5 ene 2016

Quo vadis, PSOE?




Repetimos, modificada, a pergunta que o apóstolo Pedro, quando escapava de Nero pela Via Apia, lhe fez a Jesus ao visioná-lo portando uma cruz: «Quo vadis, Domine». No caso presente, «A onde vais, PSOE?». Claro que poderia suceder que um ma-lintencionado, coma mim, se lhe ocorresse pensar que  a pergunta que haveria que fazer seria: «Vais a algures, PSOE?». Há alguns indícios que são ilustrativos duma deriva ziguezagueante desta organização, tanto no terreno ideológico como na praxe política.

É um partido que teoricamente se supõe que intenta implantar o socialismo, como os partidos denominados comunistas, mas que se diferenciaria deles por tentar fazê-lo por vias democráticas. Mas, embora se supõe que pretende caminhar cara a uma sociedade socialista, promove a preeminência da oligarquia com a reforma do artigo 135 da Constituição Espanhola, em conivência somente com o partido mais pro-oligárquico do arco político espanhol e um dos mais reacionários da Europa, como é o  PP. Declara-se democrático, e não obstante não permite que os povos votem em liberdade e, por tanto, não respeita o direito básico dos povos a decidir o seu futuro. Declara-se democrático e promove a denominada lei de Partidos, que muitos suspeitam que se utiliza como coarctada para ilegalizar formações não sempre terroristas, devido, sobre todo, a que a separação de poderes é mui imperfeita no Estado espanhol. Avaliza a sua condição democrática por ser defensor das primárias, mas os seus dirigentes são os primeiros que invalidam os seus resultados, como Pedro Sánchez em Madrid, e Besteiro em Ourense. 

Em janeiro de 2016 estão-se a sondar as possibilidades de poder constituir um novo governo como resultados das eleições do 20D. Parece razoável que cada organização política sinale, antes de pronunciar o «si quero», os condicionantes que os seus eventuais coligados devem cumprir para formalizar um matrimônio estável, eficaz e congruente com o próprio programa com o que se apresentou ás eleições, se bem tem que ser consciente de que não todo ele se poderá realizar, e que também os seus parceiros têm direitos semelhantes. Também é legítimo traçar linhas vermelhas, condições sine qua não, que poderiam obstaculizar o desposório, mas quando se faz isto creio que estas linhas vermelhas devem incumprir os com os direitos humanos, a história da formação e/ou a sua estratégia a longo termo.

Podemos estabeleceu como conditio sine qua non, como condição imprescindível, que o partido ao que apóiem deve permitir um referendo em Catalunha, e a esta proposta responde-lhe o PSOE com uma linha vermelha simétrica de que o seu associado ou sustento pontual tem que renunciar a que esse referendo se celebre. Isto é o que devemos analisar agora se é razoável ou não. Defendemos num artigo publicado faz pouco que, em vez de afirmar que a democracia é o império das maiorias com respeito das minorias “seria melhor afirmar que a democracia é o império das maiorias, respeitando os direitos humanos, tanto individuais como coletivos; tanto dos indivíduos isolados como dos povos”. Isto é muito difícil de rebater porque já é algo geralmente aceitado. Ora bem, o que observamos é que o PSOE impõe como linha vermelha o incumprimento dum direito humano básico, que é o direito dos povos a decidir, direito que está reconhecido amplamente nos documentos da ONU. Espero que ninguém me venha com a endrómina, como freqüentemente se faz nas tertúlias, de que esse direito surgira para casos de colonialismo, porque um direito humano não depende das circunstâncias em que surgiu senão das exigências morais ás que responde. Por tanto, não é ético nem democrático negar que os povos podam ser consultados e podam decidir livremente o que querem ser, sobre qual é o seu posicionamento a respeito dos demais povos. É costume inveterada no Estado espanhol diferenciar entre povos de primeira categoria, o povo espanhol, e povos de segunda categoria, os povos vasco, catalão ou galego, incluso entre aqueles aos que se lhe enche a boca de falar de igualdade para todos. O único povo ao que ninguém lhe discute o direito de autodeterminação é ao povo espanhol, mas muitos pensam que os demais devem ficar submetidos e colonizados in vitam aeternam.

