Idéias e princípios fulcrais fundamentadores da ideologia política de Castelao
Castelao foi uma
pessoa dotada duma grande sensibilidade humana, social, ética e estética, com
uma grande dose de altruísmo e empatia com os humildes, os doentes e os
marginados. Esta sensibilidade tem a sua tradução também na sua obra política,
sempre ao serviço dos desfavorecidos e excluídos social e politicamente, sejam
indivíduos ou povos.
Além desta
sensibilidade pessoal, Castelao fundamentou a sua luta pola libertação política
de Galiza numa série de conceitos ou idéias força, idéias fulcrais que subjazem
na racionalização do seu posicionamento político.
As idéias que
apresentamos são muitas vezes as que não se explicitam ou se faz somente de
passada, mais entendemos que subjazem e servem de fundamento ás demais. São próximas ás que
Ortega chamava idéias crença.
I.-
Antropológico-culturais
1.- O ser humano e os povos
1.1.- O ser humano e os animais
1.2.- O humano é um ser situado
1.3.- As pessoas como seres livres
1.4.- Necessidade da igualdade
1.5.- Pessoas individuais e coletivas
1.6.- A personalidade nacional da
Galiza
2.- A força frênica e simpática
3.- A diversidade : variedade e uniformidade
II.-
Ético-culturais
1.- Castelao como encarnação dum ideal
ético
2.- O fato diferencial e o fato
hegemônico
3.- O humano deve rebelar-se contra a
injustiça
4.- Direitos dos indivíduos e dos povos
5.- Direitos de Galiza como nação
6.- Deveres dos galegos
7.- As estruturas políticas devem
adequar-se ás realidades sociais naturais
III.-
Ético-políticos
1.- Ética e democracia
2.- Ética e política
3.- A escravatura
3.1.-
Escravatura socioeconômica de Galiza
3.2.- Escravatura política galega
3.3.- Escravatura cultural
3.4.- Libertação dos povos da
escravatura
3.5.- Libertação da Galiza
4.- A legitimidade
5.- A guerra
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Tem afirmado algum
professor de filosofia da USC que Castelao não tinha uma filosofia mas que
estava uma filosofia. Realmente surpreendeu-me pois toda pessoa está numa
filosofia e se bem é certo que não explicitou um saber crítico e reflexivo
sobre teoria do conhecimento e cosmologia, si que o fez sobre antropologia,
ética e política, que é o que algumas correntes filosóficas consideram nos nossos dia que deve constituir
o tema prioritário da filosofia. Se a um autor, como Platão ou Ortega lhe
amputamos os aspectos sociopolíticos da sua obra fica bem pouco. As suas
estampas foram as que melhor captaram o modo de ser dos galegos e as suas
reflexões éticas-políticas, alem de nas estampas, aparecem refletidas no Sempre
en Galiza e em diversas colaborações em jornais e revistas e nas suas
intervenções em comícios e eventos de caráter sócio-políticos. Tem, por tanto,
uma ponderada reflexão e, por conseguinte, destes temas.
I.- Antropológico-culturais
1.- O ser humano e os povos
1.1.- O ser humano e os animais
O home é superior
ao animal porque fabrica aparelhos. “O home é suscetível de progresso e os
animais não. Um burro de hoje é idêntico a um burro de faz mil anos e a um
burro de dentro de mil anos. O home não, porque tem uma inteligência superior.
Os animais que voam é porque têm asas; mas nós inventamos o avião e voamos”1.
É surpreendente a semelhança desta proposição com a de Ortega e Gasset: “Indemonstrada
como está a tese evolucionista, qualquer que seja a sua probabilidade, cabe
dizer que o tigre de hoje não é mais nem menos tigre que o de faz mil anos:
estrea o ser tigre. Mas o indivíduo humano não estrea a humanidade. Encontra
desde logo na sua circunstância outros homes e a sociedade que entre eles se
produz”2.
Tanto Ortega como Castelao desenvolveram estas teses num momento em que a etologia
estava nos seus começos, mas hoje falar da existência de cultura nos animais é
um lugar comum. O ser humano nasce imerso num mundo de hábitos, normas e
tradições culturais que foram criadas polas gerações que nos precederam, mas
algo parecido se pode dizer dos animais mais elevados na escala filogenética,
especialmente dos chimpanzés. Os animais também são capazes de inventar novos
costumes e impor tradições nas suas manadas, que podem ser copiados por grupos
vizinhos, e, neste sentido, também eles progridem, por ter uma cultura, embora dum nível inferior ao ser
humano, como é óbvio. Os mencionados animais atuam por vezes de acordo a
costumes socialmente aceitados, introduzem mudanças em certas condutas que
podem ser privativas duma determinada colônia, que depois são imitadas polos
demais membros do grupo, ex.: lavar patacas antes de comê-las; usam e fabricam
ocasionalmente úteis, etc. Como di Barash, "a cultura não é exclusiva
da nossa espécie. Os pequenos pássaros carvoeiros da Grã Bretanha, por exemplo,
aprenderam rapidamente que podiam beber a manteiga das botelhas de leite
perfurando os tapões. Aginha se desenvolveu entre estes pássaros a tradição de
seguir os leiteiros para cair sobre as botelhas depositadas á porta das casas
antes de que aparecessem os seus donos. As ratas aprenderam a evitar os engodos
envenenados, e os esquios a pelar landras, sem que tivesse lugar nenhuma
evolução biológica. Uma mona japonesa da espécie dos macacos revolucionou os
métodos de preparação dos alimentos introduzindo um novo costume que se
estendeu dum modo verdadeiramente lamarckiano entre todos os membros do grupo.
Iniciou a já famosa tradição de submergir os buniatos nas augas do oceano para
salgá-los. Noutra ocasião, esta mesma mona descobriu que podia separar os grãos
de trigo da areia botando-os á auga a punhados e recolhendo o trigo que
flutuava na superfície. Outros macacos japoneses imitaram este comportamento
sem que os seus genes experimentassem a mais mínima transformação"3.
Nos chimpanzés, a aprendizagem social constitui um elemento básico para a sua
supervivência. Não só usam úteis, senão que fabricam ferramentas e também se
servem de ferramentas para fabricar outras ferramentas.
Segundo Castelao,
as pessoas individuais, os homes, são superiores aos animais porque são capazes
de criar novas línguas, enquanto que os animais estão na língua universal4.
Por uma parte, o home deve acostumar-se a ter os pés pousados na terra,
esquecendo o seu afã de voar e de desprender-se dela, mas, por outra, não deve
rebaixar a grandeza humana, baseada na nossa inteligência superior, na nossa
sabedoria, ao nível animal.
1.2.- O humano é um ser situado
O humano não é uma
entidade abstrata, senão que é um ser situado numa determinada
circunstância coletiva. "Por isso queremos a liberdade, não somente
como seres humanos, senão como homes galegos, Bascos ou catalães, posto que não
podemos ser homes sem ser «Galegos», «Bascos», ou «Catalães»"5.
As personalidades coletivas nacionais também são concretos, enquanto que o
Estado espanhol é um vazio abstrato e não uma soma de concretos. “«Espanha ─disse-nos
João Viqueira é um vazio abstrato. Não é unha soma de concretos: Galiza, mais
Astúrias, mais Vascónia, mais Castela, mais Catalunya, mais outros países
espanhóis, mais... ¡quem sabe que mais! Espanha não é um feito; é algo que se
faz (algo que deve fazer-se, engado eu): ¡enxergue-se ao longe a federação
Ibérica! único jeito de trabalhar polos concretos que a formam, e dos que ela é
─como dizem os matemáticos─ uma função»”6.
1.3.- As pessoas como seres livres
Estampa de Castelao |
Para Castelao,
tanto as pessoas individuais como as coletivas são seres livres. Neste sentido,
faz sua, em abril de 1945, "a voz dum galeguista da nova promoção"
que lhe escreve: "O nosso movimento baseia-se fundamentalmente numa
aspiração de liberdade"8, o qual implica o rejeitamento de
toda forma de submissão, escravatura ou colonização, tanto a nível individual
como a nível coletivo. Mas não basta a liberdade que se lhe reconhece ao home
abstrato, como faz o liberalismo, porque nós não somos seres abstratos senão
seres enraizados numa realidade nacional. "Por isso queremos a
liberdade, não somente como seres humanos, senão como homes galegos, porque não
seríamos homes sem ser galegos, ... já que ninguém pode ser home sem ser o que
realmente é"9. Conseqüente com isto, Castelao não
aceita o federalismo pregoado por alguns defensores do republicanismo, porque
"do jeito que eles concebem o federalismo ficaria Castela identificada com o Estado e nós
passaríamos a ser colônias do império castelhano"10. A liberdade dos
indivíduos -1945- deve complementar-se com a liberdade dos povos. “Nestas
condições, a liberdade dos homes, sem a correspondente liberdade dos
seres nacionais, desemboca fatalmente na desagregação, e cai aginha no
desarranjo. ... Num território de tanta fundura histórica como Espanha,
composto de várias nacionaldiades, com idiomas e culturas diferentes, com
problemas vitais contrapostos e onde estão ativos, como vulcões, os fundos
insubornáveis de vários povos, afeitos a regerem-se por si mesmos-, não é
possível que a liberdade política dos homes, sem a correspondente liberdade dos
seus povos, conduza á paz democrática"11. Os direitos do
home foram proclamados depois duma longa aprendizagem da liberdade, mas dá
magoa que não se fizesse outro tanto com o direito dos povos, que seguem
ignorando-se ou conculcando-se dentro dos Estados europeus12
1.4.- Necesidade da igualdade
Estampa de Castelao |
Cumpre estabelecer
uma igualdade básica ante a lei tanto para os indivíduos como para os povos, o
qual implica uma democracia na que seja impossível o privilégio e a servidão.
Os democratas não podem aceitar mais que uma igualdade de direitos para os
cidadãos e para os povos16. O regime de Estatutos está fundamentado
na desigualdade dos povos que mantém privilégios e servidões anacrônicas.
"A Constituição do 31 consagrou a igualdade dos homes e manteve a
desigualdade dos povos, cousa que não evita o desarranjo"17.
Esta desigualdade provém de que o regime de Estatutos, consagrado na
Constituição do 31, mantém a supremacia
do conjunto de povos castelhanos, que se erigem em donos do Estado,
convertendo-se em "povos de privilégio, porque acaparam a
soberania do conjunto espanhol, usam do
máximo poder e dispõem de garantias invioláveis, em quanto que os povos
não castelhanos se regeram por Estatutos indefensos, outorgados por graça do
Estado, e no melhor dos casos viverão como as minorias de qualquer organização
democrática"18. Já fizemos observar que mais que
privilégios duns povos sobre outros, cumpre falar de privilégios das
oligarquias e dos seus adláteres sobre os cidadãos em geral.
1.5.- Pessoas individuais e coletivas
Castelao traça um
paralelismo entre indivíduo e povo, entre as pessoas individuais e as pessoas
coletivas ou personalidades nacionais19. Os seres coletivos têm
uma personalidade que, no caso das nações, é uma personalidade nacional, que
têm um existir mais perfeito e perdurável que o do indivíduo20.
O político galego
não nos deu uma definição nem uma descrição ou caracterização da pessoa, e, por
conseguinte, o seu significado só pode albiscar-se dalgum jeito polo contexto
em que se utiliza a palavra. O que si aparece nele é uma nídia reafirmação das
personalidades coletivas e um constante confronto destas com as individuais,
entre os seres humanos e os povos. No campo do nacionalismo galego esse
paralelismo homes - povos já fora sublinhado por Murguia, que afirma que o home
tinha um destino que cumprir sobre a terra, cara ao que marchava "desde
o momento em que viram a luz, os indivíduos e os povos"21.
Compara aos povos com os organismos biológicos, "e parece que ao igual
do home, a infância e a senectude dos povos, têm traços comuns e parecem-se em extremo"22.
