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Papa Francisco |
Quando um contempla
o campo da história, não numa impossível viagem ao passado -Einstein dixit-
senão numa viagem do passado cara a nós, que panorama divisamos? Limitando o
nosso campo de vissão a certas calas, olhamos que as religiões do livro, quer
dizer, as que reclamam possuir livros inspirados pola mesma divindade, apesar
de que nada neles permita chegar a esta conclusão, parecem estar num estado de
decomposição, e concretamente o cristianismo, em bancarrota moral, lógica e
antropológica. Bancarrota moral, porque a moral cristão foi incapaz de
dotar-se duma ética que contribua á felicidade humana. O prazer e toda
felicidade neste mundo converteu-se em algo suspeitoso para ela, e aos que sofrem
e são despossuidos dum mínimo vital somente lhe ofereceu uma hipotética
felicidade no mundo do além. É uma ética que justificou e promoveu o
eunuquismo, principalmente o espiritual, a escravidão, a misoginia, a
homofobia, ... Constringiu a liberdade de pensamento coartando-a pola imposição
do terror numa atuação sintónica e sincrónica da espada e a cruz. Bancarrota
lógica porque intentou fechar a realidade em dogmas definitivos, perenes,
imutáveis, insensíveis incompreensíveis e insensíveis a qualquer câmbio
histórico, seja na sensibilidade, na ciência, na filosofia, na cultura, ... O
único recurso que são capazes de aduzir a respeito dos dogmas é que são um
mistério, esquecendo que foram propostos por seres humanos e com uma atuação
prioritária do poder político. Uma bancarrota antropológica porque em
vez de reconhecer e promover as potencialidades humanas, dotando-se dum
humanismo integral, desapossou ao ser humano da sua faceta sexual, com a falaz
pretensão de convertê-lo num anjo, e liberou a Deus de toda culpa, carregando a
responsabilidade do mal cósmico, tanto físico como moral, na criatura humana,
ficando assim convertido num demo. Em realidade, o humanismo cristão é somente
um anjo-teísmo-demonismo.
A misoginia cristã
deriva a sua origem do mito do pecado de Adão, mais tarde transmutado em pecado
original por obra de Santo Agostinho, que se utilizou historicamente para
degradar até limites incríveis a personalidade feminina. A mulher foi concebida
como um ser maligno que induziu a um ingênuo Adão a desobedecer os mandados
divinos, convertidos em mandados trampa para fazer recair sobre o ser humano a
responsabilidade do males que afligem á humanidade. Jesus era um home e elegeu
somente a homes como colaboradores. Dizia o misógino São Paulo que «mulieres in
eclessia taceant», que as mulheres na Igreja calem, convertendo-as em seres
mudos limitados a escutar aos homes na sua casa. Estas questões históricas de
fato, são suficientes para a Igreja para concluir que também deve ser questões
de iure e para apresentar uma doutrina moral e jurídica e moral que justifique
a superioridade do home sobre a mulher. Esta ilação lógica incorreta,
serviu-lhe a Bento XVI para afirmar que “por algo Deus se encarnou num home”,
que condensa toda a misoginia eclesial contra a mulher.
O rol histórico da
mulher na Igreja limitou-se a servir de companheira ao home no referente á
procriação, porque, como diz Tomás de Aquino, noutras cousas está melhor
ajudado por outros homes. A mulher, segundo este teólogo medieval, deve estar
submetida ao home, porque de por si é incapaz de evitar a concupiscência.
Parece que na Idade Média as mulheres se dedicavam a violar aos homes! Como
cambiam as cousas, meu Deus!
A filosofia acudiu
também presta a justificar esse subordinacionismo da mulher ao home, inclusive
em autores com uma filosofia antitética á mensagem cristã, como é o caso do
grande misógino Federico Nietzsche, que escreveu algumas das páginas mais duras
sobre o movimento de emancipação feminina. “Pois, que podem produzir esses
torpes ensaios de erudição feminina e de despojo de si mesmo, da mulher? Tem
tantos motivos a mulher para ser pudica! Oculta tantas cousas pedantes,
superficiais, escolásticas, tanta presunção mesquinha, tanta pequenez imodesta
e desenfreada! Analisem-se, polo menos, as suas relações com os meninos. No
fundo o que reprimiu todo isto foi o «temor» ao home. ... Confessemo-lo, nós,
os homes, honramos e amamos precisamente esse arte e esse instinto na mulher,
nós que temos a missão difícil e que nos unimos voluntariamente, para alívio
nosso, a seres cujas mãos, cujas
olhadas, cujas tenras loucuras fazem aparecer quase como erros a nossa
gravidade, a nossa profundidade. Em fim, eu proponho esta questão: jamais a
mulher concedeu profundidade a um cérebro de mulher nem justiça a um coração de
mulher. E não é verdade que, em resumidas contas, «mulher» foi desprezada,
sobre todo, polas mulheres e não por nós? Nós os homes desejamos que a mulher
não continue comprometendo-se por declarações. Pois missão do home era velar
pola mulher, quando a Igreja decretava: «mulier taceat in eclesia». Polo bem da
mulher, Napoleão deu a entender á mui discreta Madame de Stael: «mulier taceat
in politicis!» E eu creio que um verdadeiro amigos das mulheres é aquele que
grita hoje ás mulheres: «mulier taceat de muliere»”. (Para além do bem e
do mal, 232) Mas a mim, Sr. Nietzsche, como não são amigo das mulheres e
são um contraditor impenitente, um ligeiro e um superficial, gosto de gritar:
«mulier loquatur de omnibus et maxime de mulieribus». Por tanto, que a mulher
fale de todas as cousas, e é a principal indicada para fazê-lo da mulher.
O papa atual em
exercício, Francisco, fala de que é precisa uma teologia da mulher, e faz esta
proposição após afirmar que o tema da ordenação da mulher já o deixou fechado
João Paulo II, e, por tanto, a apertura dum debate sobre este tema já está
fechado. Ora bem, uma teologia da mulher, nestas condições, é insustentável
teoricamente, pois a mulher não necessita uma teologia da mulher senão uma
feminologia, um tratamento íntegro e rigoroso da mulher, que não parta de
preconceitos fechados, nem do mesmo conceito de Deus, logicamente
incompreensível. A mulher não necessita florituras masculinas que ocultem a sua
situação subordinacionista, senão um reconhecimento dos seus direitos íntegros
em igualdade com o ser masculino, respeitando a sua diferença genérica. Esta
feminologia deve ser protagonizada por mulheres principalmente, porque somente
elas são capazes de expressar como se sentem e como desejam ser tratadas polo
home com a finalidade de lograr uma igualdade real de direitos entre os sexos.
Recomendar-lhe-ia,
modestamente, ao papa Francisco, que tenha presente que somente com talante não
se governa o mundo e que, para lograr um câmbio real na Igreja, que eu
considero inviável polo mesmo anacronismo e gerontocracia da organização do
papado, instituição conformada a partir do século IV, polos interesses
coincidentes do Imperador romano, que atuou durante os séculos IV e V como o
Papa real, e do Papa de Roma, como estamos em condições de provar
compridamente, são precisas medidas legislativas que transformem as caducas
estruturas atuais da Igreja numa estrutura para o dia de hoje, que seja capaz
de apresentar um programa incitante á sociedade que demonstre que tem um papel
que cumprir em benefício duma sociedade mais fraterna, livre e igualitária.
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