Corria o ano 1833 quando, a
imitação da divisão departamental francesa, por decreto de 30/11/1833 o
ministro no governo de Cea Bermudez, o afrancesado granadino Javier de Burgos
cria a divisão territorial de Espanha em 49 províncias. O reino da Galiza
desapareceria como tal para converter-se nas províncias de A Corunha, Lugo,
Ourense e Pontevedra. Os Reinos perdem qualquer poder real e o poder real passa
a subdelegados provinciais do ministério de Fomento a quem lhe exporão as
necessidades da província para que desde Madrid decidam e executem o que cumpre
fazer. A reação contra esta divisão territorial não se fez esperar e em 1846
surge na Galiza o provincialismo, para defender a entidade da Galiza como
entidade de seu.
Com motivo da pandemia do
coroavirus o governo de Sánchez decide decretar o estado de alarma no estado
espanhol, e centralizar as competências que vinham desempenhando as conselharias
de sanidade e interior das CCAA e as concelharias dos municípios. A motivação
para fazê-lo é muito semelhante ao que passou em 1833: a consideração de quem
realmente sabe é eficaz para gerir os assuntos públicos, especialmente se têm
alguma dificuldade, são os políticos residentes na capital do reino, supomos
que com o apoio do Bourbon que por algo é descendente de Felipe V, que já
pretendeu reduzir a diversidade de língua, usos e costumes dos diversos reinos
à língua, usos e costumes de Castela tão louváveis e plausíveis em todo o
universo, tomando como modelo o jacobiniso francês.
Os juristas praticamente
coincidem em que o decreto de alarma é, como mínimo, duvidosamente constitucional,
porque não está pensado para uma pandemia que afete a todo pais e sem data
clara de caducidade. O estado de alarma decretou-se ao amparo da lei
orgânica 4/1981, de 1 de junho, que no
artigo 11 estatui que nele se poderão "a) Limitar a circulação ou permanência de
pessoas ou veículos em horas e lugares determinados, ou condicioná-las ao
cumprimento de certos requisitos”,
ou seja que não está contemplado nela uma suspensão dos direitos de
mobilidade com caráter geral e em todo tempo e lugar, suspensão que se vai
prolongando por etapas, mas sem que se determine com precisão qual vai ser todo
o recorrido, além que se lhe detrai o direito dos povos ao seu autogoverno sem
causa justificada. Ao mesmo tempo o governo de Espanha aproveita este estado
para legislar por decreto, o qual dá motivo para desconfiar de que esta é a sua
verdadeira intenção.
Muitos
juristas pensam que, em realidade, o governo decretou um estado de exceção
encoberto, pois este sim que permite limitar direitos fundamentais tanto individuais
como dos povos, se bem só durante 60 dias e com prévia justificação do que se
pretende fazer, mas tem o inconveniente de que está reservado para problemas de
alteração da ordem pública, que neste caso não se dá. A conclusão de vários
juristas é que não existe uma disposição jurídica, como em tantos outros casos,
para tratar um problema desta índole.
Além
da vertente jurídica existe a vertente política. Era estritamente necessário
decretar um estado de alarma? Parece que não; de facto, um estado descentralizado
como Alemanha e também os EEUU não decretaram nenhum estado de alarma nem nada
equiparável, pois nestes países quem tomaram a iniciativa foram os länder e os
diversos estados. A Alemanha foi-lhe muito melhor que a Espanha, pois a
percentagem de mortos sobre os contagiados foi muito menor. A EEUU não lhe foi
bem, mas Trump em vez de ajudar contribuiu a expandir a pandemia. Na Espanha,
porque não se deixou atuar às CCAA depois de fixar, se se quer, claramente
entre todos os critérios de atuação? Era conveniente que o governo de Sánchez
se expusesse a semelhante desgaste só por manter o prurido de que Madrid manda?
Mas creio que é já uma clara provocação propor a desescalada por províncias,
ressuscitando o velho jacobinismo francês, antítese do que defendem os
nacionalistas e do que figurava no projeto de constituição de 1978, em vez de
deixar que fossem as CCAA as que decidem por estar mais perto da realidade,
irando os nacionalistas que o ajudam a governar.
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