o home já não se sente dono e senhor da sua própria casa, pois Freud ensinou-nos que existem instâncias inconscientes que determinam a conduta humana. Aliás, o ser humano não pode ser definido em exclusiva pola razão senão que também o constitui a irracionalidade, o sentimento, os afetos, ... Não nos valem definições como a aristotélica que afirma que o home é um animal racional, senão que é um animal senciente, racional, e com capacidade lingüística articulada.

Nos dias de hoje, polo que di respeito ao Estado espanhol, o ser humano não pode sentir-se otimista. Pendem sobre a sua cabeça os fantasmas da corrupção, paro, desigualdade social, injusta repartição da riqueza, incompetência e sensação de não estar representado politicamente polos seus deputados e deputadas. ... Tampouco se pode sentir tão otimista polo que se refere á ciência e ao progresso, por conhecer melhor os seus limites, se bem se pode dizer que os adiantos científicos e o progresso tecnológico são uma esperança fundada de cara a um futuro melhor, apesar dos retos enormes com os que nos enfrentamos: escassez de recursos, nomeadamente energéticos, alimentares, a persistência da cultura da guerra para a resolução dos conflitos, ...

Progrediu-se muito no reconhecimento dos direitos humanos individuais, embora o seu cumprimento é ainda insatisfatório, nomeadamente,  polo que di respeito á igualdade de direitos de gênero, incluída a igualdade de oportunidades. A mulher segue a ser considerada menor de idade para a Igreja católica e para diversas confissões de Caráter integrista, e segue a ser qualificada, muitas vezes, como uma mercadoria sexual. Infelizmente, seguem a coutar-se os direitos coletivos de auto-identificação e autodeterminação, verdadeira obsessão em vários países que pretendem colonizar aos povos que se integram no seu âmbito, como o desejo do Estado espanhol de espanholizar Catalunya e as demais comunidades com língua própria, do que foi iniciador Núñez Feijóo na Galiza e adais os governos do PP tanto o central como os que governam na Galiza, Valência e Baleares, em nome duma justiça e umas leis que eles mesmos impuseram ao seu bel prazer e arbítrio.

Em nome do que dizem progresso as oligarquias mundiais pretendem reduzir todos os países do mundo a uma língua, o inglês, e á cultura cosmopolita de aeroporto, convertendo os habitantes do planeta em átomos isolados e desenraizados da sua inserção comunitária, súbditos dóceis e inermes ante dos ditados do capital e mercados transnacionais, com o único objetivo de amassar dinheiro para uns quantos, e despossuir a massa dos cidadãos de qualquer direito efetivo e real.  Abençoam a soberania estatal sempre que coincida com os seus interesses, e em caso contrário convertem-se em patrioteiros folclóricos que subordinam os ideais pátrios á deusa pecunia.

O século das luzes defendia o deísmo, cria na existência de Deus, embora por  vezes não for considerado como providente, como no caso de Voltaire. A crença na divindade de Jesus de Nazaré esvai-se. No século atual, a religião deixou de informar a vida pública e mesmo em grande medida a privada, embora se mantenha presente a pratica ritualista em certos momentos significativos da vida do individuo, como o nascimento, câmbio de status civil e morte. A religião foi expulsada da ciência, cultura, arte, ... e foi abandonada polas elites intelectuais, e inclusive pola maioria social, que muitas vezes a vê como fria, distante, e sem capacidade de respostas aos problemas que tem que enfrentar no dia a dia. Si mantém uma presença ativa e militante em certos grupos, especialmente da extrema direita, como o Opus Dei, Comunhão e Libertação, os Kikos, Legionários de Cristo, e uma presença ritual em atos religiosos formais, como certas procissões e invocações, como a do Apóstolo, a cada passo mais desacreditadas, e ás que acodem os políticos de turno para demandar-lhe ao Apóstolo ou ao santo venerado a resolução dos nossos problemas, pois eles parece que não são capazes de afrontá-los.

IV.- Desenlace


Os prolegómenos da Revolução Francesa desembocaram na luta aberta e violenta com os poderes estabelecidos, e a substituição dos valores do Antigo Regime polas idéias e valores do liberalismo emergente. Produziu-se a revolução mais exitosa que se conhece, pois enquanto a Revolução de Outubro praticamente já perdeu a sua vigência, a revolução liberal nascida da Revolução Francesa, está fortemente consolidada na atualidade, embora não so a forma do liberalismo decimonónico senão complementada com os aditamentos que foi recebendo após o século XIX, em grande parte, sob a influência do sistema marxista e coletivista em geral.

Na atualidade a cidadania não parece de momento disposta a a ações similares á da tomada da Bastilha, e ao derrubamento violento das instituições, apesar do fenomenal descrédito no que caíram pola sua incompetência, corrupção e alinhamento com os poderosos. Submetidas a uma situação de limitação as suas manifestações e desatendidas as suas demandas, fica-lhe, e parece disposta a jogá-la, a carta do castigo eleitoral dos responsáveis deste desaguisado, como se está a constatar polo voto de indignação a partidos que, como Podemos, prometem uma regeneração da vida política, convertendo-se em instrumentos de ab-reação e esperança de futuro.