Castelao, no ano
1935, escreve: "porque em nome de Deus nem se pode afogar a livre
respiração do espírito dos homes nem se pode coutar o anseio dos povos que
lutam polo seu próprio ser"23. Em 1937, critica a
pretensão de que Castela fale em nome de todos os demais povos espanhóis,
alegando que: "Estamos fartos de imperialismos e os democratas não
podemos aceitar mais que uma igualdade de direitos para os cidadãos e para os
povos"24. No ano 1943, critica a República porque
regalava liberdades aos homes intolerantes e frente aos povos mantinha-se
usurpadora e absorvente25. Igualmente neste ano afirma: "Todos
sabemos em que vai parar a fachenda dos homes e dos povos"26;
Se "o indivíduo tem direito a preservar a sua alma, que é a sua
liberdade, não cremos que o Estado poda exigir-lhe a um povo o que não deve
exigir-lhes aos indivíduos que o compôem"27. Neste mesmo ano
1943 opina que se a soberania tem limites ante os direitos naturais da pessoa
humana, também deve tê-los ante os direitos naturais dos grupos diferenciados,
ou seja, das nacionalidades28. A Constituição estabeleceu garantias do
home frente ao home e ao Estado, mas esqueceu-se de organizar as garantias das
regiões frente ás outras e ao Estado. A soberania do home deve refletir-se num
poder do Estado, a Câmara de Representantes ou o Congresso, e a soberania das nações deve refletir-se num segundo poder
do Estado, a Câmara das Nacionalidades ou Senado29. No ano 1947
escreve que as idéias totalitárias, que vêm inflando os Estados, só podem
evitar-se com a liberdade e transigência dos homes e dos povos30,
que atuam ambos guiados por um anseio de liberdade, que faz que nunca prefiram
ser escravos a serem livres31.
Os povos estão, a respeito dos seus direitos, em pior situação que os
cidadans32, e não ha democracia completa onde os povos não sejam tão
sujeitos de direitos como são os homes33. O federalismo tem a
fragilidade dos sistemas democráticos, quando nem os homes nem os povos querem
ser transigentes34. Por influxo da diversidade, que impõe a
tolerância e a transigência, faz-se conservador e, do hábito de viver em paz,
propende-se a uma maior harmonia nas relações exteriores. "Nem que
dizer tem que o federalismo necessita um poder central forte e fortes
autonomias para os homes e os povos"35. Tendo em conta as
continuas frustrações que produziu o sistema unitário, não se compreende que
haja espanhóis que pecham os olhos ao federalismo, tendo em conta que o amor á
independência é a razão de ser de todos os homes e povos de Espanha36.
Disse-se que o federalismo deu contido doutrinal ao sentimento de galeguidade,
mas a livre união dos homes e dos povos está no nosso mais íntimo modo de ser37.
1.6.- A personalidade nacional da Galiza
Estampa de Castelao |
A personalidade
intransferível de Galiza manifesta-se "na sua morfologia social e
econômica, na seu direito consuetudinário e, por ende, democrático, na sua
língua, na sua cultura e, também, na sua vontade de existir, manifestada a
través de muitos séculos e ultimamente no plebiscito autonomista do dia 28 de
junho de 1936 e num segundo plebiscito: o plebiscito trágico de muitos, muitos
miles de mártires. E os galegos não seríamos leais com nós mesmos se
para proclamar-nos espanhóis e republicanos olvidáramos o fato diferencial da
nossa Terra.»"51.
Os anarquistas
sabem, diz em 1937- que não ha homes livres em povos que carecem de liberdade e
estão autorizados a reconhecer a personalidade nacional de Galicia52,
condição imprescindível, junto com a liberdade, para que poda celebrar-se um
pacto federal53. A consciência de Galiza ressurge de novo
no século XVIII54, produzindo-se na guerra da independência
um afã impreciso de reconstrução política da personalidade galega55,
que foi exaltada polo movimento literário56, e durante a guerra surgiu
potente pola vontade dos galegos leais57. O nosso país é uma Terra
pequena mas se a sua personalidade é um fato, resplandecerá na alma dos seus
filhos58. A unidade galega foi esnaquizada polo sistema
provincialista e carecia de personalidade para reclamar o que em justiça se nos
devia59.
Um escritor
português advertiu-nos que vale muito mais uma irrecusável soberania do
espírito que uma precária soberania política, mas isto só estaria justificado
se concebêssemos o galeguismo como um mero degoiro de bem-estar econômico e
esquecêramos a recuperação da nossa personalidade espiritual60.
A linguagem esmorece pola imposição duma língua estranha á personalidade
afetiva dum povo61, sendo a consciência da própria
personalidade a garantia moral que Galiza oferece para merecer a liberdade62.
As três nações -Catalunya, Euskadi e Galiza-, conservam, diz em 1940- os
atributos tradicionais da sua personalidade e a consciência da sua
diferenciação em carne viva, mas não têm o mesmo recordo das instituições
perdidas porque não foram avassaladas ao mesmo tempo63.
Os políticos
galegos sempre se submeteram á disciplina dos partidos estatais para fazerem
carreira em Madrid e para os governantes de Espanha, monárquicos ou
republicanos, nós aparecíamos como gente mansa e julgando impossível um
movimento separatista na nossa Terra, desvalorizavam as nossas demandas. Não se
podia crer que Galiza reclamara um Estatuto autonômico. "¡Não faltava
mais que também os galegos quisessem falar a sua língua, pretenderam reger-se
por leis próprias e reclamaram respeito para a sua personalidade!"64.
2.- A força frênica e simpática
Segundo Castelao,
tanto o coração humano como a sociedade contam com duas forças contrárias e
complementárias, ambas necessárias para produzir um funcionamento harmônico:
a frênica e a simpática. “Se a um
coração lhe cortamos o nervo frênico o coração volver-se-ia louco; mas se lhe
cortamos o nervo simpático, paralizar-se-ia. Só a união destas duas forças faz
possível a regularidade do movimentos e a ordem em que se desenvolve a vida dos
seres. Assim a sociedade não pode desenvolver-se pola ação única da força simpática
nem sequer pola sua ação predominante, porque as revoluções sangrentas
significam uma crise da ordem e são estados patológicos da sociedade,
passageiros porque a sociedade não morre. Tampouco a sociedade se desenvolve
pola ação única da força frênica nem
pola sua ação predominante, porque sem a constante ação revolucionária a
sociedade estancar-se-ia na sua evolução e corromper-se-ia. Só na união das
duas forças descansa o progresso humano”65.
3.- A diversidade: variedade e uniformidade
Em 1934, faz um
canto á variedade e critica o uniformismo. "Quatro séculos de política
centralista causaram a decadência e a ruína de Espanha, rebaixando-a á
categoria de potência secundária e
subordinada"66. O uniformismo e a igualdade que apetecem
alguns só se logra com a morte67.
No ano 1938,
Castelao critica a Azanha e aos republicanos espanhóis por considerar que estão
cegos "porque não querem aceitar a variedade de Espanha e vivem
teimosamente aferrados á idéia de unidade que no fundo vem ser o afã
imperialista de Castela"68, mas Espanha não é uma
unidade nacional, não é uma nação69.
Segundo Castelao,
desprezar a variedade espanhola, equivale a desprezar o autêntico ser de Espanha, porque lá "a
variedade é tão natural, tão rica, tão admirável, que de povo a povo até o pão varia de
forma, de substância e de sabor, e como o pão varia a carne e o espírito dos
homes. Não é certo, não, que Espanha seja única e indivisível, e de aí provêm
os perigos de desintegração quando o Poder se concentra numa província, numa
cidade, num home"70. Os espanhóis respeitam a Portugal porque se
separou de Espanha, mas “só respeitariam a Galiza, Catalunya e Euskadi quando
nos separemos deles. Polo visto é necessário que nos separemos politicamente
para que se respeite a nossa diferenciação natural”71.
Espanha é um país
composto de várias nacionalidades, com idiomas e culturas diferentes, "com
problemas vitais contrapostos e onde estão ativos, como vulcões, os fundos
insubornáveis de vários povos, afeitos a regerem-se por si mesmos"72. A variedade
legislativa -di Castelao em 1945- nivela os avanços universais enquanto que a
lei única produz os desníveis socioeconômicos que desacreditam a democracia e
provocam a ditadura73. Por conseguinte, a lei também tem que
ser vária como são várias as suas realidades nacionais74.
A uniformidade só
se logra com a morte e o lema da Revolução Francesa: «A liberdade, a igualdade
e a fraternidade», são termos antitéticos, pois a existência da liberdade
impede a igualdade, mas as lutas asseguram o ascenso cara a perfeição na que
será possível a fraternidade75. A respeitabilidade da variedade
contrapõe-se á ânsia uniformista, que é
inútil, e o cordo resulta aceitar as nossas diferenças e as nossas lutas.
"Não ha mais que um sol para todos; mas este sol único faz negros em
África e loiros em Escandinávia, dá palmeiras em Cuba e abetos na Suíça. Podiam
dizer todas as Constituições do mundo: «Queda proibida a existência dos
negros», e até se podiam matar todos os seres desta raça; mas surgiriam outra
vez. Aceitemos as realidades que não podemos abolir e respeitemos as que,
podendo ser abolidas, foram criadas pola nossa natural condição. Eu creio que o
mais respeitável é a variedade, porque nela reside a origem da ascensão humana
a Deus"76.
A serpente aconselhou-nos que fôssemos deuses e que não
nos conformássemos com viver na caótica e informe ánima multitudinária, senão
que ansiemos a nossa superação. O home, expulsado do Paraíso por não querer ser
animal, abriu caminhos, alumiou riquezas, criou culturas e civilizações, e
ainda hoje está mui longe do fito terminal. "A variedade de culturas,
de línguas, de modos de viver e de pensar, são elementos de superação, e pola
luta que impôem -a vezes sangrenta e dolorosa como partos- imos-nos afastando
do Paraíso bíblico"77.
Em dezembro de
1945, Castelao reproduz umas palavras de Murguia acerca da sua concepção da
diversidade natural de Espanha dentro da unidade, que comenta do seguinte
jeito: "Estas palavras parecem dirigidas aos progenitores do
totalitarismo que hoje reina em Espanha; mas eu reproduzo-as e dirijo-as, com
toda intenção, a certos republicanos expatriados, que coincidem com Franco no
desejo de afogar a diversidade natural de Espanha"78.
II.- Ético-culturais
1.- Castelao como encarnação dum ideal ético
Estampa, por Castelao |
Fernández del Riego
sustém que em Castelao ha um elemento substantivo que é a sua fé, uma fé pura.
"Um respeito á inteligência, um senso da dignidade humana, um culto á
liberdade serviram-lhe de estribilhada a todas as suas criações. Ele
pôde rir de muitas cousas, mas também ha muitas que foi o primeiro em defender
como um vigia insone. Nele ha uma ética,
uma estrutura moral"80. Sublinha também a
generosa indignação de moralista e a acertada caracterização moral das suas
personagens. "O leitor inteligente da obra de Castelao reconhece
mesmamente nela talentos consideráveis e uma generosa indignação de moralista
social, tanto na pintura dos fatos como na captação dos traços mais expressivos
de cada personagem. Outra particularidade singularizadora do autor é o seu tino
pra batizar as suas criaturas com as notas mais ajeitadas e reveladoras da sua
fisionomia moral"81.
