27 ene 2015

Grécia deve cumprir os seus compromissos!

Alexis Tsipras
Distinguia Locke entre o estado de natureza,  estado de sociedade e estado de força. O primeiro é aquele no que os homes se guiam pola razão sem ter chefes comuns aos que apelar, e, em conseqüência, cada um pode tomar a justiça pola própria mão e cumpre, para com os infratores das normas, o papel de vigilante, fiscal, juiz, e executor do castigo, como por exemplo, na monarquia absoluta, na que o rei tem um poder omnímodo e em caso de conflito com os «súbditos», estes carecem duma instância superior e independente que o dirima. Por isso, esta monarquia ha que substituí-la por uma monarquia constitucional na que o monarca esteja submetido ás leis e nas que exista divisão de poderes, que para ele seriam o legislativo, executivo e federativo. Por outra parte, nas relações internacionais, os estados vivem num estado de natureza por não existir instituições internacionais ás que acudir em caso de conflito entre estados.  A “força ou o propósito declarado de empregá-la sobre a pessoa doutro, não existindo sobre a terra um soberano comum ao que poda acudir-se em demanda de que intervenha como juiz, é o que se chama estado de guerra. 

Hoje a UE rege-se por um estado misto entre natureza e força, entendida esta não num sentido de despregadura de armas com a finalidade de inferir a morte física aos outros em batalhas cruentas, senão de imposição coativa de normas aos mais débeis. Nesta crise interminável que estamos a padecer e sem visos de que se tomassem as medidas atinadas para atalhá-la, ao contrário do que aconteceu nos EEUU, como conseqüência da miopia europeísta da Sra. Merkel, ama coativa e impositiva de toda Europa, houve vários países que necessitaram ajuda financeira para poder financiar-se porque os mercados só lhe emprestavam a uns juros de usura, pola falta de confiança em poder recuperar o dinheiro. Para solucionar este problema tiveram que acudir a empréstimos dos estados vizinhos, entre eles Espanha, convertida em emprestadora e devedora, e de instâncias comuns européias, como a Comissão Européia, e internacionais, como o FMI, instâncias estas duas que, junto com o BCE, são os que conformam a famosa troika.

Estes apresentam-se como a salvadores dos países em apuros e decidem solucionar a situação desprestigiando os cidadãos dos países afetados e impondo umas condições leoninas, com cláusulas abusivas, que não só obrigam ao estado afetado a devolver o dinheiro, senão a cambiar toda a sua política econômica, sem conhecer a realidade dos países afetados nem atender as suas razões, e de acordo com os critérios dos emprestadores, entenda-se principalmente referido á teimosia teutônica da Sra. Merkel que reduziu os demais a meros comparsas, que atentariam contra o estado de direito dos cidadãos de qualquer dos países europeus membros. Suponhamos que um particular vai pedir um empréstimo a um banco numa situação em apuros, e este para atender a sua petição lhe impõe umas condições tales que alguns dos familiares não podem realizar determinados trabalhos com os que vinham contribuindo á caixa comum familiar, e, de resultas os pais carecem de ingressos precisos para dar de comer e formar aos filhos e netos. Neste caso familiar a legislação e, em conseqüência, qualquer juiz consideraria que ha que garantir uns recursos mínimos inembargáveis a todo um país para não condenar aos seus membros á morte por inanição, a doenças por não ter serviços sanitários, e a ter o futuro fechado por não ter a formação requerida para desenvolver-se num mundo tão competitivo e hostil. Isto é o que está a passar na Europa de hoje, com a cumplicidade dos governantes dos países afetados, dóceis discípulos da sua implacável mestre.

Agrava-se isto se se mantém uma atitude pertinaz e nem sequer se dá aprendido dos resultados nefastos das medidas exigidas, reconhecidos polos mesmos emprestadores, que somente produzem paro, miséria, e, o mais decisivo de todo de cara ao retorno dos empréstimos, um incremento galopante do endividamento galopante que lhe impede fazer frente aos seus compromissos ainda que quiser.