Tão-pouco é legítimo apresentar-se ás eleições com um programa no que se estabelece que se oporão a que os povos sejam consultados, porque todos os direitos humanos são universais, invioláveis e irrenunciáveis. Não se podem mesquinhar, ainda que si se pode negociar a sua efetivação. Aliás, não se pode dizer que este direito colida com a história do PSOE, porque no seu programa político aprovado no mês de julho de 1918, estabeleciam que: “O Partido Socialista Obreiro Espanhol considera necessário para realizar a sua aspiração obter as seguintes medidas políticas e econômicas: Confederação republicana das nacionalidades ibéricas, reconhecidas a medida que vaiam demonstrando indubitavelmente um desenvolvimento suficiente, e sempre sobre a base de que a sua liberdade não entranhe para os seus cidadãos míngua alguma dos seus direitos individuais já estabelecidos em Espanha e de aqueles que são patrimônio de todo povo civilizado”. Alguém pode objetar que no texto aludido não figura explicitamente o reconhecimento do direito a decidir, ainda que seja difícil negar que aparece implicitamente, mas, no Congresso do PSOE celebrado o ano 1976, aprovou-se que “o Partido Socialista propugnará o exercício livre do direito de autodeterminação pola totalidade das nacionalidades e regionalidades que comporão em pé de igualdade o Estado federal que preconizamos. ... A constituição garantirá o direito de autodeterminação”. Fundamentava-o mantendo que “a análise histórica diz-nos que na atual conjuntura a luta pola libertação das nacionalidades ... não é oposta, senão complementária com o internacionalismo da classe trabalhadora”. Á vista destes antecedentes, bem se pode ver que no PSOE se produziu uma fratura ideológica democraticamente regressiva no momento da transição política, na que decidiu baixar os pantalões antes as hostes franquistas, inter-cambiando os direitos dos povos pela camaradagem borbônica. Agora pretendem fazer-nos ver que eles são bons rapazes e nada suspeitosos do horrendo crime de romper Espanha, consubstancializando interessadamente consultar com romper, ao tempo que exibem a sua maridagem com todos aqueles que a estão a romper de fato.

Na praxe política diária a impressão que deixam na cidadania é de que se trata dum partido sem rumo, um partido carcomido por divisões e conflitos internos. Susana Diaz foi determinante para que Pedro Sánchez saísse elegido Secretário Geral, mas ato seguido começou a sua campanha de derrubamento contra ele, parece que para pôr-se no seu lugar. Esta Senhora parece que se considera e é considerada por muitos como a nova Messias que, com um sopro, vai conduzir ao PSOE á maioria absoluta no Congresso dos Deputados, e eu pergunto-me quais são os fundamentos desta hiper-valoração, quais são as suas gestas até este momento. Ela foi a principal responsável de que tenham o Secretário Geral que têm, e considero que não deviam desorientar a cidadania socavando-lhe a erva debaixo dos pés os mesmos que o entronizaram, sem deixar-lhe o tempo suficiente para mostrar as suas potencialidades. O que si ficou claro é que defende a maridagem histórica com o PP e se entende a maravilhas com os partidos mais centralistas e antinacionalistas do Estado espanhol. Os barões falam de substituir a Pedro Sánchez já, e parece que em contra da mesma legalidade estatutária. Pretextam todos eles, incluída a Sra. Diaz, os maus resultados eleitorais, porque parece que entendem que após uma legislatura de Zapatero em que não deu pé com bola, e duma igualmente catastrófica de Rajoy, já, por arte de magia, abrir-se-lhe-iam as portas da Moncloa de par em par. Eu creio que, tendo em conta os antecedentes e as formações alternativas concorrentes, não foram brilhantes, mas tão-pouco péssimos. Contrariamente ao PSOE das duas primeiras décadas do século XX, que era um partido que emocionava, frente aos partidos da Restauração, e que nalgum momento chegou a seduzir incluso ao reacionário Ortega e Gasset, hoje não entusiasma, a gente não se encandeia com ele, não o vê como um partido de futuro, um partido adequado para resolver os seus problemas, além que, ao igual que o seu concorrente do bipartito, está lastrado pola corrupção. Como sócio político, tão-pouco é muito de fiar, como o demonstra o seu modus operandi durante o governo bipartito em Galiza, no que atuou como dinamiteiro desde dentro e como o principal responsável de que hoje governe ainda Feijóo.   

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