O
PP de Lalim quer que se revogue uma resolução pela que se estabelecia a
aconfessionalidade do Concelho de Lalim, e que reconheça as suas raízes
cristãs, que consideram que se desvirtuaram com a resolução promovida pelo governo
local desta comunidade em abril de 2016, pela que se eliminava a simbologia
religiosa confessional em espaços públicos e se estabelecia a não participação
em eventos religiosos dos cargos do governo em qualidade de tais, com
independência de que assistam com caráter individual. Os argumentos que cita
apoiar as suas pretensões são:
a) Que a Igreja católica representa
valores democráticos, como a justiça, liberdade, igualdade.
b)
Que a Igreja foi quem introduziu na
história a total independência do poder religioso e do poder político com a
resposta de Jesus aos fariseus: “Dai ao César o que é do César e a Deus o que é
de Deus.
c)
O necessário respeito do Concelho ás
liberdades individuais. Vamos intentar responder a estas argumentações.
Representa
uma absoluta novidade a afirmação de que a Igreja representa valores democráticos
quando ela mesma afirmou sempre por ativa e por passiva que não se rege
democraticamente, senão que se confessa como uma monarquia na que os seus
dirigentes são todos elegidos, direta ou indiretamente, pelo dedo do seu
gerente na terra, que é o Romano Pontífice, monarca absoluto elegido por um
grupo de cardeais que não representam a ninguém. Nos seus primeiros tempos
participavam na eleição dos bispos, incluído do bispo de Roma, os fieis, os
presbíteros e os bispos, e pouco a pouco essa participação foi sendo e
eliminada e agora só é eleito por um grupo de bispos-cardeais elegidos a dedo
pelo pontífice ou pontífices anteriores. Na sua estrutura, a Igreja Católica é
a instituição mais piramidal que existe hoje em dia, e a razão pela que foi
eleita no s. IV por Constantino como companheira do império foi o seu
autoritarismo. O Estado do Vaticano é um estado absoluto no que não existe a
mais mínima divisão de poderes, pois o Pontífice acumula os poderes
legislativo, executivo e judicial. A instituição eclesial considera que na sua
dinâmica de eleição de cargos está regida pela presuntiva inspiração do
Espírito Santo, e nem sequer apresentam aos eleitores o programa que vaia
orientar ou reger a sua ação de governo, pois só dependem e tem que dar razão
ao Altíssimo. O papa é o único governante do mundo que pode tomar decisões em
contra de toda a sua organização, Igreja reunida em concílio, e, por tanto, um
indivíduo sozinho vale mais que toda a organização junta, como se demonstra
pelo facto de que João Paulo II e Bento XVI foram capazes de desmantelar o
Concílio Vaticano II.
Se
revisarmos os documentos eclesiais não achamos nenhuma defesa decidida da
democracia e si várias resoluções para opor-se a ela. Assim, na Encíclica Pascendi, promulgada por Pio X
no ano 1907 condenam-se os supostos erros dos modernistas, que, ante a
introdução do regime popular pela consciência pública, pediam introduzir formas
democráticas na Igreja. “Se, pois, -diziam-
não quer levantar e fomentar nas
consciências dos homes uma guerra intestina, a autoridade da Igreja tem o dever
de usar das formas democráticas, tanto mais quanto que, de não o fazer,
ameaça-lhe a ruína” (Denzinger, 2091) Os modernistas pretendiam modernizar
o regime da Igreja para adaptá-lo a consciência moderna, pretensão que foi
condenada pelo citado Papa. “O regime da
Igreja, clamam, deve ser reformado em todos os aspetos, porém principalmente no
disciplinar e dogmático; e por tanto, dentro como fora deve acomodar-se com a
consciência moderna, como dizem, que tende toda á democracia. Por ende ao clero
inferior e aos laicos devem ser atribuídas participações no seu regime e
distribuir uma autoridade que está demasiado reunida e concentrada no centro”.
(D. 2104). Por conseguinte, nada de acomodação com a consciência moderna nem
atribuição aos laicos e clérigo inferior participação no seu regime.