O seu curmão,
Alfredo Somoza manifesta que vê "ao Castelao político, levador do nosso
povo, lutando sem arreios e sem descanso polo cumprimento dos direitos de Galiza
e, quando contra toda razão lhe não são dados, marcando com o seu fino talento
o caminho que deve segui-la galeguidade, a Terra nossa, para conquistar ser
dona de si". ... por arriba do artista, do orador, do filósofo, sobre todo
eu ponho a Castelao home, a Castelao humano, ao Castelao que atesourava a
melhor virtude que se pode atesourar: a bondade. Que isso foi
essencialmente Castelao: um home bom, um home de bem, fraterno, afetivo, com um
coração que lhe rebousava da caixa do peito para solagar com a sua
prodigalidade cordial a quantos se chegavam a ele a lhe pedir justiça ou ajuda
qualquer, e que como ninguém podia repetr os versos do nosso Curros: "Que
eu pra querer nasci todo caído, para dar a mão a todo desgraçado"82.
A obra de Castelao,
salvo a publicada em Vida
Gallega, é fundamentalmente uma obra de caráter ético. As
suas estampas são um grito contra a injustiça, miséria, opressão, marginação,
sofrimento, caciquismo, exploração, emigração, etc. e ao serviço dos humildes e
dos trabalhadores, especialmente labregos e marinheiros. A sua obra
nacionalista é um canto a favor da liberdade dos povos que estão submetidos ou
são explorados por outros, um canto a favor da maioria de idade das personalidades coletivas e da
dignidade das pessoas que formam parte dum povo diferenciado, ou, em palavras
suas, uma contribuição ao despertar da alma de Galicia83.
Os seus debuxos da
primeira mocidade, como ele lhe chama, pretendiam fazer rir, divertir, mais ele vai renegar
desta arte frívola que qualifica de humorismo de taberna, para optar por uma
arte que pretende desacougar as gentes de bom viver e despertar a consciência
coletiva do povo galego mediante a representação dos fundos sentimentos e das
fundas angústias que invadem aos homes, especialmente aos que sofrem, e, desta
arte, modificar os sentimentos humanos para que se inclinem a pôrr remédio a situações sangrentas e injustas. É,
pois, uma arte comprometida ao serviço dum ideal ético, pois "o
pessimismo pode ser libertador quando desperta carragens e cobiças duma vida
mais limpa"84. Neste sentido, a ele não lhe interessava
cantar as alegrias das nossas festas nem a fartura dos casamentos, senão "as
tremendas angustias do decotio labrego e marinheiro"85.
A sua própria vida
é a realização dum ideal ético, expressado numa conduta limpa e honrada, uma
grande força de vontade, o combate e superação das mágoas e da adversidade, o
amor e a opção polos pobres e os débeis -labregos, marinheiros, negros, cegos,
mulheres, meninos-, a crítica constante da intolerância, abuso e hipocrisia;
uma entrega e lealdade total a uma Terra que sofre, vítima da exploração e
marginação; uma luta sem cessar pola recuperação da dignidade coletiva, ...
Como di Ramóm Pinheiro, "a sua vida foi um exemplo moral de lealdade á
Terra"86.
Era um home duma
bondade natural que, segundo Otero Pedrayo, "não tinha realidade do
mal, por isso chorava quando o mal era verdadeiro e não se podia negar"87. Havia nele, segundo Otero Pedrayo, "um
sentimento de amor pola desgraça e o morrer mais semelhante com os outonos
galegos"88. Mas, ao mesmo tempo, rebelava-se com
grande contundência contra a injustiça, sem aceitar nenhuma classe de apanhos,
conveniências ou comodidades. O seu humor, como di Carlos Balinhas, não se recriou com o meramente festivo senão que
"foi direto ao eterno humano e, quando não, ao que sente o povo,
concretamente o campesino e o pescador da sua terra"89.
2.- O fato diferencial e o fato hegemônico
No ano 1937 estima
Castelao que a existência diferenciada de Galiza, a través de tantos erros e
misérias históricas, prova que do chão galego surge uma energia incoercível, capaz de fazer-nos imortais90,
e manifesta que renega da história porque o fato diferencial de Galiza já
supera, na consciência e na vontade política dos galegos de hoje, todos os
fatos registrados na sua história91. O caráter diferencial da
«região» galega está, segundo ele, reconhecida polos mais acreditados geógrafos92.
Os políticos
republicanos transigiram com o «fato diferencial» de Catalunya e isso obrigou-nos
a outras transigências mas representavam a Espanha única e indivissível93.
"Catalunya, Euskadi e Galiza defendem os «fatos diferenciais» de
Espanha, é dizer, as liberdades anteriores a todo despotismo; mas Castela e os
seus povos satélites, defendem o «fato hegemônico» que é a matriz de toda
tirania e, por ende, do «totalitarismo» que agora impera ali"94.
Conviria matizar que o fato diferencial não se pode reduzir ás liberdades
políticas de que gozava Espanha com anterioridade aos borbons principalmente,
senão que nele se inclui a língua, morfologia social, clima, relevo, recursos
naturais, ... que já existiam com anterioridade ao que ele chama despotismo.
Este fato diferencial não se pode medir só polo resultado dum referendo popular95.
"O resultado do referendo autonômico -80 por cento em Euskadi, 75 em
Catalunya e 73 em Galiza- estivo em relação inversa com o tempo que transcorreu
desde que perderam as próprias instituições de autogoverno. "O País
Vasco era um «fato diferencial» impulsado pola memória; Catalunya era um «fato»
baseado na vontade; Galiza era um «fato» criado pola inteligência e impulsado
pola imaxinação"96. Euskadi supera no «fato da vontade» á
Catalunya e á Galiza97. Ninguém pode negar a personalidade
sentimental e profunda de Catalunya, anterior ao «fato da vontade» e superior
ás contingências da política. E nisto Galiza é um povo igual a Catalunya98.
Estas teorizações de Castelao conviria que as tiver concretizado mais para
poder valorá-las com rigor.
Castelao defende o
fato diferencial de Castela, Catalunya, Euskadi e Galiza, mas opõe-se ao fato
hegemônico de Castela99, exercido por golfos e senhoritos100
e servido impudicamente por todos os investigadores do Centro de Espanha salvo
Menéndez Pelayo101, que põem o interesse da nação castelhana
por riba do interesse de Espanha102, e que mantém o
ressentimento de Catalunya, Euskadi e Galiza103, porque o seu
fato diferencial está bem garantido polo Estado espanhol, que é a fórmula
imperialista de Castela104. Abundou o romanticismo para que
renascessem as línguas de Catalunya e Galiza e detrás desse renascimento vieram
os fatos diferenciais com toda uma série de problemas105.
Os senhoritos e intelectuais aos que alude Castelao não são os que impulsam o
processo da centralização socioeconômica e política senão os favorecidos e
apologistas que se aproveitam dela. Os verdadeiros impulsores dessa
concentração de recursos e poder de decisão são as elites oligárquicas
espanholas, que também controlam os mecanismos de Estado em benefício próprio.
Os seres
inominados, as ánimas sem nome foram os que criaram o fato diferencial de
Galicia106. Agora -1947-, o galeguismo não é patrimônio de nenhum
partido senão que pertence a todas as forças democráticas, salvo ás que não
querem reconhecer o fato diferencial de Galiza107. Ao carecer
Galiza de orgãos de poder estatal que impulsassem o seu desenvolvimento, todo o
que aqui se fez tocante ao fato diferencial e, por tanto, no relativo a língua,
cultura, formas de assentamento sobre o terreno, exploração de recursos, ...
tivo que ser protagonizado polo povo. A defesa deste fato diferencial ainda que
teoricamente está aberta a todos, porém somente as formações políticas
galeguistas ou nacionalistas são as que o reconhecem e assumem e, por tanto,
deve ser patrimônio delas. As forças espanholistas têm como patrimônio o fato
diferencial espanhol mais não o galego que não assumem. Na Galiza os políticos
espanholistas são os que mais insistem em que a língua galega é patrimônio de
todos e não dos nacionalistas, para, a seguir, ignorá-la, marginá-la,
desprezá-la.
Aos castelhanos,
acometê-los-ia a carragem se o fato diferencial de Catalunya se lhes impusesse
como fato hegemônico108. Em 1943, critica aos republicanos
espanhóis porque não são capazes de estabelecer um plano de reorganização
política para presentar ao povo no momento do retorno a Espanha, alegando que
ali é onde se podem alcançar soluções
ajeitadas mediante a expressão da vontade popular, esquecendo que os
exilados temos direito a pôr-nos de acordo para levar a Espanha um plano bem
meditado capaz de merecer a aprovação popular, mas o que mais temem os
republicanos é o referente aos fatos diferenciais e á estruturação do Estado de
manhá109. Castelao queria que os exilados se pusessem de acordo num
plano que tivesse o consenso das forças políticas antes de submetê-lo á
aprovação popular, porque se bem é o povo quem decide, não o faz no vazio senão
que ha que apresentar-lhe propostas para que poda pronunciar-se sobre elas.
Frente ao seu posicionamento contrapõe o dos republicanos espanhóis que querem
adiar o pronunciamento sobre os fatos diferenciais a uma consulta popular. Os
republicanos castelhanos não foram capazes de confiar ao livre jogo das várias
línguas e culturas espanholas a consagração do fato hegemônico de Castela,
senão que cumpria matar por asfixia todo quanto não fosse castelhano110.
A tirania atual de Castela reduz os fatos diferenciais a um silêncio rancoroso
da consciência, muito mais perigoso para o Estado que as arengas
«nacionalistas»111. Como já temos dito mais vezes quem
controla o poder e impõe as suas condições de domínio socioeconômico e
político, não é o abstrato Castela, senão as elites oligárquicas espanholas,
que são as que chucham os recursos da cidadania em benefício próprio, valendo-se,
como instrumento, dos mecanismos do estado.
Castela e Aragon
formaram a nacionalidade central que conseguira a hegemonia política de
Espanha, "mas nem os cegos deixam de ver os fatos diferenciais que
compõem a periferia da Península e rodeiam a Castela"112.
O fato hegemônico castelhano foi favorecido polo arredamento de Portugal113,
mas a restauração do fato cultural e diferencial galáico - português
esvairia qualquer perigo de invasão e
absorção114. "Só por uma fachenda, que é
consubstancial com a decadência de Castela, se pode aspirar â confiscação dos
fatos diferenciais, em vez de fomentá-los e harmonizá-los como componentes
veneráveis do acervo comum"115. Os fatos diferenciais
estavam so a tutela do fato hegemônico castelhano e os galegos, por sermos
diferentes, subsistíamos com permissão de Castela116. Nos tempos de
Murguia e Risco aceitaríamos a fusão numa das quatro províncias galegas e a
Mancomunidade das Deputações provinciais para que o nome de Galicia soasse de
novo. O reconhecimento do fato galego dar-nos-ia aços para novas demandas no
futuro117.
Em fevereiro de
1946, Castelao expõe a história do imperialismo político e eclesiástico a que
estivo submetida Galiza, e afirma que como a nação que sofreu mais perverso
rigor e o povo que mais se diferencia de Castela, é Galiza "não
cremos que seja vá esta lição de história, que damos aos que fingem
ignorar o fato galego"118.
Em 1947, afirma que
a eclosão do fato hegemônico de Castela se produziu num campo previamente
arrasado e só as leis da genética poderiam explicar-nos o fato hegemônico de
Castela e o apagamento biológico em que agora jaz119.
3.- O humano deve rebelar-se contra a injustiça
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Debuxo, por Castelao |
4.- Direitos dos indivíduos e dos povos
Castelao
estabelecia um confronto entre a personalidade individual e a personalidade
coletiva, e considerava que ao igual que existe a escravatura individual também
existe a escravatura dos povos122, e do mesmo jeito que
não se pode tolerar a escravatura individual tampouco se pode tolerar a
escravatura coletiva. Por conseguinte, quando se trata da felicidade e salvação
da pátria, pode impor-se ainda em contra da vontade do próprio povo, ao igual que
se abole a escravatura individual contra a vontade do próprio indivíduo.
Considera Castelao que pode surgir um novo refinamento moral que acabe com a
submissão duns povos por parte doutros, ao igual que os moralistas do século
XIX se puseram de acordo em abolir a propriedade duns indivíduos sobre outros.