Esta política austericida está a produzir uma tremenda fatura, divisão e decepção na Europa, além de destruir as instituições democráticas. Como dizíamos num artigo anterior, hoje os únicos que têm autêntica democracia são os alemães e os seus comparsas nortenhos, mentes que os povos mais afetados pola crise sentem-se inermes para sair da sua situação e vem atônitos como o seu voto em urnas vale mui pouco porque as decisões vitais que lhe afetam se tomam em instâncias não submetidas ao voto popular. Abuso, puro abuso, infámia.

Falar de compromissos nesta situação não deixa de ser impróprio, porque o único que se lhe oferece aos povos é uma eleição entre uma solução mala ou o abismo, e sem a mais mínima igualdade entre os contratantes: emprestadores e prestamistas. Também no Estado espanhol os preferentistas e os que compraram uma vivenda com garantia da sua hipoteca assumiram compromissos, mas estes compromissos nestas situações de desigualdade e com cláusulas claramente abusivas, foram declaradas nulas de pleno direito polos juízes. Por conseguinte, também neste caso, não se pode falar de compromissos quando se trata lisa e lhanamente de imposições dos emprestadores, que os prestamistas se vem obrigados a aceitar pola sua situação de debilidade da que se aproveitam aleivosamente os seus teóricos benfeitores.

É evidente que Alemanha contribuiu decisivamente á prosperidade da Europa e a sua constituição como um polo de poder importante num mundo cada vez mais integrado, mas também é certo que Europa é vital para Alemanha, potência exportadora de primeira magnitude,  porque lhe permite dispor dum mercado onde colocar os seus produtos em condições favoráveis. A sensação que um tem é que os governantes alemães anteriores compreendiam a situação e procuravam impulsar o barco europeu, mas a Sra. Merkel parece não compreender o projeto europeu e só se fixa no dinheiro que sai diretamente do peto dos seus concidadão, sem dar-se conta do que entra indiretamente. O projeto europeu ou é um projeto solidário e com medidas que permitam afrontar situações críticas, ou não é nada nem tem futuro nenhum. Neste momento, com as suas medidas está a acrescentar-se o descontento, a frustração e o pessimismo ante um barco á deriva.

22 ene 2015

Um Beiras patético

Beiras e Iolanda Díaz

Creio que á figura venerada de Beiras lhe sobrou amplamente o epílogo da sua etapa política. Cegou-o o seu anseio de protagonismo social e político e não soube retirar-se a tempo do primeiro plano da cena pública, e agora está dando umha uma imagem patética que nos enche de carragem a muitos por considerar que não está á altura das expectativas e consideração política que tínhamos depositado nele. Numa entrega anterior já expus o que pensava da sua grande transgressão, por utilizar as suas palavras, que consistiu em desprezar o pacto com as formações nacionalistas e arrimar-se e ressuscitar opções espanholistas faz tempo fenecidas. Remito a essa entrega ao leitor interessado nesta questão.

Na campanha das eleições para o Parlamento Europeu, um dos argumentos esgrimidos por José Manuel para coligar-se com EU em vez de fazê-lo com o BNG foi que isso lhes permitiria entrar em contacto com as esquerdas européias. Patético! Agora deveria expor-nos as vantagens que obteve para Galiza esse cacarejado contacto, se é que teve algum, mas o que si fez foi debilitar notoriamente o posicionamento da Galiza. Lídia Senra não representa a Galiza senão os interesses de IU e os espanholistas na Europa,