A respeito do ensino, o papa
integrista João Paulo II, na sua Encíclica. Fides et Ratio, nº. 89, de 4/09/1998, condena as
decisões dos poderes públicos nos temas morais, o qual equivale, a que o povo,
por meio dos seus representantes não pode impulsar normas neste âmbito, senão que
estas devem ficar ao arbítrio da Igreja, única instituição que pode influir
sobre as consciências. Diz o citado pontífice: “Apresentando tantos perigos, o pragmatismo é a atitude de espírito dos
que, realizando a suas escolhas, excluem o recurso á reflexão teórica ou a
avaliações fundadas sobre princípios éticos. As conseqüências práticas desta
maneira de pensar são consideráveis. Em particular, vem-se defender uma
conceição da democracia que não toma em consideração a referência aos
fundamentos de ordem axiológica e por tanto imutáveis; é a partir dum voto da maioria
parlamentar que se decide do caráter admissível ou não dum comportamento
determinado. A conseqüência duma tal maneira de ver aparece claramente: as
grandes decisões morais do home são submetidas ás deliberações pouco a pouco
tomadas pelos organismos institucionais . Há um erro importante nesta
argumentação que consiste em consubstanciar o axiológico, ou seja, o referente
aos valores, com o imutável. Há valores que se podem considerar imutáveis,
como, por exemplo, a ajuda mútua em caso de necessidade, mas há outros que são
mutáveis, como, por exemplo, que ambos esposos compartam as responsabilidades
no lar. Evidentemente, a alternativa a que decida um parlamento, é que decida
um indivíduo só a partir de textos arcaicos com os que é totalmente impossível
construir ética alguma digna deste nome. Parece que é um despropósito a todas
luzes afirmar que dispõe de normas ética universais uma religião mui concreta
como a cristã, como afirma João Paulo II na Encíclica
Veritatis Splendor, que foi a
protagonista das cruzadas, da inquisição, do Índice de livros proibidos, da
proibição de ler a Bíblia aos mesmos cristãos, de ter-se apropriado de
quantidades elevadíssimas de imóveis de titularidade alheia por meio do
mecanismo das imatriculações, que goza de privilégios exorbitantes em todas as
ordens, incluída a isenção de impostos para pagar os serviços públicos, que
vive a expensas do erário público, que sai do peto de todos os contribuintes,
incluídos os membros doutras religiões e ateus, que condenou os direitos
humanos, incluídos os de pensamento e culto, que provocou a maior matança dos
fieis cristãos doutras facões a aprtir do reinado de Teodósio I no ano 380,,
que se arrogou o direito e escravizar e dar autorização a diversos estados para
que submetessem a escravidão a países inteiros, que continua praticando uma das
maiores discriminações contra a mulher que recordam os séculos, que botou e
bota para o inferno aos homo-sexuais, que bem-disse a pratica da castração pelo
reino dos céus e do coro da capela Sixtina,... Não tem sentido nos nossos dias
pretender que toda a sociedade tem que abraçar uma ética deste teor e muito
menos que se considere como o fundamento duma verdadeira democracia. “Só na obediência
ás normas morais universais –diz o
Pontífice-o home acha plena confirmação
da sua unicidade como pessoa e a possibilidade dum verdadeiro crescimento
moral. Precisamente por isto, o citado serviço está dirigido a todos os homes; não só aos indivíduos,
senão também á comunidade, á sociedade como tal. Com efeito, estas normas
constituem o fundamento inquebrantável e a sólida garantia duma justa e
pacífica convivência humana, e por tanto duma verdadeira democracia, que pode
nascer e crescer somente se se baseia na igualdade de todos os seus membros,
unidos nos seus direitos e deveres”. Como pode reclamar uma democracia
igualitária quem não admite que os clérigos inferiores e os laicos participem
na tomada de decisões? Como pode falar de igualdade participativa quem não
permite que os laicos, clérigos elejam aos seus dirigentes a todos os níveis?
Como pode falar de democracia igualitária quem não reconhece á mulheres os
mesmos direitos que aos homes, senão que, seguindo a Paulo, clama: «mulieres in
ecclesia taceant», as mulheres na Igreja que calem.
Se em vez de documentos falamos dos companheiros de viagem da instituição
eclesial observamos que esta constitui ao longo da sua história um tandem inseparável
com o poder político – a cruz e a espada- para a repressão da cidadania em
geral e dos dissidentes em particular, em benefício mútuo de ambas as instituições.
Levou baixo pálio e louvou aos maiores ditadores, que combateu denodadamente
contra o regime democrático da II República espanhola, silenciou os reiterados abusos
no seu seio,..
O
citado pontífice, João Paulo II combate denodadamente os totalitarismos, mas o
surpreendente é que não aplique o rolo á mesma Igreja, que sempre teve afãs
totalitários, e falo de totalitários no sentido etimológico, enquanto
proveniente de total. Um totalitarismo é aquela ideologia ou praxe que pretende
abarcar a totalidade da vida do indivíduo e da mesma sociedade, e esta foi e é
a praxe eclesial ao longo da história. Que digam, se não é certo, que aspecto da
vida não pretendeu controlar. Uma instituição que, direta ou indiretamente, se considera
com direito a depor governantes, a dogmatizar sobre a forma da terra, sobre o
heliocentrismo, sobre o evolucionismo, sobre os livros que os indivíduos, fieis
ou não- podam ler ou possuir, que se arroga a autoridade exclusiva para
interpretar os livros sagrados, que controla as consciências e as condutas das
pessoas desde os confessionários, que se opôs frontalmente a que os
representantes populares podam legislar para que se lecione Educação para a cidadania por temor a
perder o seu monopólio educativo,... A Igreja não está disposta a aceitar que
ela é somente uma parte dentro da sociedade, legítima e merecedora de respeito como
qualquer outra, e tem pretensões de devir o todo social, de converter-se num
estado dentro do estado, e creio que chegou a hora de que cambie de ship e se
adapte aos novos tempos, que querem uma igreja mui distinta em todas as ordens.
E esta Igreja anquilosada é a que o PP de Lalim pretende que tenhamos como
modelo.
(Continuará)
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