"pois se os moralistas e legisladores do século XIX se puseram de
acordo para abolirem a propriedade dos homes sobre os homes é lógico esperar
que uma nova moral política acabe algum dia
com a propriedade dos povos"123.
Uma democracia
plena exige que se respeitem os direitos coletivos. "Por isso estimamos
que não ha democracia completa onde os povos não sejam tão sujeitos de direito
como são os homes"124. As nações pertencem á
ordem natural enquanto que os Estados pertencem á ordem política, tendo, por
conseguinte, aquelas direitos preferentes sobre as instituições estatais e
estas têm que proteger e salvaguardar os citados direitos, nunca conculcá-los.
"Pertencendo as nações á ordem natural -hoje reconhecidas como seres
vivos, espiritualmente formados no decurso de muitas centúrias-, não é justo
que se sigam violando e torturando, so pretexto de agrandar os Estados, que só
devem ser o complemento externo das nações"125. Observa
Castelao que em América os fatos políticos só delinqüem quando não se respeita
a vontade dos seus habitantes, mas que em Europa cumpre consultar os
antecedentes de cada grupo territorial. Esta afirmação de Castelao não deixa de
ser surpreendente, pois parece implicar que como a prática política americana
diverge da Européia, em América não haveria que consultar ás realidades étnicas
e cumpriria com o respeito dos direitos individuais, o qual seria totalmente inadmissível.
O paralelismo entre
indivíduos e povos leva-o a lamentar o desigual reconhecimento que alcançaram
ambos direitos nos países europeus. "Por isso dá mágoa ver que se os
direitos do home foram proclamados depois duma longa e dolorosa aprendizagem da
liberdade, não se fizesse outro tanto com os direitos da nação natural, que
seguem ignorando-se ou trafulcando-se dentro dos Estados europeus"126. A
liberdade dos indivíduos, sem a correspondente liberdade dos povos, desemboca
na desagregação e cai aginha no desarranjo127. Não "é possível
que a liberdade política dos homes, sem a correspondente liberdade dos seus
povos, conduza á paz democrática"128. A
liberdade não é possível sem democracia, e a democracia, em Espanha, só é
viável num sistema republicano. A República só pode assegurar a liberdade
federando os povos espanhóis numa unidade harmônica na que todos tenham igual
participação129. O centralismo nivela, limita, mistura e
faz-se materialista, enquanto que o federalismo "repousa sobre o
compromisso, a lealdade, a transigência, a moderação e é, polo tanto, de índole
moral"130.
A imoralidade preside a política internacional,
que estabelece hierarquias entre os estados segundo sejam grandes ou pequenos,
mas "ainda cumpre insistir sobre a irritante desigualdade que sofrem os
povos dum mesmo Estado, pois bem ás claras se vê que ha grupos senhores e
grupos servos dentro das organizações que se têm por mais civilizadas"131.
5.- Direitos da nação galega
Deixamos para outra
entrega a explicitação do que Castelao entende por nação e aqui cingir-nos-emos
a falar dos direitos que lhe correspondem. Em 1937, manifesta o rianjeiro que
Estatuto deve organizar o nosso país reconhecendo a personalidade jurídica da
paróquia132, porque não se concebe uma administração
galega sem conceder personalidade jurídica e administrativa á paróquia rural133.
O município é uma entidade monstruosa e a autonomia não se deve conceder mais
que ás pessoas verdadeiras, sejam individuais ou coletivas134,
e um organismo que pretende reavivar a personalidade de Galiza não pode
afincar-se em conglomerados fictícios que a desfiguram135.
Por tanto, para Castelao, ademais da personalidade nacional existe a
personalidade regional e dentro das nações do Estado espanhol -Catalunya,
Euskadi, Galiza e Castela-, existem regiões com personalidade sobrada para
serem merecentes duma autonomia político-administrativa, que dever ia outorgar-se-lhe sem regateios pola nação á
que pertencen136. Em tempos da República os deputados
abandonavam os interesses regionais quando não coincidiam com os da sua
província e o Governo nunca manifestou o propósito de restaurar a personalidade
administrativa das regiões senão que potenciou a divisão provincial137.
Se bem a Federação
espanhola -diz em 1940- já não se basearia
nos princípios vigentes em 1873, ainda "é doado aspirar a que se
respeite a personalidade natural dos povos e se garanta a paz interior por meio
duma democracia efetiva"138. Galiza é uma nação,
uma entidade coletiva que tem direitos inalienáveis, ao igual que os tem o
indivíduo. Dentro da sua concepção iusnaturalista, estes direitos naturais são
anteriores aos direitos positivos, que devem ser respeitados polos demais dum
jeito incondicional e garantidos polas leis. Em 1940 afirma Castelao que "as
nacionalidades espanholas, e inclusive as regiões, são fatos que ultrapassam a
vontade dos homes, porque surgem dos acidentes da terra e dos legados múltiplos
da tradição que lhes dão continuidade na história. E polo tanto as
nacionalidades e regiões espanholas têm um direito anterior e superior a
qualquer direito que os homes inventem"139. Galiza leva
suportado muitas injurias e calúnias desde que se uniu a Castela, a causa da
nossa excessiva generosidade e a nossa desmedida confiança. "Por isso
ao mesmo tempo que nós pedimos aos espanhóis uma estimação da nossa natural
personalidade, também pedimos aos galegos uma maior consciência do que
representam em Espanha e no mundo"140. Em 1942, numa
carta dirigida aos galeguistas, declara que Galiza é uma nação e como tal tem
soberania de seu. "A Nação galega tem, por ende, uma soberania natural
que não pode satisfazer-se com atribuições precárias e restringidas,
concedidas por graça do Estado unitário. ... Galiza, por ser Nação, tem direito
a federar-se com outros povos igualmente diferenciados, como também tem direito
a viver arredada"141.
Além de direitos,
Galiza tem, como dixo Vicente Risco, deveres para com o Estado mas são deveres
condicionados a que Espanha respeite a personalidade de Galiza e os seus
direitos naturais142. Nós oferecemos a nossa melhor vontade
para criar um Estado espanhol, autenticamente democrático, baseado nas
realidades nacionais, mas entretanto predomine o «ordeno e mando» de Castela,
os nacionalistas galegos "seguiremos exaltando a personalidade nacional
de Galiza e a vontade de lutar polos seus direitos, porque primeiro somos
galegos e depois espanhóis"143. Aos efeitos de
concordar um pacto federal não basta a personalidade exclusivamentehistórica,
porque não todos os povos com história própria alcançam agora a categoria de nacionalidades e, por conseguinte, estes
povos não têm direito a federarem-se144. Aragón, por exemplo,
tem uma xúrdia personalidade, mas ao incorporar-se ao pensamento unificador,
foi assimilada por Castela e hoje tem menos atributos que Andalucia145.
Portugal - 1943-
deve entrar na federação hispana, mas não a qualquer preço. A personalidade
histórica de Portugal, correu perigo ao pôr-se ao lado da potência absorvente
de Castela146. O número de membros federados deve
limitar-se ás "nacionalidades que souberam conservar a sua
personalidade histórica, a sua autonomia
moral, porque doutro modo, com o critério voluntarioso de antes,
veríamos ás regiões de raiz unitária organizar-se em regime autonômico, sem
senti-lo nem necessitá-lo, e ante uma Castela falsamente multiplicada, não só
romperiam os freios da federação, senão
que perdurariam as lutas intestinas. Quero dizer que de não aplicar-se a
doutrina das nacionalidades, quedaria em
pé a política iniciada polos reis absolutos"147.
Quando logremos o reconhecimento das nossas nacionalidades e dos seus direitos,
será possível atrair a Portugal a uma soberania
peninsular concertada que substitua á soberania única ostentada polos povos castelhanos148.
Os povos que
conservaram a sua personalidade nacional, como é o caso de Galicia, que conserva
todos os atributos duma autêntica
nacionalidade, têm o direito de autodeterminação149. O povo galego
foi educado para que renegue da sua personalidade, porque o ensino foi
organizado ao serviço do imperialismo de Castela, que soube resistir
conservando a herança dos seus maiores150. A autonomia permitiria cultivar os atributos da
personalidade de Galiza, neste momento puramente rústicos151.
A unidade da nossa personalidade, estivo representada pola Junta do Reino152.
Historicamente a satelitização a Zamora no voto em Cortes supôs uma míngua da
nossa personalidade oficial, que caiu especialmente sobre a nobreza galega153,
e foi abolida polo "pseudo-liberalismo espanhol -pior que o
absolutismo, no que se refere á autonomias coletivas"154,
mas que cumpre garantir nos Estados plurinacionais155.
Galiza é uma nação,
uma entidade coletiva que tem direitos inalienáveis, ao igual que os tem o
indivíduo. Dentro da sua concepção iusnaturalista, estes direitos naturais são
anteriores aos direitos positivos, que devem ser respeitados polos demais dum
jeito incondicional e garantidos polas leis.. Em 1943 manifesta que "se
a «soberania nacional» tem um limite
ante os direitos naturais da pessoa humana também deve tê-lo ante os direitos
naturais das chamadas «regiões»156, que são seres mais
perduráveis que o indivíduo"157. Uma nação, como ente
dotado de ser pleno, tem todos os direitos que lhe correspondem a um ser
coletivo, que não podem ser minguados por decisões do Estado, porque o que
afeta ás nações "deve ser questão exclusiva da sua vontade"158. A
pesar de fundamentar habitualmente os direitos das nações na natureza, também
aduz alguma vez argumentações tipicamente positivistas. Assim em 1943, afirma
que os políticos de hoje sabem que “as nacionalidades são objetos de obrigação
e sujeitos capacitados para reclamarem o self gobernment, porque o
princípio que os ampara constituiu a base doutrinal do Tratado de Versalhes,
fez-se axioma de Direito internacional e está afincado na consciência
democrática do mundo”159. O regime de Estatutos, carente de
garantias, é um sistema baseado "na desigualdade dos povos, que mantém
privilégios e servidõs anacrónicas"160.
6.- Deveres dos galegos
Os galegos têm o
dever de solucionar os problemas que tem posicionados a morfologia social e
econômica da nossa Terra e "não seria honroso alienar o nosso direito e
o nosso dever de resolvê-los, declarando-nos incapazes, ou aguardando a que os
alheios governem a nossa casa melhor que nós mesmos"161.
Têm o dever de solucionar o problema migratório, "Porque o nosso dever
está em assegurar o direito ao trabalho remunerado, para que nenhum irmão nosso
emigre por necessidade"162; também o problema
educativo. "Porque o nosso dever está em armar o povo duma instrução
primária, profissional e técnica, que lhe permita ser digno em todas partes, e
em todas partes topar as vantagens que se lhe oferecem a um inglês, a um
alemão..."163.
Para depois da
guerra, os galegos antifascistas no seio das suas organizações, têm o dever de
alentar o propósito federalista no caso de que se presente a ocasião de dar-lhe
á República uma estrutura federal164, de "proceder
como galegos, para salvar a nossa Terra da servidão econômica e tributária em
que se topa, para dignificar a vida do nosso povo e para cumprir a postrimeira
manda dos nossos mártires"165. Como galegos livres
temos o dever de reclamar o reconhecimento do que a Constituição republicana
estabelece a respeito do Estatuto de Autonomía166.
Galiza, por ser uma
nação, tem o direito e o dever de organizar-se autonomicamente167.
Os galegos não discutimos o direito de Galiza a ser uma nacionalidade senão só
os direitos que como tal lhe correspondem, pois Galiza já é uma nação, "e
exercemos um dever quando reclamamos esse direito"168.
Assume Castelao o pensamento de Risco a respeito dos deveres que lhe incumbem a
uma nação em prol da civilização universal. Temos deveres a respeito de
Espanha, que são deveres condicionais porque exigem que Espanha respeite os
direitos naturais da nação galega, e temos o dever nacional que nos obriga a
respeitar a tradição galega que se concretiza na fala, arte, pensamento,
direito e trabalho169.
