Estamos
acostumados a ser bombardeados a travês dos mídia com expressões tais como «o respeito do
estado de direito é imprescindível para que exista democracia», «não pode
haver democrqacia sem submissão às normas que uma sociedade se dá a si mesma», etc. Para
ajuizar a validez destas expressões cumpre antes de nada estabelecer algumas
precissões conceituais. Por estado de direito entende-se o conjunto de normas
vigentes numa determinada comunidade e aceites, velis, nolis, queiras ou não,
polos seus membros. Em si este conceito é muito distinto do conceito de
democracia, que significa que quem se dá as normas é o «demos», o povo, e não um grupo de notáveis,
um estamento como os militares ou as oligarquias, etc. Platão ditou toda uma
série de leis que deviam ser cumpridas na sua cidade ideal e, portanto,
delimitou já oestado de direito, o qual em si nada tinha que ver com a
democracia. Em tempos de Carlos III ninguém problematizava o sistema normativo
emanado dum monarca absoluto que dispunha do poder sobre vidas e fazendas e,
portanto, não tinha nada de democrático, mas era um verdadeiro estado de
direito.
O
estado de direito hoje vigente no Estado espanhol está imposto coativamente
polos unionistas, que consideram o Estado, unitário e descentralizado, como a
sua própria parcela sobre a que ordenam e mandam com poder absoluto, como se
demonstrou com a imposição do artigo 155, e só permitem determinados o usufruto
de certos poderes subordinados, a condição de que os inquilinos se portem
corretamente e obedeçam as normas supremas emanadas do poder do Estado
espanhol, único aceitável para eles. Consentem todo o mais o estabelecer certos
pactos com arrendatários de certas atribuições, submetidos a uns contratos
desequilibrados em favor do arrendador, que estão dispostos a anular quando
lhes pareça oportuno e proceder à anulação do contrato de aluguer dum modo
unilateral. Obedecendo a uma política de curtos vôos utilizam a política de
submetimento dos povos periférios do Estado espanhol como instrumento para
obter réditos eleitorais entre os setores unionistas, muiro majoritários no
Estado.
O
problema é que esta visão depreciativa dos povos periféricos e negadora dos
direitos fundamentais dos povos, como é odireito de autodeterminação e de
decissão sobre o próprio autogoverno, entrou em crise com o domínio das forças «nacionalistas» nas
comunidades de Catalunha e Euskadi, e o incremento do seu poder na Galiza e em
Valência, dentro dum contexto de espertamento dos povos e de reivindicação de medidas
democráticas de governança própria. Os Estados que aplicam medidas de
participação política mais avançada, como é o caso de Suiça, Reino Unido ou
Canadá, superaram as tensões disgregadoras e são sumamente estáveis, enquanto
que aqueles mais autoritários e centralistas, como Turquia ou Espanha, são
Estados muito mais instáveis e problemáticos.
O
Tribunal Supremo do Estado espanhol aprestou-se a qualificar a qualificar de
rebeldes aos que impulsaram um referendo para decidir que pensava do seu futuro
o povo catalão. Perante tão descomunal despropósito, aos unionistas não se lhe
ocorre melhor solução que instar os nacionalistas a que respeitem o estado de
direito, que foi imposto por eles a todos os povos do Estado espanhol, e inclusive
não se arredam de substancializar a o citado estado de direito com a
democracia.
A
qualidade do estado de direito vigente no povo espanhol recebeu um golpe mortal
com a resolução do tribunal de Scheleswig-Holstein de denegar a extradição de
Puigdemont a Espanha polos delitos de rebelião, sedição e desordens públicas e
só admitir a extradição por malversação, por não aprezar que se utiliza-se a violência
para conseguir o objetivo político da independência, ou seja, que o tribunal
regional alemão viu o que vimos todos os demais cidadãos espanhóis: que os
polícias e a guarda civil, obedecendo o lema «a por eles», malharam em velhos e velhas
indefesas que iam depositar pacificamente uma papelata numa urna. Viu este
Tribunal que o Tribunal Supremo espanhol montou um relato para fazer aparecer
como violentos precisamente aos que sofreram a maior violência. Esta resolução
do Tribunal Supremo pode entender-se muito bem se temos em conta a politização
deste alto tribunal, cujos membros são elegidos polos vogais do Conselho Geral
do Poder Judicial, que, à sua vez, são nomeados polos políticos unionistas na
sua totalidade. Os unionistas do artigo 155 puseram o grito no céu quando se
conheceu que um tribunal regional alemão bota por terra e põe em ridículo o
relato do tribunal politizado espanhol que pretendeu transmitir um aviso a
navegantes dando-lhe um escarmento modélico aos catalães por intentar
questionar o sistema de dominação que lhes foi imposto polo decadente régime de
transição de 1978.
É
uma indecência e uma obscenidade que, tendo em conta estes dados, os políticos
unionistas saiam em tromba para exortar a que se cumpram as normas do estado de
direito, se temos em conta que estas normas foram ditadas polos estes mesmos políticos
para poder controlar o poder judicial em benefício próprio. Que diriam as
demais equipas os se os árbitros de futbolo fossem elegidos polo Madrid e
Barcelona e tivessem que atuar de acordo com normas redigidas por estes mesmos
clubes e por acima lhe vinhessem dizendo que há que acatar as normas que eles
impõem as demais?
Estes
políticos catalãos foram encausados intencionadamente por um tribunal radicado
em Madrid, por uns feitos ocorridos em Catalunha e controlado polos políticos
unionistas, quando deveriam, em todo caso, ser encausados polo Tribunal Superior
de Justiça de Catalunha, como lhe correspondia polo lugar de radicação dos
feitos, como fez a justiça alemã, que atuou com a máxima pulcritude e
independência, ao tempo que a justiça espanhola atuou de acordo com os
interesses dos políticos unionistas, e, portanto, na Espanha em modo algum se
pode dizer que exista uma autêntica separação de poderes. É um disenho de
justiça traçado polo poder político em aras do controle dos indivíduos e dos
povos em vez de ser expressão da sua participação livre e democrática.
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