Hoje não se põe em questão a existência dos mercados, criaturas do liberalismo consolidado na França revolucionária, senão o controlo desses mercados; não se questiona a iniciativa privada, como fonte de riqueza e bem-estar, senão a falta de regulação da iniciativa privada; não se problematiza a propriedade privada embora se subordina ás necessidades sociais prévio pagamento do valor que se estabeleça; não se objeta contra o despedimento laboral em si, senão contra o despedimento sen freios e gratuito; não se questiona a iniciativa dos atores econômicos  privados mais si que se pretende que o Estado também poda intervir para atuar naqueles sectores a onde não chega a iniciativa privada e para corrigir as disfuncionalidades do sistema. 

Estes freios devem ser incrementados em muitos aspectos, como, por exemplo, impedindo ou dificultando a deslocação de empresas, os paraísos fiscais, favorecendo um maior controlo dos produtos financeiros, para evitar fraudes como o das preferentes, subordinadas e as hipotecas subprime. ... Ha que evitar que o sistema financeiro substitua a sua função de conceder créditos á economia real pola dum agente especulativo para obter dinheiro fácil e barato mediante a comercialização de produtos destinados a drenar recursos alheios em benefício próprio. Cumpre evitar a galopante e omnipresente corrupção político-administrativa mediante medidas legais que a dificultem e a penalizem severamente, e impulsar um modelo de sociedade baseado em valores ético-cívicos. Ha que evitar os apartheids fiscais como o da Igreja e a engenharia fiscal que favorecem a grupos empresariais. Ha que estabelecer uma lei de transparência de caráter universal e que permita conhecer o patrimônio de todos os que recebem dinheiro público, etc.  

O movimento do 15 M foi um revulsivo, expressão dum profundo ma-lestar e indignação pola maneira de gerir os assuntos públicos e um protesto contra a incompetência e corrupção dos governantes, que carregam todo o peso da crise sobre uma cidadania á que se culpa dela, por, dizem, ter vivido por acima das suas possibilidades, ao tempo que os que roubavam a mão salva, os que cobravam sobres em B, os que defraudavam ao fisco, as empresas do Ibex, as grandes fortunas, os que deslocam empresas, os que acumulam somas em paraísos fiscais, etc. vão-se de «rosinhas» e não se sentem afetados no mais mínimo. Chega-se á indignidade de expulsar de fato do país á gente nova e a que os pais não podam alimentar a sua família, com o pretexto absurdo de que isto é necessário por culpa da herança recebida, quando aqui herdamos tanto as políticas do PP como as do PSOE, pois enquanto um ocupava o governo de Espanha e alguns autonômicos o outro mantinha o governo de mais da metade das CCAA.

Esse grito de indignação que saiu á rua o 15 M, mas que muitos outros exponhamos desde a docência, não se pode obviar com o silêncio mais ou menos condescendente, como fizeram uns, nem com a coação e a violência institucional, como fizeram outros, senão que haveria que escutá-lo e assumir várias das suas propostas, mui razoáveis por certo. Hoje existe nos partidos políticos uma grande desorientação porque alguns viram que o controlo total, valendo-se de meios de comunicação «amigos» e  «pesebristas», já não garante por si só o controlo social e o assentimento da cidadania. A formação Podemos foi a que recolheu e atuou como catalisador de parte desse descontento e indignação cidadã, e da noite para a manhã converteu-se numa revelação política importante. Os ataques, grosseiros e puníveis muitas vezes em qualquer sociedade séria, que está a receber de certas formações políticas, traduz a sua desorientação e a percepção dum perigo real para a sua própria supervivência política. Alguns gurús tertulianos aprestaram-se a predizer a sua imediata desaparição, quiçá confundindo o desejo com a realidade, mais a mi parece-me que a sua irrupção social é uma necessidade para a regeneração de todas as instituições, começando pola Chefia do Estado, submetendo-as todas á eleição e controlo dos cidadãos.

A respeito do nosso país, creio que os partidos nacionalistas devem assumir grande parte dos valores expressados para ser um instrumento útil para o nosso futuro, pois creio que somente partidos próprios, totalmente necessários para garantir o nosso futuro como povo, abertos á cidadania e não fechados a elites partidárias que se perpetuam no poder, podem oferecer-nos soluções satisfatórias para o porvir. Ha que reconhecer que não se viram salpicados pola corrupção dum modo significativo e que tomaram medidas contundentes quando se produziu alguma demanda contra eles, mas devem realizar um esforço importante de apertura e de sintonia com a cidadania, sem pretenderem, pessoas ou grupos, constituir-se em apropriadores das essências pátrias e monopolizadores do poder político.