Também aceita, já
em 1943, a
preeminência dos valores espirituais sobre os propriamente políticos, e ainda
que se pode ceder em parte destes até o ponto de ficar quase reduzida Galiza a
uma «região» não pode abdicar "um só ponto dos seus deveres morais, da
sua independência espiritual, porque é um ser vivo e não tem direito a
suicidar-se. Quando entramos na esfera do espírito (do nosso espírito)
sentimo-nos cada vez mais "nacionalistas", é dizer, mais arredados do
espírito de Castela"170. Todo nacionalista tem o
dever de ser intransigente "quando ve que a Galiza se lhe negam as
garantias que necessita para desenvolver livremente a sua cultura e elevá-la,
se pode, á categoria de civilização"171. Também na linha
de Risco não estipula que um nacionalista tem que ser intransigente quando se
negam os seus direitos políticos senão só os direitos referentes á esfera
espiritual.
Cada nacionalidade
espanhola -diz em 1943- só pode conseguir a sua paz, progresso, ordem e justiça
polo seu direito positivo, mais cumpre, para assegurar a efetividade estatal,
estabelecer os deveres "da liberdade regional em aras do ideal
solidário que o Estado necessita para a sua efetividade e grandeza"172. A
Constituição de 1931, foi respeitosa com os direitos dos indivíduos mais não
com os dos povos, e o que cumpre "é assentar a democracia hispana sobre
poderes eficazes e eletivos, coordenando os deveres e direitos da Liberdade,
tanto para os homes como para os seres coletivos. Queremos, em fim, uma Federação espanhola"173.
Galiza deve ter
partidos políticos próprios, pois uma “dependência dos elementos de Galiza a
chefaturas e disciplinas estranhas ao nosso país supôe a renúncia dos direitos
e deveres da liberdade que demandamos”174. Por conseguinte, em
princípio ha direitos que não se devem renunciar, frente a outros, entre os que
está a independência, que, porém, si são renunciáveis, sempre que polo menos se
estruture federalmente o Estado espanhol.
Os que vivem no
campo leal, a salvo das atrocidades cometidas polos rebeldes, também têm os
seus deveres. "Os que vivemos a salvo dos verdugos e gozamos de
liberdade, não podemos desouvir o mandado dos mortos, porque a sua voz ressoa
constantemente na nossa consciência, e temos que juntar-nos para cumprir o
nosso dever de galegos"175. O Estado também tem os
seus deveres. Entre eles, o de prestar os serviços públicos, como, por exemplo,
os caminhos de ferro176.
7.- As estruturas políticas devem adequar-se ás realidades sociais naturais
É necessário que as
estruturas políticas se adéqüem ás realidades sociais naturais, ás realidades
vivas do país177, e, por conseguinte, que o Estado
espanhol se estruture como Estado plurinacional. "Espanha não é
única e indivisível porque é plurinacional, e, por tanto, não
deve ser único e indivisível o seu poder político e a sua soberania"178. A
única indivisibilidade aceitável é a que resulte duma união pactuada, na que
"o poder integro do Estado seja exercido diretamente dentro de cada
nacionalidade polo seu governo próprio e sempre que a liberdade e autoridade
das nações unidas não poda ser jamais intervinda ou
mediatizada"179. Nestas condições, Galeuzca
renunciaria á soberania natural das suas nações em aras da grandeza
do Estado supranacional e do equilíbrio permanente de Espanha180.
Para Castelao o
valor superior está constituído polos nossos direitos e a vontade dos nosso
povo. Em aras disto, confessa ter atuado mais duma vez afora das normas
estabelecidas, atribuindo-se poderes que ninguém lhe conferiu181.
O pacto com os catalães e bascos, ao igual que as relações com entidades
estrangeiras, estão subordinados aos direitos e ao reconhecimento internacional
da nossa causa patriótica: "em quanto garantam o direito de Galiza e
identifiquem as suas ânsias com as nossas. Relação e colaboração com entidades
estrangeiras em quanto a nossa causa patriótica conquiste sona e crédito
internacional"182. No exílio de Bons Aires, solicita, para
depois da restauração republicana, a promulgação do Estatuto, prescindido da
decisão das Cortes, tal como estipula o artigo 12 da Constituição, porque a
legalidade deve submeter-se ao desejo do povo galego expressado no plebiscito
do 36, que consagrou o nosso direito á liberdade183.
III.- Ético-políticos
1.- Ética e democracia
Estampa, por Castelao |
Idéias semelhantes
serão explicitadas no discurso pronunciado por Castelao no comício da Corunha
de junho de 1936. "Porque um home, quando sabe que umas idéias podem
fazer ou produzir a felicidade do seu povo e a salvação da sua Pátria, não pode
abdicar jamais das possibilidades do triunfo, ainda que a violência sangrenta
da Pátria, lhe produza dor e enojo. Porque o home que tem fé nas idéias que
predica, não pode abandonar o seu posto de honor e de perigo quando chega o
momento de lutar. E mui cômodo, amigos e irmãos, fazer o que fazem alguns
galegos. Pertencem ao estilo de doutrinários que aguardam triunfar depois da
morte. que aguardam a que a posteridade os eleve, e que aguardam acaso
converter-se em estátuas de bronze para ocupar o centro dum jardim público.
Porque os homes que têm verdadeira fé nos ideais que predicam, durante toda a
sua vida, não podem de nenhuma maneira resignar-se a morrer sem vê-los realizados.
Eu digo-vos
(expondo-me a que se podam pôr em dúvida as minhas convicções liberais e
democráticas): Se um povo não pusesse interesse nas predicações, se o povo
rejeitasse o remédio magnífico que se lhe oferece pra conquistar a sua
felicidade, pergunto eu: ¿Haverá um home com fé nos seus ideais que não fizesse
o remédio, sabendo que tinha forças para tanto? Pois digo, com toda fé dum home
honrado, que tem 50 anos de vida limpa, (ilegível) como se poda e quando se
poda"185. Para entender estes textos de Castelao cumpre ter presente que não
sempre a vontade individual é considerada como norma legítima de atuação.
Assim, por exemplo, nas nossas sociedades não é válido um convênio no que um
trabalhador ceda os seus direitos laborais, e considera-se que esta normativa é
legítima e não infringe os direitos dos trabalhadores senão que os protege. O
Código Civil proíbe o matrimônio aos que padecem de impotência física perpetua
e incurável, aos ascendentes e descendentes por consangüinidade ou afinidade,
aos pais adotantes com o adotado, etc. ¿É lícita uma lei que proíba a ablação sexual feminina nos países
em que se cultiva esta prática? ¿Pode legitimamente impor-se o voto feminino,
ainda em contra do sentir das próprias mulheres? ¿Pode decretar-se a abolição
da escravatura individual, independentemente da opinião dos que padecem esta
prática? Sustém Stuart Milh que "um compromisso polo que uma pessoa se
comprometesse a ser vendida como escrava seria
nulo e sem nenhum valor; nem a lei nem a opinião imporiam o seu
cumprimento. ... O motivo para não intervir nas ações voluntárias dum o
indivíduo (a menos que seja em benefício doutra pessoa) estriba no respeito ou
consideração da sua liberdade. A sua eleição por ser voluntária, prova que o
que ele elege é desejável, ou polo menos suportável, para ele, e depois de todo
não ha modo melhor de assegurar a ninguém a sua dita que o de permitir-lhe que
eleja o que deseja. Mas, ao vender-se como escravo, um home abdica da sua
liberdade. Destrói, pois, no seu próprio caso, a razão pola qual lhe era
permitido dispor livremente da sua pessoa. E não só deixará de ser livre, senão
que, desde então, permanecerá numa posição que presumivelmente já não será do
seu agrado e que, por tanto, terá deixado de ser voluntária. O princípio de
liberdade não pode exigir em nenhum caso que se seja livre para não sê-lo. Não
é liberdade o poder alienar a liberdade própria"186.
Em janeiro de 1946,
em resposta á carta que lhe remitira Dolores Ibarruri propondo um plebiscito
para que o povo se pronuncie sobre o regime em que quer viver e governar-se,
Castelao rejeita a consulta ao povo para saber se quer seguir submetido ou
viver em liberdade. "Neste caso o plebiscito entranharia uma ofensa
para os arquitetos da paz futura, se é que buscamos a sua autorização e o seu
apoio, ou revelaria uma indignidade pola nossa parte, se só pretendemos
coincidir com os supostos desejos de qualquer grande potência, pois, em boa
lei, não se trata de averiguar se Espanha quer ou não quer viver
na escravatura, para comprazê-la no seu gosto. Trata-se de salvá-la da
escravatura, queira-o ela ou não o queira, pois outra cousa
equivaleria a uma estafa autorizada
polos próprios estafados, ou a um ardil claudicante e indecoroso, que não
nos levaria mais que ao descrédito definitivo. ¿A quem imos enganar que não
poda enganar-nos? ¿Aceitaríamos nós a perpetuação duma tirania em Espanha,
ainda que assim o decidisse o povo espanhol, livre e democraticamente? Não
ha a quem enganar nem ha por que enganar-nos a nós mesmos"187.
2.- Ética e política
Estampa, por Castelao |
Também tem Castelao
uma concepção mui limitada em relação ao respeito que deve merecer a vontade
plebiscitada dos indivíduos, pois afirma que tem que ser respeitada no que se
refere á independência do seu gênio, refletida em cultura, língua e espírito
próprios, mas não no tocante a aspectos puramente políticos. Neste caso,
poderia "o Estado espanhol
opor-se aos separatismos políticos; mas baixo a condição de reconhecer a
sobrevivência dos seus vários grupos lingüísticos e culturais, como assim o
faziam os Estados civilizados antes da Revolução"192.
Castelao
posiciona-se o dilema entre duas alternativas a respeito da lei: Uma di que a
lei, para sê-lo de verdade, tem que ser promulgada por quem tenha poder abondo
para impô-la. A outra afirma que a verdadeira lei é a que o povo acata,
respeita e pratica como boa. No primeiro caso põe-se a autoridade detrás da
lei; no segundo põe-se a justiça diante da lei. “A mim parece-me que a lei
empurrada pola autoridade só pode ir cara a justiça, e que a lei que busca a
justiça necessita o motor da autoridade para impô-la aos que não queiram
acatá-la. ¿É justa uma lei só porque existe uma força para impô-la? Cairíamos
no caso das ditaduras. Mas ¿pode impor-se uma lei justa quando não se tem força
para impô-la? Cairíamos na confiança que inspira a moral, hoje decadente. A
melhor lei é a recopilada, quer dizer, aquela que se praticou como boa antes de
ser escrita... mas esta seria a lei
civil”193.
3.- A escravatura
Castelao tem uma
grande sensibilidade pola escravaturas, que afeta não só aos indivíduos senão
também aos povos, e do mesmo jeito que cumpre libertar aos indivíduos da
escravatura, igualmente ha que fazê-lo como os povos.
3.1.- Escravatura socioeconômica de Galiza
Existe, em primeiro
lugar, uma escravatura socioeconômica, que na nossa Terra se traduz no fato de
que os labregos galegos são “donos dum anaquinho de propriedade e vivem
escravizados polo fisco e avassalados polo cacique”194,
ao igual que os famentos estremenhos vivem escravizados polos rendistas195.
Os nossos labregos são donos da sua casa, terra e trabalho, e vale mais ser
escravo da terra que ser escravo do terratenente, como lhes sucede aos
estremenhos196; em Galiza o labrego é escravo da terra
que trabalha devido á sua excessiva parcelação provocada polo centralismo197.
Depois do apoio dos nobres galegos á causa da Beltraneja, "o povo
galego sofria paulinhas, misérias, ultrajes e escravatura, para pagar uma
rebeldia que só fora rebeldia dos seus senhores"198.