No dia de ontem, 21/01/2015 fizeram-lhe uma entrevista numa televisão galega, na que se abordou o modelo de sociedade e o modelo de Estado. A uma pergunta dum tertuliano, formulou o princípio básico: «Não pode haver libertação na Galiza se não ha libertação nacional», que subscrevo totalmente. Mas as esquerdas espanholistas não vão libertar a Galiza, porque os interesses do nacionalismo espanhol são diametralmente opostos aos do nacionalismo galego, tanto polos seus interesses como pola sua legitimidade e dinâmica próprias, que são mui distintas num e noutro caso. O nacionalismo espanhol sempre foi e sempre tenderá a ser expansivo e negador dos direitos dos povos que convivem na Espanha, embora que com matizes nas suas formas, nuns casos mais democráticas que noutros. Não é capaz de apresentar políticas que redundem nos interesses da Galiza porque isso precisaria medidas tomadas desde e para Galiza, e não desde Madrid e em benefício das oligarquias espanholas, incrementado polo fato de que o Estado espanhol foi sempre mui corrupto. Os interesses do nacionalismo galego orbitam na defesa dos direitos duma nação negada e empobrecida por umas políticas que a prejudicam em benefício alheio. Todo isto conhece-o mui bem o Sr. Beiras, e deveria extrair a conclusão de que a maridagem com ele é pouco recomendável a partir do princípio básico que ele assume, mas em vez disso, alegou, após reconhecer que o BNG chegou a uma síntese equilibrada entre a questão nacional e questão social, ou o que é o mesmo, entre o modelo de sociedade e o modelo de estado, que neste momento histórico de crise ha que inclinar a balança pola questão social, ou seja reforçar o nacionalismo espanhol de esquerdas que depois tem como conseqüência de que se faça inviável a libertação nacional.  Patético! Em declarações anteriores manifestara que chegara a convicção de que ir de ganchete com Izquierda Unida lhe permitiria alcançar o federalismo para Galiza porque a independência é inviável pola falta de apoio cidadão, mas parece que agora o problema é a crise, que ele utiliza como pretexto para o seu salto no vazio e cara a nenhures.

Pretende justificar a sua coligação com os de Esquerda Desunida apoiando-se na coligação do Partido Galeguista de Castelao e Bóveda com o Frente Popular, mas parece esquecer que a coligação propugnada por Castelao se realizou com uma alternativa que estava em disposição de conceder-lhe a Galiza o que prometia, que era a aprovação do Estatuto de Autonomia, como assim se fez, mentes que Izquierda Desunida não está em disposição de aprovar nada que favoreça a este país, e neste momento é já mais um projeto histórico e uma opção fracassada, pola irrupção de Podemos e polos méritos próprios de desunião e rifa constantes. Por outra parte, Castelao nunca postergou a coligação com opções galeguistas em aras do puro pragmatismo eleitoralista, como fez o Beiras, como se demonstra pola áceda crítica que lhe dirigiu a Nogueira quando pactuou com a Esquerda Unida de Anjo Guerreiro. Creio, por tanto, que não deveria pronunciar em balde o nome do ilustre e merecidamente venerado político rianjeiro.

José Manuel é um home tremendamente teimoso e continua a propugnar como opção de futuro a sua frente ampla, apesar de que, neste momento, a viagem com IU não soma senão que mais bem resta, de que contradiz o princípio básico fundamental acima expressado e de que Anova demonstrou sobejadamente que não é capaz de integrar nada, nem os quatro gatos que a integravam, com perdão para os gatos, e que não fez senão reproduzir mui incrementado o pior defeito do BNG que é o controle monolítico da organização e a exclusão do desviante. Os demais, como é natural, não estão dispostos a suicidar-se e a Deus graças.

Ontem alguns dos contertúlios manifestaram-lhe que lhe fez muito dano ao nacionalismo galego, e penso que com toda razão, pois não ha nada que o tiver prejudicado mais que o fato de que o seu antigo líder, parece que só por rabechas pessoais e por interesses eleitorais de curto alcanço, lidera-se uma cruzada, digna de melhor causa, em contra da sua antiga organização, e, de resultas contra todos os que luitamos porque na Galiza também brilhe o sol. No resto da sua vida tem mui difícil reparar o dano causado, fazer propósito de emenda e cumprir a penitência polo pecado de falhar-lhe a tantos que tanto o apoiamos e ajudamos a ascender ás mesmas proximidades do Olimpo.