1.  KANT. ¿Qué es Ilustración? em  Filosofía de la Historia, Ed. Nova. Bos Aires.
2.  KANT. ¿Qué es Ilustración? em  Filosofía de la Historia, Ed. Nova. Bos Aires.
3.  Decreto de 29 de xuño de 1707, em Novísima recopilación de las Leyes de España, T. II, Madrid, 1805, lib. III, tít. III, lei Iª. Tomado de JOVER ZAMORA, JOSÉ MARÍA, La civilización española a mediados del siglo XIX, Espasa Calpe, Madrid, 1992, pp. 119-120.
4.  FERNÁNDEZ DE PINEDO, EMILIANO, GIL NOVALES, ALBERTO E DÉROZIER, ALBERT, Centralismo, ilustración y agonía del Antiguo Régimen (1715-1833), Editorial Labor, Barcelona, 1980, p. 215.
5.  HUMBOLDT, WILHELM VON, «La finalidad del Estado», em BRAMSTED, E. K., e MELHUISH, K. J., El liberalismo en Occidente, Unión Editorial, Madrid, 1982, T. III, p. 118.
6.  El contrato social, Libro II, cap. IV. ROUSSEAU, J.J., El contrato social, Orbis, Barcelona, 1984, p. 177.
7..  JÁUREGUI BERECIARTU, GURUTZ, Contra el estado-nación. En torno al hecho y la cuestión nacional, Siglo Veintiuno de España Editores, Madrid, 1988, p. 212.
8.  apocalipticus.over-blog.es/article-asi-se-manipula-en-la-tvg-121076344 http://www.eldiario.es/galicia/manipula-TVG_0_122488427.html
9.  «Fai un ano que Galiza foi reconocida como nazón en Berna pol-o Congreso das minorías nazonales», em A Nosa Terra (ANT), nº. 350, (29/09/1934), p. 3.
10.  Sempre en Galiza (SG),  pp. 322-323.
11.  «Carta a Marcial Fernández en México», (30/01/1945), em CASTELAO, Obras, (OCA),  T. 6, p. 516.
12.  CASTELAO, «En col da nosa misión», em PALMÁS, RICARDO, Castelao: Prosa do exilio, (PE), Edicións do Patronato da cultura Galega, Montevideo, 1996, p. 93.
13.  CASTELAO, «La posición ideológica de Galicia», em PE, p. 114.
14..  «IV.- Galicia, célula de universalidade», em ANT, nº. 300 (09/07/1933). Cf. TOBÍO, LOIS, «Os valores éticos em Castelao», em Congreso Castelao (CC), Universidade de Santiago de Compostela, 1989, p. 234.
15.  Deputado socialista francés (1859-1914), defensor do antiimperialismo.
16.  SG,  p. 432.
17.SG,  p. 434.
18. Ícaro, filho de Dédalo, ambos encarcerados por Minos no Labirinto, paço de Minos em Cnosos, ilha de Creta, e libertados por Pasifae. Tinha as asas de cera e, no intento de fugir da ilha, desobedecendo os preceitos de seu pai, chegou-se tanto ao sol que se lhe derreteran e caiu ao mar.
19.  SG,  p. 433.
20.  La españa del siglo XVIII y el reformismo borbónico, www.ieslania.es/equipodocente/CCSS/T1_SigloXVIII.
21.  Las relaciones Iglesia-Estado em España durante los siglos XVIII y XIX, dialnet.unirioja.es/descarga/articulo/66459.
22.  RUSSELL, BERTRAND, Por qué no soy cristiano, Hispano Americana, Barcelona, 1981, p. 31.
23.  RUSSELL, BERTRAND, Por qué no soy cristiano, Hispano Americana, Barcelona, 1981, p. 31.
24.  Segundo Manuel Marliani, liberais e servis eram os nomes "con que se diferencian en España los parciales de la libertad y del absolutismo; habiendo pasado la voz liberal, como distintivo político”, MARLIANI, MANUEL, El reinado de Fernando VII, Sarpe, Madrid, 1986, pp. 78. 
25.  Diccionario razonado, manual, para inteligencia de ciertos escritores que por Equivocación han nacido en España. Tomado de ANTON, J. e CAMINAL, M., Pensamiento político en la España contemporánea, Teide, Barcelona, 1992, p. 31.
26.  TURGOT, Carta al abate Terray, "sur la marque des fers», em BRAMSTED, E. K., e MELHUISH, K. J., El liberalismo em Occidente, Unión Editorial, Madrid, 1982, T. II, p. 116.
27.  Semanario, nº. 25, p. 281. (Citado por LAG, p. 133.
28.  RUSSELL, BERTRAND, Por qué no soy cristiano, Hispano Americana, Barcelona, 1981, pp. 54-55.
29.  MISES, LUDWIG VON, Liberalismo, Planeta Agostini, Barcelona, 1994, p. 52.
30.  «Un ‘chollo’ fiscal para la gran empresa», El País, 23/03/2012, p. 36.
31.  «Un ‘chollo’ fiscal para la gran empresa», El País, 23/03/2012, p. 36.
32.  Pragmática de Carlos III contra los Gitanos - Andalucía, em ...www.andalucia.cc/adn/0399doc.htm