Em 1937 manifesta
que se um vento de exaltação patrioteira chegar a pôr em perigo as
possibilidades que a vigente Constituição nos oferece, nos deveríamos atuar
como galegos "para salvar a nossa Terra da servidão econômica e
tributária em que se topa, para dignificar a vida do nosso povo e para cumprir
a postrimeira manda dos nossos mártires"199.
Com os Reis
Católicos produziu-se um esvaimento da nossa personalidade. O povo fez uma revolução
prematura, mas não soube que fazer com a vitoria e ficou mais escravizado que
antes200.
Se os galegos
antifascistas, sobreviventes da tragédia espanhola, não nos mobilizamos para levar pão e dignidade aos nossos fogares
afastados, Galiza seguirá sendo uma pobre moreia de províncias espanholas com
quatro monifates á frente e a comédia duma vida oficial desenvolvendo-se sobre
o pano de fundo duma terra escrava201. Precisamos um governo a
caróm do povo que poda resolver os seus problemas. "Liberada Catalunya
e o País Basco quedaríamos perdidos num regime comum que sobrecargaria a nossa escravatura tributária, sem poder nem
estímulos para abrir novas fontes de riqueza"202.
Em 1937, os seis
estados danubianos promoveram uma União Econômica aberta aos demais países
europeus. O home singelo ouvia falar dos inconvenientes do livre câmbio e quiçá
lhe dissessem que assim se rebaixaria o
seu nível de vida, mas "a este home o que mais lhe doía era ver a homes livres trabalhando em
territórios escravos"203.
A emigração não é
devida só á pobreza, pois se assim fosse outros povos espanhóis emigrariam mais
que nós, pois têm mais necessidades, miséria e escravatura204.
Os castelhanos "sofrem miséria e escravatura por não arredarem-se da
família, dos colchões, dos pucheiros, dos barranhõess, das tijolas e do gato"205.
Galiza não tinha
representação nas Cortes de Castela e pagava o que acordasse Zamora, e “em
vez de independizar-se pagou o voto em Cortes e caiu em escravatura tributária”206.
Em 1625, Felipe IV, outorga-nos o voto em Cortes, depois de 275 anos de injusta
confiscação, como um privilégio, quando foi comprado a preço de ladrões por cem
mil ducados. A gente labrega sofria avassalamento moral e material das
congregações de Valhadolid; o povo labrego, absolutamente analfabeto, com o
absentismo dos grandes senhores e a impossibilidade de criar uma elite, andava
ás baroutas. "E foi nestas condições de vida que Galiza renunciou a
lutar pola sua independência, â beira de Portugal e Catalunya, cuidando que com
voto em Cortes deixava de ser escrava"207. Galiza
contribuiu, tanto em homes como com dinheiro, comparativamente com as demais
regiões, em excesso sobre o que recebia. "Em fin; a relação que temos
diante dos olhos rematava com um balanço demonstrativo da nossa servidão. No
lado dos serviços especiais e de exceção, feitos á Coroa de Castela, figuram
estas duas cifras:
Homes:
68.000
Ducados:
18.191.000
E no lado dos
favores que Galiza recebera da Coroa de Castela, em prêmio da sua generosidade,
só figuram estas verbas cangadas de triste ironia:
Mercedes: as que o
Reino de Galicia e os seus naturais esperam receber da grandeza da Sua
Majestade"208. Se bem, Castelao reconhece que não é possível
concretizar numericamente a servidão de Galiza. "Por falha de
estadísticas a jeito não é possível aquilatar em números precisos a servidão
econômica de Galiza; mas é doado crer que a realidade exceda a todos os
cômputos que se fizeran"209. Castelao considera ter
demonstrado, ainda depois da recuperação do voto em Cortes, a servidão
econômico-fiscal de Galiza e a nulidade das suas liberdades políticas210.
3.2.- Escravatura política galega
A solução para o
problema espanhol reside na igualdade dos povos. "Os galegos sempre
pensamos em resolver os problemas privativos de Galiza dentro do Estado
espanhol, dentro duma Espanha que seja, por igual, o acorro de todos os povos
peninsulares, sem privilégios nem servidões"211.
Depois da primeira revolução irmandinha, de 1431, na que as tropas reais e
episcopais finaram com a revolução, morre Andrade o mau, e sucede-lhe o seu
filho, que era pior. Isto deu como resultado que "os seus vassalos
-vencidos e apouvigados- tiveram que submeter-se a uma escravatura mais dura
que a de antes"212.
A segunda revolução irmandinha teve lugar no ano 1467, e
nela o grosso da Irmandade foi vencida polo conde de Caminha. "Nem que
dizer tem que os pecheiros galegos volveram a um estado de servidão e
escravatura, muito mais duro que antes do levantamento, vendo-se obrigados a
erguerem as casas e muros que derrubaram"213.
Do reinado de
Isabel I, Castelao afirma, por uma parte, que Galiza não era serva de Castela
senão membro aderido214, mas, pola outra, que não é certo que os
Reis Católicos abatessem a tirania dos senhores feudais coa intenção de assegurar
a paz de Galicia, porque a paz só podia chegar-lhe polo caminho da liberdade.
"Não era possível a emancipação do povo galego - do proletariado,
diríamos hoje- quando Galiza caia em escravatura, governada e explorada por
estrangeiros"215. Galicia historicamente foi tratada como
uma colônia e não como uma parte de Espanha. Os Reis Católicos, para evitar
novas rebeldias, esterilizaram as entranhas de Galicia, com a deportação dos
senhores feudais. "O primeiro que fizeram foi levarem a Castela,
furtando-lho a Galiza, todo quanto significava riqueza, valimento e poderio.
Para submeter-nos á triste condição de país protegido convinha não
deixar lá mais que uma informe massa de servos"216.
Ao instalar-se na Corte, medrou neles o afã de suntuosidade, montando as suas
novas casas com um luxo desmedido, a custa, claro está, dos pobres servos
galegos217.
Esta colonização
foi continuada polos Áustrias. "A Casa de Áustria recebera em herança
dos Reis Católicos o antigo Reino de Galiza, como se fosse uma colônia de
selvagens amansados, só ata para obedecer. A prova da nossa escravatura está em
que carecíamos de representação em Cortes, tendo-a os demais reinos"218.
Durante os Áustrias tem lugar a colonização de Galiza, com as suas seqüelas de
espoliação e conseqüente empobrecimento. "Galiza, em
troques, passou da fartura á miséria, da liberdade á escravatura, do ser ao não
ser"219. Felipe III negou-se a conceder-lhe a
Galiza o voto em Cortes, provocando uma míngua da nossa personalidade oficial.
Neste tempo o povo "começava a sofrer o terrível complexo de
inferioridade, que ainda hoje pesa sobre alguns galegos e que provém da secular
escravatura em que vivemos"220.
O Estatuto de
Autonomia, ainda que cousa precária e insuficiente, implicava o reconhecimento
jurídico de Galiza como região diferente, e não era cordo desaproveitar a
oportunidade que a República nos oferecia, mas só pode ser aceitado com caráter
transitório, "pois qualquer instituição galega, que não surja da
própria, soberania, implicará subordinação, dependência e escravatura"221,
e quando um povo é escravo também o são os seus habitantes por mais que
disponham de liberdades formais, pois "não ha homes livres em povos
esclavos"222.
O primeiro período
da nossa escravatura política foi o compreendido entre Isabel I e Felipe IV223.
Os reparos que se lhe fazem a Castela não vão além do que reclama a dignidade
de galegos para que podamos chamar-nos espanhóis. "Pensamos como
Branhas:
Os de Castela são
castelhanos,
Os de Galiza
galegos são;
Mas não somos, como
espanhóis,
Nem eles amos nem
servos nós"224.
A imoralidade
preside a política internacional e os Estados mantêm diferenças hierárquicas
segundo sejam grandes ou pequenos, ricos ou pobres, mas Castelao considera
ainda mais irritante que nos Estados plurinacionais, os povos sigam a sofrer
uma irritante desigualdade. "Mas ainda cumpre insistir sobre a
irritante desigualdade que sofrem os povos dum mesmo Estado, pois bem ás claras
se vê que ha grupos senhores e grupos servos dentro das organizações que se têm
por mais civilizadas"225. Salvo o caso de Suíça,
não fica na Europa ocidental nenhuma sociedade baseada no direito igual dos
povos.
3.3.- Escravatura cultural
Estampa, por Castelao |
Castelao é
partidário de fixar uma língua internacional de comunicação e considera que o
obstáculo para chegarmos a ela é a ambição de quatro ou cinco línguas que
pugnam por chegar á hegemonia cultural do mundo, o qual vai unido ás ânsias de
predomínio, "é dizer, de submetimento e escravatura dos povos débeis"229. A
escravatura da língua produz o encolhimento do nosso ânimo e, por tanto, é
justo que os galegos superiores falem e escrevam a língua do povo e que não
consintam que a língua do povo seja escrava no pátrio lar, sem direito a ir á
escola, igual que o castelhano230.
3.4.- Libertação dos povos da escravatura
Castelao é
consciente em 1940 de que as modernas nacionalidades acabam de ressuscitar, e
considera que os povos já não terão que volver á sepultura. Os "povos
não volverão a serem escravos dos povos nem propriedade particular dos
príncipes"231. Se o moralista e o legislador se
pusessem de acordo para que o home deixe de ser escravo do home, “justo será
uma nova moral política que evite a escravatura entre povos”232.
Muitas vezes, os
povos afazem-se á sua servidão, mas isto não significa que se deixem assimilar
e que a unidade política arrase fatalmente a diversidade natural233.
Não tratamos de converter os povos pequenos em estados civis independentes,
para vê-los depois escravos doutros povos mais fortes, senão que a solução
consiste em associar-se com outros, sacrificando parte da própria soberania,
para formar um grande Estado comum, para "defender a sua vida, manter a
sua liberdade, garantir o seu desenvolvimento econômico, afirmar a sua unidade
social e promover o bem de todos"234. Cumpre constituir um
Estado regido pola mais pura democracia, fundada na liberdade, “onde seja
impossível o privilégio e a servidão”235.
As gentes de
antanho submetiam-se ao despotismo dos reis para fugir das tiranias feudais,
mas "nunca se véu que os povos e os homes prefiram ser escravos a serem
livres, e sempre volvem das passadas equivocações, empurrados polo
anseio de liberdade. Está visto que uma nação natural, mesmo escrava e em
trance de agonia, tarda tantos séculos em fenecer como séculos necessitou para
formar-se, de modo que a política uniformista resulta um mal negócio para quem
a pratica"236.
Ainda no regime
federal ha que manter-se alerta para não ficar plenamente escravizado. "Em
quanto á desconfiança em que os povos federados devem manter-se, não está de
mais lembrar um poema de Walt Whitman, dirigido aos grupos autônomos do seu
pais: «Com a obediência indiscutida vem aginha o ficar plenamente escravizado.
-Uma vez plenamente escravizado, já não ha Nação nem Estado, -ainda que depois
se recupere a liberdade»"237.
3.5.- Libertação da Galiza
Castelao foi um
home consagrado a uma causa: a libertação da nossa terra, e toda a sua obra é,
em palavras de Basílio Losada, uma "obsessão por dar com um caminho de
redenção para o seu povo"238. Não se propôs cantar as
nossas festas e romarias, as alegrias do povo galego, por considerá-lo
improcedente na situação de opressão em que se encontrava. Assim, quando lhe
perguntaram: "«-¿Por que razão você debuxa sempre uma Galicia trágica e
pobre?» E dizem que respondeu:
«-Por uma razão mui
singela; ¡É que eu não tenho vocação de estupefaciente»"239. O nosso povo, os
seus direitos coletivos, a sua libertação nacional vão constituir os eixos do
seu pensamento e da sua atividade prática diária. Di Otero Pedrayo que Castelao
considerou a Galiza "esquecida, náufraga, cruelmente tratada, e
impôs-se o dever de erguê-la, promessa feita nesses altares da adolescência,
juramento que cravado leva em si pena e castigo de alma perdida"240.
Segundo Isaac Díaz Pardo, "sendo tão importante e genial a sua obra
ainda resulta mais impressionante a sua conduta moral ... Pola sua luta contra
todas as formas de injustiça e a favor dos povos marginados, entre eles os
negros, a Federação Mundial de Sociedades de Color nomea-o presidente de honor
em 1939"241. Ramóm Pinheiro considera que a sua
personalidade artística era inata mas uma qualidade da sua pessoa "foi
desenvolvendo-se como traço caracteriológico mui firme: a sua consciência
moral"242. Castelao pôs a sua arte ao serviço do
seu ideal, produzindo as suas estampas uma forte impressão tanto pola qualidade
artística como "pola força incisiva da denúncia moral e política que
transcendia de cada uma das suas
estampas"243. Não só a sua conduta pessoal senão a
orientação de toda a sua actividade profissional, política, artística e
literária244, estão motivadas fundamentalmente por um
impulso ético. A luta contra a injustiça, emigração, miséria, caciquismo,
submissão de Galiza, foi o verdadeiro leit motiv da sua obra. Como se di em Nueva Galicia,
"a sua atuação de muitos anos, verdadeiramente evangelizadora,
encaminhada á redenção de Galicia, oprimida baixo a monarquia polo seu centralismo absurdo, são bem
conhecidos polas colônias galegas de América"245.
A finalidade da sua
obra não é puramente a criação artística nem a consecução da fama e do êxito,
senão que é uma finalidade ética: o serviço e melhora das pessoas tanto
individuais como coletivas, e como a nação e o povo galego são escravos de
poderes alheios, o seu labor propugna a sua libertação sem traumas e a
restauração dos seus sinais de identidade para que poda levar uma vida digna.
Neste sentido, a falta de reconhecimento para a língua galega é uma injustiça e
uma desigualdade246 e a imposição do espanhol, um ato de
assimilação e de hostilidade247. O galeguismo é
simplesmente um caso de dignidade coletiva em prol da supressão da miséria dos
labregos e marinheiros248. O desprezo da língua materna significa
uma renúncia de direitos e provém duma anestesia da dignidade coletiva249.
A sua atividade
política tinha como norte um ideal ético: a libertação da escravatura de
Galicia, a superação da doma e castração da nossa Terra e a recuperação dos
direitos coletivos do nosso povo. Os Estados só podem ser órgãos proveitosos da
humanidade se aprendem a respeitar aos povos que os integram, ou seja, se
cumprem um ideal ético. Não basta com respeitar os direitos individuais senão
que cumpre respeitar também os direitos coletivos "Lá deixaríamos
sentado que os Estados só poderão converter-se em órgãos proveitosos da
humanidade quando tenham aprendido a respeitar por igual a todos os seus povos,
pois mal poderia cooperar lealmente a
uma harmonia supra-estatal quem não sabe
ou não quer harmonizar a sua própria diversidade, e de passo advertiríamos aos
federalistas lá reunidos, que a Espanha unitária e centralista jamais
seria digna de ingressar numa União
Européia, ainda que chegasse a reorganizar o seu Estado de acordo aos direitos
do home, proclamados em Filadélfia e Paris, pois nós -os bascos, catalães e
galegos- queremos ser livres de verdade e não comungamos com superstições
políticas"250. Segundo Castelao, os povos nasceram
diversos mas têm igual direito á vida e á liberdade, mas enquanto os direitos
do indivíduo foram reconhecidos, não aconteceu igual com os dos povos, que
"estão hoje em pior condição que os cidadãos, pois estes, polo menos,
consolam-se com a lembrança dos seus direitos consagrados em Filadélfia e Paris"251.
4.- A legitimidade
Para Castelao, o
Goberno Giral deve ser acatado como legítimo, ainda que, polo momento,
duvidemos da sua eficácia. A eficácia prima sobre a legitimidade252,
e, por conseguinte, cumpre proceder á sua ampliação, para dar cabida a todas as
forças democráticas, até que seja plenamente representativo. A justiça prima
sobre a legalidade. Estas manifestações são mui problemáticas porque a doutrina
da subordinação da legitimidade á eficácia é uma permanente fonte de conflitos
e poderia sempre ser aduzida para impor governos ilegítimos por parte de
ditadores. Os galegos necessitam um organismo para equiparar-se aos bascos e
catalães, “falar com eles de igual e igual, pois se isto não se pode fazer
no terreno legal, pode-se fazer no terreno da justiça”253.
Reconhece, pois, que a constituição dum
governo para Galiza, o Conselho de Galiza, não estava amparado pola legalidade
mas si pola justiça, e acusa aos do interior de não tomá-lo em sério, como
agora não tomam em sério o Governo Giral. Por cima da democracia estão as
aspirações de bem-estar e de felicidade. A democracia, em geral, prima sobre a
ditadura, e Castelao proclama-se democrata a machamartelo, mas em aspetos
parciais a ditadura pode ser mais favorável aos interesses galegos. Um ditador
é sempre unitarista, mas o extraordinário é que uma democracia unitária -di em
abril de 1946- costuma cometer mais injustiças que uma ditadura, quando se
trata de comprazer a Galiza nas suas legítimas aspirações de bem-estar254.
5.- A guerra
A oposição de
Castelao á guerra não se documenta explicitamente ata os anos 1916-18, em que
elabora as estampas do álbum Nós. Na número 4, põe como pé á figura dum
velho pensativo, entristecido e vencido da vida, um texto que reflete a
sangrenta falta de reciprocidade dos poderes públicos ao sacrifício que fez
polo país: “Deu seu filho para Cuba e o seu neto para Melilha; mas agora não
tem quartos para pagar os tributos. Quedará sem chousa”. Numa segunda
estampa, de 5/07/1923, as reflexões de dous velhos paisanos expressam
sinteticamente a sem razão e incompreensão da guerra marroquina. Manifesta o
primeiro: “Mataram-me um filho em Marrocos e não sei porque ha guerra”,
e responde-lhe o segundo: “Políticos ha que che saberão responder”. Numa
derradeira, titulada «Espiritistas», uns velhos sentados em torno a uma mesa,
perguntam-lhe a um Espírito: “podes dizer-nos por que a guerra de
Marrocos?”, e o espírito responde-lhe: “Porque sois parvos”, pondo
assim de manifesto a improcedente submissão da cidadania ante uma imposição
arbitrária e impertinente duma guerra em benefício dos negócios da oligarquia.
O fator decisivo
nas guerras não são as máquinas senão o home. Por isto, a guerra civil
espanhola, a mais atroz que recordam os séculos, não será ganhada polos leais255.
A guerra civil espanhola, que no momento de surgir era inutilmente criminal, só
pôde ser precipitada por agentes estranhos Frente aos que falam de humanizar a
guerra256. Castelao pergunta: “¿Por que se fala de «humanizar a
guerra»? A guerra em si já é um crime coletivo e é ridículo falar de «crimes
humanizados». Nas guerras pode ser lícito todo se admitimos a licitude da
guerra; mas sem embargo devem marcar-se bem os limites no terreno do combate.
Pode-se admitir que «todo seja lícito» entre os combatentes ou entre gentes que
de antemão devam aceitar as conseqüências da guerra"257.
Não se pode matar a meninos nem bombardear povoações civis afastadas dos
frentes nem afundir barcos mercantes. “Pois bem: os bombardeios são cem
vezes piores e quando se utilizam numa guerra civil sem protestas da
consciência humana é preciso renegar já da espécie a que pertencemos”258.
A guerra espanhola,
Castelao foca-a desde dous pontos de vista. Para uns, refugiados na covardia
burguesa do século XIX, a guerra é um espetáculo desagradável e repugnante, com
demasiado sangue e crueldade. Para outros, a guerra é um espetáculo
extraordinário no que renasce o desprezo á vida e á morte. "Mas ninguém
sabe que Espanha luta pola paz e a vida e que só desafia á morte por uma causa sublime"259.
O que ocorre é que já não ha causas sublimes porque as superstições do
progresso são mais perniciosas que as superstições religiosas e já "ninguém
sabe pôr por em cima das riquezas materiais a imponderável riqueza do
espírito"260.
1. «Caderno A», em CASTELAO, Sempre en Galiza (CSG),
Parlamento de Galicia e Universidade de Santiago de Compostela, Santiago 1992, p. 822.
2. ORTEGA Y GASSET, La historia
como sistema, Espasa Calpe, Madrid, 1971, pp. 57-58.
3. BARASH, DAVID P., La liebre y
la tortuga, Salvat, Barcelona, 1987, p. 38.
4. CASTELAO, Sempre en Galiza,
(SG), Akal, Madrid, 1977, p. SG,
p. 43.
5. «Falemos en Lingoaxe Intelixible», em A
Nosa Terra (ANT), nº. 437 (00/04/1945),
p. 3.
6. SG, p. 254.
7. CASTELAO, Cadernos Escolma
1938-1948 (CCE), Galaxia, Vigo, 1993,
A 30, p. 121.
8. «Falemos en
Lingoaxe Intelixible», em ANT, nº. 437 (00/04/1945), p. 3. Cf. «La
posição ideológica de Galicia», em PE, p. 113.
9. «La posição
ideológica de Galicia», em PALMÁS, RICARDO, Prosa do exilio, (PE), Edicións do Patronato da
Cultura Galega, Montevideo, 1996, p. 113.
10. «1 de Xaneiro do 1942. Aos
Galeguistas», em Castelao. As Cartas
de América (CA),A Nosa Terra A Nosa Cultura, nº. 12, CA, p. 17.
11. «Falemos en Lingoaxe
Intelixible», em ANT, nº. 437 (00/04/1945), p. 3.
12. SG, p. 457.
13.
CASTELAO, Cadernos Escolma 1938-1948 (CCE), Galaxia, Vigo, 1993, A 85, p. 123.
14. CCE, A 5v, p. 123.
15. CCE, A 5v, p. 123.
16. SG, p. 101.
17. «Falemos en Lingoaxe
Intelixible», em ANT, nº. 437 (00/04/1945), p. 3.
18. «29 de Novembro do 1943. A José Antonio
Aguirre», em CA, p. 21.
19. «12 de xunho do 1944. A José Antonio
Aguirre», em CA, p. 33. Cf. «3 de Xaneiro do 1945. Carta a José Antonio
Aguirre», em CA, p. 40; SG, p. 216.
20. SG, p. 410.
21. MURGUÍA, MANUEL, «Discurso
Preliminar», Em Historia de Galicia, T. III, p. 4. Cf. p. 88.
22. MURGUÍA, MANUEL, «Discurso
Preliminar», em Historia de Galicia, T. III, p. 95.
23. SG, p. 24.
24. SG, p. 101.
25. SG, p. 319.
26. SG, p. 363.
27. SG, p. 366.
28. SG, p. 410.
29. SG, p. 410.
30. SG, p. 458.
31. SG, p. 459.
32. SG, p. 458.
33. SG, p. 459.
34. SG, p. 460.
35. SG, p. 462.
36. SG, p. 462.
37. SG, p. 468.
38. SG, p. 410.
39. SG, pp. 15, 16.
40. SG, p. 16. Ver tamén p. 57.
41. SG, p. 468.
42. SG, p. 18-
43. SG, p. 326.
44. SG, p. 326.
45. SG, p. 65.
46. SG, p. 27.
47. SG, p. 31.
48. SG, p. 54.
49. SG, p. 262.
50. SG, p. 67. Cf. "El bloqueo comercial de Galicia",
em PE, p. 149.
51. «Vervas no Stadium
Centenario», em PE, p. 67. Cf. tamén SG,
p. 420.
52. SG, p. 57.
53. SG, p. 57.
54. SG, p. 67.
55. SG, p. 67.
56. SG, p. 68.
57. SG, p. 150.
58. SG, p. 93.
59. SG, p. 100.
60. SG, p. 101.
61. SG, p. 104.
62. SG, p. 108. Ver tamén p. 179.
63. SG, p. 192.
64. SG, pp. 152-153.
65. CASTELAO, Cadernos Escolma (1938-1948), Galaxia,
Vigo, 1993, A
31-A 32, pp. 121-122.
66. C., «Crítica do idéiario político que se discutirá na
Asambleia de constitução do Partido de «Izquierda Republicana»», em ANT, nº. 328 (24/03/1934), p. 4.
67. «Caderno A», em CSG,
p. 816.
68. «Caderno A», em CSG,
p. 837.
69. «Caderno A», em CSG,
p. 838.
70. «Verbas no Stadium
Centenario», em PE, p. 68.
71. «Caderno B», em CSG,
p. 894.
72. «Falemos en lingoaxe
intelixible», em PE, pp. 99-100.
73. «La posição
ideológica de Galicia», em PE, p. 112.
74. .«La posição
ideológica de Galicia», em PE, p. 113.
75. «Idéias de un hombre de la calhe», em El Museo de
Pontevedra (MP) XL, Diputación de Pontevedra, Consejo Superior de
Investigaciones Científicas, Pontevedra 1986, p. 204.
76. «Idéias de un hombre de la calhe», em MP,
p. 204.
77. «Idéias de un hombre de la calhe», em MP, p.203.
78. «1889, “El Regionalismo Galhego” de Murguia»,
em PE, p. 122.
79. ALONSO
MONTERO, XESÚS, Castelao (CAS), Akal, Madrid, 1975, p. 26. Cf. tamén ALONSO
MONTERO, XESÚS, «Castelao y Galicia. 1916-1920», em CPD, p. 11.
80. SALVADOR LORENZANA, «Un arte, uma ética e un
estilo», em Grial, nº. 47, p. 39.
81. SALVADOR LORENZANA, «Nova presência de
Castelao», em BAG, xan. 1975, p. 70.
82. SOMOZA, ALFREDO, «O loitador caido», em ANT,
nº. 474, (25/07/1950), p. 23.
83. «Proyecto de Constitução», em CASTELAO, OTERO PEDRAYO, SUÁREZ
PICALLO, VILLAR PONTE, Discrusos Parlamentarios (1931-1933 (CDP),Ediciós
do Castro, Sada, 1978, p. 15.
84. TOBÍO, LOIS, «Os valores éticos
en Castelao», em Congreso
Castelao (CC), Universidade de Santiago de Compostela,
1989, p. 228.
85. TOBÍO, LOIS, «Os valores éticos
en Castelao», em CC, p. 228.
86. PINHEIRO, RAMÓN, «Castelao», em
Grial, nº. 111, xul-set., 1991, p. 370.
87. TOBÍO, LOIS, «Os valores éticos
en Castelao», em CC, p. 227. Cf. Grial, nº. 47, p. 2.
88. Grial, nº. 47, p. 1.
89. BALINHAS, CARLOS, «Castelao,
conciência de Galicia», em Revista de letras, Universidad de Puerto
Rico, 1971, p. 225.
90. SG, p. 35.
91. SG, p. 35.
92. SG, p. 44.
93. SG, p. 155.
94. SG, p. 199. Cf. CASTELAO, «A
liberdade», em PE, p. 61.
95. SG, p. 201.
96. SG, p. 202.
97. SG, p. 203.
98. SG, p. 203.
99. "A liberdade", em PE,
p. 61.
100. SG, p. 366.
101. SG, p. 287.
102. SG, p. 298.
103. SG, p. 296.
104. SG, p. 259.
105. SG, p. 280.
106. SG, p. 431.
107. SG, p. 435.
108. SG, p. 259.
109. SG, p. 256.
110. SG, p. 293.
111. SG, p. 296.
112. SG, p. 303.
113. SG, p. 341.
114. SG, p. 362.
115. SG, p. 365.
116. SG, p. 404.
117. SG, p. 404.
118. "No hay modo de
castelhanizar a Galicia", em PE, p. 140.
119. SG, p. 451.
120. SG, p. 240.
121. SG, p. 241.
122. SG, pp. 37, 67, 92,
186, 217, 229, 240, 246, 372, 390, 392, 393, 399, 407, 459.
123. SG, p. 456.
124. SG, p. 459.
125. SG, pp. 456-457.
126. SG, p. 457.
127. «Falemos en lingoaxe
intelixible», em PE, p. 99.
128. «Falemos en lingoaxe
intelixible», em PE, pp. 100, 101.
129. «Falemos en lingoaxe
intelixible», em PE, pp. 101-102.
130. SG, p. 460.
131. SG, p. 458.
132. SG, p. 95.
133. SG, p. 117 e 120.
134. SG, p. 117.
135. SG, p. 118.
136. SG, p. 206.
137. SG, p. 210.
138. SG, p. 222.
139. SG, p. 222.
140. SG, p. 237.
141. «1 de Xaneiro do
1942. Aos Galeguistas», em CA, p. 18.
142. SG, p. 291.
143. SG, p. 296.
144. SG, p. 323.
145. SG, p. 323.
146. SG, p. 339.
147. «La posição
ideológica de Galicia», em PE, p. 116.
148. «12 de Xunho do 1944. A José Antonio
Aguirre», em CA, p. 32.
149. «La posição
ideológica de Galicia», em PE, p. 114.
150. SG, p. 348.
151. SG, p. 360.
152. SG, p. 392.
153. SG, p. 393.
154. SG, p. 404.
155. SG, p. 411.
156. Em xunho de 1945, em vez de
regiões, alude a povos, seres coletivos, nacionalidades. («La posição
ideológica de Galicia», em PE, p. 112)
157. «29 de Novembro do 1943. A José Antonio
Aguirre», em CA, p. 21; Cf. "La posição ideológica de
Galicia", em PE, p. 112.
158. «29 de Novembro do 1943. A José Antonio
Aguirre», em CA, p. 21.
159. SG, p. 308.
160. «Falemos en Lingoaxe
Intelixible», em ANT, nº. 437 (00/04/1945), p. 3.
161. SG, p. 40.
162. SG, p. 42.
163. SG, p. 43.
164. SG, p. 60.
165. SG, p. 63.
166. SG, p. 86.
167. SG, p. 54.
168. SG, p. 290.
169. SG, p. 291.
170. SG, p. 292.
171. SG, p. 292.
172. SG, pp. 409-410.
173. SG, p. 411.
174. SG, p. 417.
175. SG, p. 91.
176. SG, p. 98.
177. SG, p. 72. Cf. SG, pp. 204, 211.
178. «29 de Novembro do 1943. A José Antonio
Aguirre», em CA, p. 21.
179. «12 e Xunho do 1944. A José Antonio
Aguirre», em CA, p. 29.
180. «12 e Xunho do 1944. A José Antonio
Aguirre», em CA, p. 29.
181. «6 de Setembro do 1939. Aos
irmáns de Bos Aires», em CA, p. 17.
182. «6 de Setembro do 1939. Aos
irmáns de Bos Aires», em CA, p. 17.
183. «29 de Novembro do 1943. A José Antonio
Aguirre», em CA, p. 20-21.
184. «Verbas de Chumbo», em ANT,
nº. 362 (20/04/1935), p. 1. Significativamente esta última frase desapareceu no
Sempre en Galiza, e, por conseguinte, pode pensar-se que representa uma
idéia abandonada por Castelao.
185. «O dicurso de Castelao no mitin
da Cruma», em ANT, nº. 420 (04/07/1936), p. 2.
186. STUART
MILH, JOHN, Sobre la libertad, Orbis, Barcelona, 1984, p. 116.
187. "Carta a Dolores
Ibarruri", em PE, p. 131.
188. SG, p. 11.
189. SG, p. 221.
190. SG, p. 442.
191. SG, p. 341.
192. SG, p. 443.
193. «Caderno A», em CSG, pp.
888-889.
194. SG, p.16.
195. SG, p.29.
196. SG, p.30.
197. SG, p.47.
198. SG, p.37.
199. SG, p. 63.
200. SG, p.67.
201. SG, p.92.
202. SG, p.186.
203. SG, p.217.
204. SG, p. 229-
205. SG, p. 230.
206. «Caderno B», em CSG, p.
897.
207. SG, p.399.
208. SG, p.402.
209. SG, p.415.
210. SG, p.404.
211. SG, p.365.
212. SG, p.369.
213. SG, p.370.
214. SG, p.310.
215. SG, p.372.
216. SG, p.378.
217. SG, p.379.
218. SG, p.390.
219. SG, p.392.
220. SG, p.393.
221. SG, pp. 403-404.
222. «A liberdade», em PE, p. 62. Cf. tamén «La posição
ideológica de Galicia», em PE, p. 112. Esta afirmação já fora formulada
por A. Vilhar Ponte em 1921 («Resposta a un e a moitos. Duas crases de
galeguistas», em ANT, nº. 144, (15/07/1921), p. 2.
223. SG, p.407.
224. SG, p.408.
225. SG, p. 458.
226. SG, p. 240.
227. SG, p.240.
228. SG, p. 240.
229. SG, p.246.
230. SG, p.285.
231. SG, p.217.
232. «Caderno A», em CSG, p.
890.
233. SG, p.459.
234. SG, p.459.
235. SG, p. 323.
236. SG, pp. 459-460.
237. SG, p.461.
238. LOSADA, BASILIO, «Castelao, o
la coherência», em Anthropos, nº. 65 (00/10/1986) p. 12.
239. ONH, p. 11. Díaz Pardo
sitúa esta contestação no contexto da exposição das suas estampas na Coruma.
(DÍAZ PARDO, ISAAC, «Castelao, artista», em Anthropos, nº. 65
(00/10/1986) p. 32)
240. OTERO PEDRAYO, RAMÓN, «Castelao
no seu espelho e amor», em
Opinión Galhega, nº. 147, xan. 1954, p. 1.
241. DÍAZ PARDO, ISAAC, «Castelao,
artista», em Anthropos», nº. 65 (00/10/1986) p. 33.
242. PINHEIRO, RAMÓN, «Castelao,
político», em Anthropos», nº. 65 (00/10/1986) p. 38.
243. PINHEIRO, RAMÓN, «Castelao,
político», em Anthropos», nº. 65 (00/10/1986) p. 39.
244. Como di Rodríguez Fer, "la intenção moralizadora es evidente en
buena parte de su obra, en la que critica todo tipo de injusticias e imposturas
y defiende una constante necesidad de cambio político y social". («Castelao como
escritor», em Anthropos, nº. 65 (00/10/1986) p. 37)
245. «Voceros de Galicia. Una
embajada espiritual y representativa», em CASTELAO, Verbas de Chumbo (NG),
nº. 46, (19/07/1938).
246. CDP, p. 16.
247. CDP, p. 16.
248. CDP, pp. 16-17.
249. CDP, p. 19.
250. Crónicas. Castelao y los vascos (CCV), Coord, Anasagasti, Ikatz
Ekintza, Bilbao, 1985, p. 502.
251. SG, p. 458.
252. «Carta a Dolores Ibarruri»,
(01/1946), em PE, p. 133.
253. «Carta ós galeguistas do
interior», (07/07/1946), em OCA, T. 6, p. 622.
254. "Historia Sintética do
autonomismo Galego", em PE, p. 163.
255. «Caderno A», em CSG, p.
807. Cf. Ibidem, p. 823.
256. SG, p. 200.
257. «Caderno A», em CSG, p.
811.
258. «Caderno A», em CSG, pp.
811-812.
259. «Caderno A», em CSG, p.
822.
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